segunda-feira, 15 de maio de 2017

Alde Manuce, a cultura clássica e o itálico

Ando muito preguiçosa com as minhas leituras. Até deixo livros a meio. Um caso de estudo. Ontem, madrugada adentro, estava eu a ler umas páginas mais de um livro que até já terá reclamado em viva voz, fui remetida para esta nota de rodapé, numa referência a "Os Comentários"(De Bello Gallico), de César: Alde Manuce, muito célebre, é o inventor dos caracteres itálicos*. Claro que isto chamou-me logo a atenção. Tantas e tantas vezes tenho usado o itálico sem nunca prestar atenção às suas origens. E que é que eu vi sobre o assunto?

Antes de assumirmos a invenção do itálico por Alde Manuce, aliás, Aldo Manuzio ou Aldus Manutius, nascido Teobaldo Manucci (1452-1515), temos a escrita cursiva desenvolvida por Niccolò d'Niccoli. A partir dessa escrita Francesco Griffo fizera as primeiras punções, instrumentos para gravar, e, em 1501, este tipo, conhecido como itálico ou aldino, é utilizado pela primeira vez na imprensa por Manuce.

Li que Aldus Manucius, humanista, editor e tipógrafo, encontra-se no grupo dos grandes divulgadores da cultura clássica, tendo publicado entre 1495 e 1509 obras de Aristóteles, Aristófanes, Thucydides, Sófocles, Herodoto, Xenofóne, Euripides e Demostenes, entre outras. Depois de 1513, foi a vez de obras de Platão, Pindar, Hesychius e Athenaeus. Além dos textos dos autores referidos, Aldus publicara obras de Pietro Bembo, Poliziano, Dante, Petrarca, Plínio, Pontanus, Sannazzaro, Quintiliano, Valerius Maximus, Erasmo de Roterdão, e muitos mais.
Na Imprensa Aldina, (esta designação será originada no seu nome - não vi outra explicação), foram compostos os primeiros livros de bolso, uma invenção muito ao gosto dos humanistas que viajavam muito.


Por outro lado:
A Biblioteca Nacional, Portugal, realizou em 2015, uma mostra da sua obra, referindo, em especial, um livro com a correspondência de Catarina de Siena, freira dominicana, hoje aceite como Doutora da Igreja, livro esse que atesta essa técnica, utilizada pela primeira vez, em que: a gravura apresenta três frases escritas - «iesu dolce; iesu amore; iesu» - numa letra diferente de todas as outras que a tipografia experimentara e conhecera até então: uma letra levemente inclinada à direita, um ductus que Aldo Manuzio desenhara e fizera abrir pelo gravador Francesco Grifo e que ajudava a expressar e a destacar o êxtase sentido pela santa. Um tipo novo que depressa começou a correr mundo e que hoje é conhecido como itálico. Uma forma de letra que no meio de um texto extenso se destaca e chama a atenção do leitor.

Ficou aqui demonstrado que só tenho a ganhar com leituras aturadas e consistentes mas, mesmo assim, noto uma falha, minha na certa. Não fiquei a perceber bem se Alde Manuce, Aldus Manutius ou Teobaldo Manucci, inventara o itálico ou apenas, o que já seria muito, terá utilizado a escrita anteriormente desenvolvida por d'Niccoli, inovando-a e dando-lhe uma utilização mais globalizante com a ajuda das punções de Griffo. Numa missiva a um amigo, Manutius refere em 1501, que: estamos a imprimir em formato bem pequeno, para que seja convenientemente bem segurado pelas mãos e aprendido pelo coração (sem falar em ser lido) por todos. Todos, com um sentido bem relativizado na nossa óptica de hoje.

Quanto à utilização do itálico por nós, já se sabe, uma delas é chamar a atenção para textos ou expressões que não são da nossa autoria, mesmo quando, ou especialmente, desconhecemos a fonte. Espero tê-lo feito, além de indicar a proveniência dos textos lidos.

Desejo-vos uma boa semana.

Abraço.


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*Benzoni, Juliette - O Quarto da Rainha, pg 68
Ver mais e conferir: aqui, aqui, aqui,aqui, aqui
O itálico do meu texto diz respeito a excertos destas referências.
1ªImagem (net): escrita cursiva de Francesco Griffo
2ª imagem: Sancta Catarina - BNP

6 comentários:

  1. O que se aprende aqui! Muito interessante. Também não sabia a origem do itálico que tantas vezes uso...
    Uma boa semana.
    Beijos.

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  2. Gostei muito de saber e da leitura agradável da postagem.
    A escrita em itálico parece-me mais doce. elegante e menos formal,
    pelo que, uso-a frequentemente, sem obedecer a formalidades...
    Beijinhos, Olinda.
    ~~~~~~~~~~~

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  3. Olá, estimada Olinda!

    Que texto mais interessante! Li-o, duas vezes, mas olhe que fiquei com dúvidas, em alguns aspetos, tal como a Olinda. De qualquer forma, e já k me "aguçou" o apetite e a consequente pesquisa, logo que me seja possível, fá-la-ei. É que "isto" é História!

    Gosto da escrita em itálico, pke me parece mais elegante e mais "magra" e, naturalmente, realça o k pretendemos dizer.

    Muito agradeço esta sua publicação e leitura de madrugada.

    Beijos com estima.

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  4. Excelente post, gosto da letra itálica mas não sabia nada da sua origem.
    Bom fim de semana
    Beijinhos
    Maria

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  5. É por partilhas como esta que gosto de seguir blogues diversificados. Enriquem imenso! Nada sabia da origem da letra em itálico e, bem sabemos, como é relevante na intenção comunicativa do autor.
    Parabéns pelo teu texto e pelas leituras!
    Bjinho, Olinda

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  6. Muito interessante!
    O meu pai foi tipógrafo e deu aulas de tipografia, isto há muitos anos :)
    Beijinhos e boas leituras!

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