sexta-feira, 20 de março de 2020

Vão de infinitos/Preça d'anfenitos

E as varandas, que nos abrem uma 
fresta para a vida, requerem aqui a palavra poética de 
Teresa Subtil


Vão de infinitos

É a varanda de grades da cor do tempo
que me leva em breve enleio e receio de entardecer.
É na varanda solta no descampado do olhar
que me debruço e me encontro na árvore onde me fiz

É o toque na parreira de pele retesada
e rasgada que me diz da erupção que sentia
e das escadas que subia e descia,
querendo entender-me no emaranhado da vida.

Era em vão de infinitos que a varanda se espraiava.
E eu, debruçada, a sentir-me nada, não cabia em mim.
E eu, num chão de inquietudes a agigantar-me
para as dúvidas que nunca resolvi.

Aninhada em ti,
parecia que a aldeia ao longe era igual à minha,
embora a raia nos falasse de outra língua
e de outro país. Na minha varanda percebia a raia
e adivinhava que nem a vinha, nem a aldeia que avistava,
encobriam o reboliço do rio
que bem fundo cavava o fragaredo.
Nem eu nem o rio conhecíamos limites
e apesar do aperto e da inquietude,
saltávamos e corríamos
na pressa dum tempo a descobrir.





E também na doce língua mirandesa. Debrucemo-nos e, juntamente com o rio, saltemos e corramos na pressa de um tempo a descobrir, através da nossa imaginação


Preça d'anfenitos

Ye la baranda de grades de la quedor de l tiempo
que me lhieba an brebe anleio i arrecelo d'entardecer.
Ye na baranda suolta ne l çcampado de l mirar
que m'astribo i m'antronco n'arble adonde me fiç.

Y l toque na parreia de piel retesada
i resgada que me diç de l manantial que sentie
i de las scaleiras que chubie i abaixaba,
querendo antender-me ne l eimaranhado de la bida.

Era an preça d'anfenitos que la baranda se spraiaba.
I you, debruçada, a sentir-me nada, num cabie an mi.
I you, nun suolo d'anquietudes a agigantar-me
pa las dúbedas que nunca resolbi.

Arrimada a ti,
parecie que l'aldé al loinge era eigual a la mie,
anque la raia mos falasse d'outra lhéngua
e d'outro paiç. Na mie baranda percebie la raia
i çcunfiaba que nien la binha, nien l'aldé q'abistaba,
tapában l reboliço de l riu
que bien fondo scababa l fragaredo.
Nien you nien l riu coinciemos lhemites
i indas que l aperto i l'anquietude,
saltábamos i corríemos
na priessa d'un tiempo a çcubrir.








=====
Poema: Teresa Subtil - Rio de Infinitos/Riu d'Anfenitos - pgs 14/15
Post anterior:
As varandas - nossas aliadas
Imagem: pixabay

14 comentários:

  1. Bom dia:- Que agradável deve ser morar numa casa assim à beira rio. O poema é a perfeição poética. Gostei muito de ler
    .
    Uma Sexta Feira feliz

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  2. Linda poesia e das varandas ,tanto podemos ver...Feliz primavera! Saúde! bjs, chica

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  3. Querida Olinda!
    Ter a honra de Ella Fitzgerald a acompanhar o meu poema e senti-lo no seu espaço é algo que me faz abrir as portadas, encostar-me ao gradeado da varanda e elevar os braços ao céu.
    As varandas- nossas alianças.
    E essa foto é um poema tocante.

    Bem haja!
    Abraço imenso.

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  4. míticas varandas.
    e vãos de infinitos que são pórticos.
    ou arcos a ligar os tempos. e as cumplicidades

    abraço arrotchado (para ambas)

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  5. Boa noite de paz e saúde, querida amiga Olinda!
    Que vídeo suave na hora da tardinha aqui e num doce momento meu ele veio!
    Estou bem assim como na varanda na tardinha outonal... Leve e feliz.
    Desejo-lhe o mesmo, minha querida.
    Justamente aninhada do meu "ti" ... Seu post me encontrou.
    Beleza de poesia e postagem como um todo.
    Relaxei mais, muito obrigada.
    Tenha dias abençoados na proteção contra o vírus malvado!
    Bjm carinhoso e fraterno de paz e bem

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  6. Que as varandas não nos assustem.
    Elas são os nossos nosso escudo.
    Poema de tamanha beleza.
    Trocando v por b.
    Adorei ler e até me ri um pouco a ouvir - me.
    Ler mirandês é engraçado.
    Paz no seu coração.💐
    Megy Maia

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  7. Só uma palavra: lindíssimo este «post», estas escolhas! Tão adequado ao momento, mas de uma visão poética tão bela...

    Beijo

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  8. Na pressa dum tempo a descobrir, descubro sempre uma enorme sensibilidade poética na Poesia da Teresa. O poema é muito belo e a fotografia, uma varanda sobre o rio, é muito sugestiva. E foi um prazer ouvir a Ella Fitzgerald.
    Viva a Poesia!
    Um beijo, minha Amiga Olinda.

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  9. Delícia de Poema!
    Mágica a imagem que induz Miranda debruçada sobre o País.
    Sem outras palavras, porque seriam empobrecedoras do ouro que aqui nos é dado.
    Parabéns á Teresa pelo Poema e á Olinda pelo destaque.


    Beijo a ambas
    SOL

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  10. Linda postagem, Olinda, com o belo poema da Teresa e o vídeo com a música da grande Ella Fitzgerald, cantora tão especial e talentosa.

    "... e me encontro na árvore onde me fiz". Hoje, além de ser o Dia Mundial da Poesia, é, também, o Dia Mundial da Árvore.

    Espero que tu estejas bem e tomando cuidado neste momento estranho da nossa história, um abraço.

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    Respostas
    1. Caro Ulisses

      Grata por assinalar aqui o dia Mundial da Poesia e, coincidentemente, o Dia Mundial da Árvore. O poema da nossa querida Teresa Subtil presta-se a essa tua leitura, atenta e sensível. E leitura nossa.

      Festejemos sim essas duas vertentes da vida, oxigénio tão necessário à nossa sobrevivência, espiritual e material.

      Por cá, lidando com esse inimigo invisível e cruel. Espero que também estejas bem assim como todos os que rodeiam. "Navegar é preciso".

      Abraço.

      Olinda

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  11. Ficamos a contemplar a beleza do poema, de todas as nossas varandas possíveis.

    beijos, querida Olinda.

    :)

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  12. Deixo beijos e abraços de gratidão e cumplicidade.
    Que viva a vida! E que a saibamos festejar!

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