domingo, 17 de janeiro de 2016

Mea Culpa


Não duvido que o Mundo no seu eixo
Gire suspenso e volva em harmonia;
Que o homem suba e vá da noite ao dia,
E o homem vá subindo insecto e seixo.

Não chamo a Deus tirano, nem me queixo, 
Nem chamo ao céu da vida noite fria;
Não chamo à existência hora sombria;
Acaso à ordem; nem à lei desleixo.

A Natureza é minha mãe ainda…
É minha mãe… Ah, se eu à face linda
Não sei sorrir; se estou desesperado;

Se nada há que me aqueça esta frieza;
Se estou cheio de fel e de tristeza;
É de crer que só eu seja o culpado!

Antero de Quental
   (1842-1891)

Natural de Ponta Delgada, Açores. 
Poeta e ensaísta, domina toda a chamada geração de 70, de que foi o ideólogo destacado, muito mais pelo seu espírito, cultura e dignidade moral do que pela escassa obra literária que deixou.
Foi sob a influência dos românticos, principalmente Lamartine, Victor Hugo e até Soares de Passos, que começou a compor os seus primeiros versos, reunidos posteriormente nas Primaveras Românticas, editadas em 1872.
(...)após a descoberta de Michelet, Proudhon e Hegel, a sua poesia transforma-se, segundo ele, na «própria voz da Revolução». A edição das Odes Modernas, em 1865, desencadeou a nossa ainda hoje maior polémica literária — a Questão Coimbrã —, onde o ultra-romantismo conservador de Castilho e da sua escola foi zurzido sem piedade por um jovem de 23 anos em luta contra a falta de liberdade criativa que dominava a anacrónica «presidência» das letras portuguesas.(...)

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In: Banco de Poesia Fernando Pesoa

7 comentários:

  1. Obrigado pela partilha. Conheço pouco Antero de Quental. Talvez seja até dos escritores portugueses o que menos conheço. Refiro-me claro aos escritores até ao séc XX, porque os modernos também conheço muito pouco.
    Um abraço e um domingo radioso.

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  2. Antero de Quental, é o poeta da contradição de sentimentos o que o tornou num dos grandes poetas da nossa literatura.
    Este seu poema é da fase mais sombria.

    Um beijinho e bom domingo

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  3. Amiga Olinda,

    Muito boa a escolha deste poema de Antero de Quental onde está bem patente a sua constante luta interior que, juntamente com a doença, o levariam ao suicídio.

    Esta nossa visitinha de hoje tem por finalidade comunicar-te que o nosso Farol está a comemorar o seu 7º ano de nascimento e por isso gostaríamos de te ver por lá para recolheres o selinho de aniversário que te queremos oferecer.

    Obrigado pela tua Amizade e por estares sempre ao nosso lado.

    Abraços e beijos.

    A Equipa do Farol

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  4. Olá Olinda
    Grandes gênios as vezes por não conseguirem viver com a incompreensão de seus valores se perdem de si mesmo nos distúrbios ou em alguns casos se acham dentro da bipolaridade, é incrível os caminhos da mente.
    Beijos
    Joelma

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  5. ~~~
    Tenho um carinho muito especial
    pela memória de Antero de Quental, o poeta de olhos tristes...

    Pelo estudo e modernidade da época, desenvolveu valores muito
    diferentes e opostos aos da sua formação familiar de raízes
    católicas e de convívio clerical.

    O nobre que foi tipógrafo e que se tornou socialista - o primeiro!
    Como tal, mandou retirar do solar de família, a pedra de armas...

    Apaixonado e exaltado por ideias, creio ter sido muito desajeitado
    no convívio com damas e presumo não ter frequentado saraus.

    Como lamento que a solidão, espírito inquieto e reflexivo e elevada intelectualidade tenham desenvolvido o problema de bipolaridade!

    Neste poema, podemos constatar toda a angústia da sua depressão agravada por sentimentos de culpa... Triste!
    A profunda amizade de Oliveira Martins não o conseguiu salvar...

    Porém, deixou-nos poemas belíssimos e incomparáveis...

    ~~~ Beijinhos poéticos, Olinda. ~~~
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  6. Excelente escolha.
    Beijinhos
    Maria

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  7. Há , hoje, belíssima poesia .
    Mas a que nos moldou os olhos e a alma, essa , continua a ser a que se bebeu e saboreou e formou o nosso olhar quando nos serviram poetas como Antero de Quental . Adorei reviver, Olinda!
    Beijinho

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