domingo, 29 de outubro de 2017

Deixai que a vida sobre vós repouse






Deixai que a vida sobre vós repouse
qual como só de vós é consentida
enquanto em vós o que não sois não ouse

erguê-la ao nada a que regressa a vida.
Que única seja, e uma vez mais aquela
que nunca veio e nunca foi perdida.

Deixai-a ser a que se não revela
senão no ardor de não supor iguais
seus olhos de pensá-la outra mais bela.

Deixai-a ser a que não volta mais,
a ansiosa, inadiável, insegura,
a que se esquece dos sinais fatais,

a que é do tempo a ideada formosura,
a que se encontra se se não procura.

in: As Evidências

     (1919-1978)


Jorge de Sena é considerado um dos grandes poetas de língua portuguesa e uma das figuras centrais da cultura do nosso século XX.

A sua obra, vasta e multifacetada, compreende mais de vinte coletâneas de poesia, uma tragédia em verso, uma dezena de peças em um ato, mais de trinta contos, uma novela e um romance, e cerca de quarenta volumes dedicados à crítica e ao ensaio (com destaque para os estudos sobre Camões e Pessoa, poetas com os quais a sua poesia estabelece um importante diálogo), à história e à teoria literária e cultural (os seus trabalhos sobre o Maneirismo foram pioneiros, tal como a sua história da literatura inglesa, e a sua visão comparatista e interdisciplinar das literaturas e das culturas foi extremamente fecunda), ao teatro, ao cinema e às artes plásticas, de Portugal, do Brasil, da Espanha, da Itália, da França, da Alemanha, da Inglaterra ou dos Estados Unidos, sem esquecer as traduções de poesia (duas antologias gerais, da Antiguidade Clássica aos Modernismos do século XX, num total de 225 poetas e 985 poemas, e antologias de Kavafis e Emily Dickinson, dois poetas que deu a conhecer em Portugal), as traduções de ficção (Faulkner, Hemingway, Graham Greene, entre 18 autores), de teatro (com destaque para Eugene O’Neill) e ensaio (Chestov). Ler mais...

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Poema: Citador
Imagem: Pixabay

3 comentários:

  1. Tão bom seria que a capacidade de contornar as serranias da vida, não fosse mais que um passeio no sopé do monte. Adiantamos as pre-ocupações às ocupações do dia. Irremediavelmente apressados.
    Maravilhoso poema, Olinda!
    beijinho

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  2. Ler Jorge de Sena é sempre maravilhoso.
    Um beijo.

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  3. Excelente escolha, belíssimo poema.
    Boa semana
    Beijinhos
    Maria de
    Divagar Sobre Tudo um Pouco

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