terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Vai começar...

Daqui a alguns minutos inicia-se a nossa Quinzena do Amor uma maratona de palavras que celebram o amor, a amizade, o bem-querer. Durante estes dias vão passar por aqui os poemas e as saudações que me trouxeram e também alguns outros textos de autores da língua portuguesa e não só.

Para abrir esta longuíssima sessão trago uma Morna, canção  tradicional caboverdiana, da autoria de Eugénio Tavares, cantada por Gardénia Benrós. É uma canção de amor intitulada Força di Cretcheu (Força de amor ou de muito querer), logo, em crioulo, mas que se percebe muito bem. Bastará saber que este amor versejado pelo autor, é chave que abre as portas do céu, é um amor maior que o mar, maior que o céu. E mais, o autor deseja distribuir a semente deste amor a toda a gente, para que todos conheçam o Céu, ou seja, a Felicidade:



Ca tem nada na es bida
Mas grande que amor
Se Deus ca tem medida
Amor inda é maior.
Maior que mar, que céu
Mas, entre tudo cretcheu
De meu inda maior.

Cretcheu más sabe
É quel qui é di meu
El é que é tchabe
Que abrim na céu.
Cretcheu más sabe
É quel qui crem
Ai sim perdel
Morte dja bem.

Ó força di cretcheu
Qui abrim nha alma em flôr
dixam bá alcança céu
Pa'n bá odjá Nôs Senhor
Pa'n bá pedil semente
De amor cuma ês di meu
Pa'n bem dá tudo djente
Pa tudo bá conchê céu.



domingo, 29 de janeiro de 2012

Sem que tu soubesses


Falei de ti com as palavras mais limpas
Viajei, sem que soubesses, no teu interior.
Fiz-me degrau para pisares, mesa para comeres,
tropeçavas em mim e eu era uma sombra
ali posta para não reparares em mim.

Andei pelas praças anunciando o teu nome,
chamei-te barco, flor, incêndio, madrugada.
Em tudo o mais usei da parcimónia
a que me forçava aquele ardor exclusivo. 

Hoje os versos são para entenderes.
Reparto contigo um óleo inesgotável
que trouxe escondido aceso na minha lâmpada
brilhando, sem que soubesses, por tudo o que fazias.



Poema de:
Fernando Assis Pacheco
In: A Musa Irregular
VER



quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Ser livre

Saída de uma guerra que a deixara de rastos, a hora era de recuperação, de juntar os cacos e projectar presente e futuro. E conseguiu-o em todas as áreas permitindo assim uma era de paz. 
Em 1948 publicou a Declaração Universal dos Direitos do Homem, cujos princípios se basearam na Revolução Americana, 1776, e na Revolução Francesa, 1789, tendo o homem como a medida de todas as coisas e tendo, também, em vista a sua Felicidade. Na verdade, a base de tudo residia no ideário iluminista, uma revolução do pensamento em que se envolveram homens de todas as vertentes científicas e culturais.
Esta é a Europa que se impôs pela sua larga visão no pós-guerra, que procurou não deixar pontas soltas idealizando para isso uma Europa unida, de livre trânsito e de interesses comuns. Em que altura deste percurso é que as coisas falharam? Ficámo-nos apenas pelo idealismo descurando o lado pragmático? 
Hoje, comemora-se o Dia Mundial da Liberdade. Que seja um pretexto para uma reflexão e tomada de decisões conducentes à sua e nossa libertação das amarras que nos prendem neste turbilhão em que ninguém se entende.




Música extraída da 9ª Sinfonia de Ludwig Van Beethoven, 
composta em 1823


domingo, 22 de janeiro de 2012

É hoje




HOJE, alguma data memorável? Nem por isso...O Xaile de Seda faz hoje um ano. Na vossa companhia, meus amigos, uns mais antigos que outros, o blog foi aprendendo a andar, desbravando alguns caminhos, partindo algumas pedras. Mas, não estrondosamente. Somente dentro da textura que a própria seda permite. 

Assim sendo, penso que seria interessante comemorar este primeiro aniversário do Xaile de Seda da forma a que já estamos habituados, ou seja, através da palavra escrita. Como se sabe, no dia 14 de Fevereiro próximo, é o Dia dos Namorados. A ideia é eleger a primeira quinzena do mês como A Quinzena do Amor, tal como fiz no ano passado, desta feita com a vossa ajuda. 

Eis o que vos proponho:

Pousem neste Xaile, a partir de hoje, palavras que celebrem o Amor, amor universal, amor filial, amor fraterno, enfim, amor amor, em versos, em prosa, em citações, da vossa autoria ou de terceiros. De 01 a 14 de Fevereiro farei posts desses contributos, com as devidas hiperligações aos vossos blogs ou às referências que indicarem. 

