quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Baltasar Lopes da Silva - na linha de todas as batalhas

No último sábado, no programa Mar de Letras*, num dos canais da RTP, ouvi uma passagem da entrevista a Jorge Araújo, escritor e jornalista cabo-verdiano, em que referia que, para escrever os seus livros regressa sempre ao lugar das memórias da infância, um manancial inesgotável, a Mindelo - S. Vicente.

A par disso, falava com gosto das figuras relevantes da sociedade cabo-verdiana, nomeadamente, de Baltasar Lopes da Silva que ele considera o maior autor cabo-verdiano. E eu gostei de ouvir aquilo. Tenho um certo carinho por Baltasar Lopes e pela sua obra bem como pela sua mulher, Teresa, senhora muito bela, doce e carinhosa, amorável. E de voz maviosa, porque também cantava ou, em determinada altura, resolvera gravar algumas músicas como, por exemplo, 'Ó comadre Quetirinha', (que eu sei trautear...) 





Em 1936, Baltasar Lopes da Silva, Manuel Lopes e Jorge Barbosa fundaram a revista literária e cultural, Claridade, revista que lhes servia de veículo para a denúncia de problemas como a seca, a fome, a emigração. Estes claridosos marcaram de forma indelével a literatura e a sociedade de Cabo Verde.

Como veem nas imagens, ele aparece como Baltasar Lopes mas também é Osvaldo Alcântara, seu pseudónimo poético, assim apresentado no 'Reino de Caliban', antologia poética dos países africanos de língua portuguesa, de que possuo o primeiro volume. Também era tratado, carinhosamente, pelos alunos, por 'Nhô Balta'. 





Eis um dos seus poemas, do qual ressalto, como que um resumo de tudo o que é dito no mesmo, 'Mas todos os que vierem me encontrarão agitando a minha lanterna de todas as cores//Na linha de todas as batalhas:

Ressaca

Venham todas as vozes, todos os gritos e todos os ruídos;
Venham os silêncios compadecidos e também os silêncios satisfeitos;
Venham todas as coisas que eu não consigo ver na superfície da sociedade dos homens;

Venham todas as areias, lodos e todos os fragmentos de rocha que a sonda recolhe nos oceanos navegáveis;
Venham os sermões daqueles que não têm medo do destino das suas palavras;
Venha a resposta captada por aqueles que dispõem de aparelhos apropriados;

Volte tudo ao ponto de partida,
E venham as odes dos poetas,
Casem-se os poetas com a respiração do mundo,
Venham todos de braço dado na roda dos pecadores,
Que as criaturas se façam criadores,
Venha tudo o que sinto que é verdade
além do círculo embaciado da vidraça...
Eu estarei de mãos postas, à espera do tesouro que me vem na onda do mar...
A minha principal certeza é o chão em que se amachucam os meus joelhos doloridos,
Mas todos os que vierem me encontrarão agitando a minha lanterna de todas as cores,
Na linha de todas as batalhas.






Chiquinho é o seu romance mais conhecido e também considerado o primeiro romance genuinamente cabo-verdiano. Li-o há já algum tempo e tenho um exemplar que não encontro, neste momento, de modo que não sei se a capa que apresento aqui é a mesma, pois há outras edições. Aqui, encontrarão uma antologia da obra. Vale a pena lê-la.



Ver: Literatura cabo-verdiana (Periodização)

Ver isto também. Interessante

Imagens: Internet. Os meus agradecimentos às pessoas que as disponibilizaram.

17 comentários:

  1. Um marco da literatura caboverdiana!

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  2. Gostei de ler este seu post. Há muitos escritores de qualidade que não são
    "badalados" nas revistas ditas "cor-de-rosa" e por isso não surgem nos tops
    de vendas e é lamentável que assim seja.
    Um bj.
    Irene Alves

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  3. Vou, quando possa, aceitar a sugestão! Bem interessante me parece. Obrigado.
    abraço.
    jorgesteves

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  4. Sou filho adoptivo da ilha da Boavista

    Boa partilha

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  5. Venho deixar para si um fraterno e caloroso abraço.
    Olinda, que teu blog seja sempre essa fonte maravilhosa de expansão da cultura losófona. Seja sempre bem-vinda!

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  6. Querida Olinda,
    que bom ver o rigor e a dedicação que pões em cada uma das tuas publicações aqui no blogue! Sempre de uma qualidade invulgar, as escolhas que fazes.
    Num tempo em que a Literatura é afastada das escolas secundárias...todos os horizontes se afastam.

    Beijinho grande.

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  7. Estudei Literaturas de Língua Portuguesa com o saudoso Manuel Ferreira (Hora di Bai), com ele percorri os caminhos da africanidade e da tropicalidade...

    Outro beijinho

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  8. Interessantíssimo, a ler mal tenha oportunidade!
    Ontem também ouvi (e vi) um pouco de um programa sobre Manuel António Pina no canal 2, à noite (e pensar que esteve para acabar este canal...). Há pessoas que deviam manter-se à superfície mais uns aninhos...
    Beijinhos, boa quinta!

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  9. Gosto muito de ler, Olinda. Sou de letras, mas confesso que há ainda muita boa literatura que desconheço. Para mim foi, por isso ,muito importante entrar neste mundo dos blogs onde sempre me enriqueço bastante. Aqui, confortavelmente aconchegada num xaile de seda me delicio com belos e sempre pertinentes poemas. Este, por exemplo parece que foi feito para a nossa actualidade. As coisas estão tão más e os portugueses tão desanimados e desesperançados que desejamos que venham todos...todos são necessários para contribuirem da forma que puderem para uma sociedade mais solidária. Todos precisam de vir, com sentimento...com verdade...com vontade de dar o seu melhor; nesta época de incertezas, a única coisa que temos de certo é o aqui e o agora, é o chão que pisamos que ainda é nosso e a ele nos temos de agarra com força, optimismo e muita esperança. Estou a ler um livro de Daniel Sampaio, Diário dos tempos de crise onde ele se mostra muito preocupado com a falta de Esperança que se está a instalar no nosso povo e faz um apelo às autoridades para que esqueçam o déficit e se preocupem com o desassossego que se instalou nos portugueses, desassossego esse que está a levar muitos ao suícidio. Por isso é importante que " venham todos de braço dado...venham os sermões daqueles que não têm medo do efeito das suas palavras e venha a resposta captada por aqueles que dispõe dos aparelhos apropriados" Não sei se a resposta virá, mas cá estaremos..." agitando a nossa lanterna de todas as cores, na linha da frente de todas as batalhas; è que aqui também, já há fome, de pão...de justiça...de sossego...de esperança. Muito obrigada, Olinda pela riqueza dos teus posts, sempre com assuntos que a todos interessam e também pelo cuidado que tens em divulgar a nossa literatura lusófona tão rica e por vezes tão desconhecida. Um beijinho, amiga e até sempre.
    Emília

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  10. Olá Olinda, vim te abraçar com minha saudade.
    Deixo-te um beijo amada.

    Bjo

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  11. Parabéns pela sua obra de divulgação de uma literatura tão pouco conhecida como a cabo Verdiana.

    Embora a forma de Arte verdadeiramente intrinseca seja a música e a dança, tem nomes importantes na escrita, sim.

    Querida Olinda, os meus agradecimentos.

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  12. Enriquecedora postagem. Uma apresentação, para mim. Gostei de conhecer o escritor e vou me informar mais sobre seus trabalhos. Bjs.

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  13. No conocia este autor, tomo nota para pròximas lecturas.

    un abrazo

    fus

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  14. Deambulei por aqui.
    E, desejo felicidades.

    Manuel

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  15. Não conhecia o escritor, obrigado pela partilha. Minha amiga hoje venho também para agradecer o seu carinho ao ter comemorado comigo o aniversário do meu filho Pedro, deixando a sua preciosa mensagem.
    “A amizade duplica as alegrias e divide as tristezas. “(Francis Bacon)
    Beijinhos
    Maria

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  16. Para quem cresceu num ambiente rural, fora das grandes cidades, as memórias da infância são mesmo um manancial inesgotável.
    Não conheço nada do escritor, mas o teu excelente post fez-me curiosidade. Vou procurar...
    Olinda, tem um bom resto de domingo e uma boa semana.
    Beijo.

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  17. Minha querida

    Hoje passando para dizer que estou a ser entrevistada no RECANTO DOS AUTORES, será um prazer a sua visita. Deixo o Link:

    http://recantodosautores.blogspot.pt/

    Um beijinho com carinho
    Sonhadora

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