Como diria Candide, Il faut cultiver notre jardin
                          
                                   Continuemos pois a cultivá-lo... 

         


Imagem: retirada do Google

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Quando um Homem quiser


Tu que dormes a noite na calçada de relento
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão amigo
És meu irmão 

E tu que dormes só no pesadelo do ciúme
Numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão amigo
És meu irmão 

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher 

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e combóios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão amigo
És meu irmão 

E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão amigo
És meu irmão 

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

José Carlos Ary dos Santos

1937-1984


Ver
George Sand


sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Dia de Mercado

Mercado mensal. É o dia de encontros, é quando as pessoas ficam a saber umas das outras, da saúde, dos nascimentos... É o dia destinado à provisão de queijos, chouriços, linguiças, presunto, feijões, mel, e outros produtos considerados regionais. É também dia de almoçar, em espaços improvisados, frango assado na brasa, prego no pão, polvo seco assado. É o dia da fartura quentinha envolta em açúcar, do pão saloio e dos doces da avó. É o dia de procurar pechinchas: sapatos, casacos, blusas, camisolas, malas, tapetes, cortinados. Nas bancadas improvisadas no grande largo voam peças de roupa, sapatos, tudo num frenesim à procura do mais desejado e mais em conta. Homens, mulheres e crianças experimentam calçado em cima de bocados de cartão. Atrás de um pano ou na caixa de uma carrinha, espaços ideais para ver se a saia ou as calças caem bem. Grandes estendais de inutilidades, no chão, a um euro: pessoas de cócoras procuram o tal parafuso, a mola, a lágrima de vidro de candelabro, um bocado de ferro, ganchos, lâminas de barbear, bocados de lixa de ferro, linhas, agulhas, tesouras, elásticos, uma infinidade de coisas e coisinhas. Há ferros a vapor, moinhos de café, moinhos de carne, balanças e afins, enferrujados, delícia de quem colecciona estas preciosidades que já não se fabricamAs vozes dos feirantes, procurando abafar-se mutuamente, com uma energia fantástica, não dão descanso com os seus pregões: é baraaato, é cinco eros fregueses...ó vizinha venha cá, olhe a qualidade das malas, ontem era a dez hoje é só cinco...é saldo, é saldo, é saldo...é só três eritos, é aproveitar agora...mexa, mexa ó liiinda, veja a qualidade .... É a concorrência no seu melhor:taco a taco. É a lei do mercado a funcionar: oferta e procura. E é a sobrevivência dos contactos vicinais. Aconteceu no domingo passado e acontece todos os meses.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Sopro Suave

Tomar nas minhas mãos o sopro suave
Que aflora à tua boca.
Levá-lo aos meus lábios e beijá-lo
Como quem, timidamente,
Se debruça e escuta
O fluir do orvalho
Sobre as flores da aurora.



Ruy Cinatti
In
Anoitecendo 
a Vida Recomeça


Casa Fernando Pessoa

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Ecos

Ponho o meu violão a tiracolo. Com as mãos livres e quase de gatas começo a subir o caminho íngreme, de pedras soltas, até conseguir chegar ao cimo. Os meus pés pisam o trilho desaparecido que me levará de volta a Chã de Rosinha. Do lado esquerdo visualizo, no outro lado do espelho, o milheiral maduro e olhando um pouco mais para cima vislumbro a ladeira seca, outrora prenhe de ervilheiras e batatal. Chego ao terreiro de debulha de cereais e às instalações, paredes periclitantes pedindo ajuda. Sento-me numa pedra, olho lá para baixo. No vale, a casa da tia Joana com a porta de entrada a lembrar uma igreja. Também não está em muito bom estado. Sem transição, admiro-me de nunca nos termos estatelado lá em baixo. Pego no violão. Vêem-me à memória as mazurkas que o meu pai tocava na sua viola de doze cordas. Bemol ou sustenido? Ensaio um pouco e sai-me um som bastante aceitável. Trauteio. Oiço nitidamente a voz cristalina da minha mãe numa das suas canções preferidas. Um som que me preenche e, logo, vejo-me a ansiar por um outro que a minha memória guarda ciosamente. Canto e toco.Toco e canto. Não, não é isto... já sei. Olho em frente, lá está a montanha escarpada quase a tocar os céus. Lá em cima, no planalto, fica Tabuleirinho. Chegar lá não é fácil. Faço então a viagem em contagem regressiva. Eu e os meus irmãos desafiando aquela mole gigantesca com os nossos gritos. Gritos que ecoam, repetindo-se, multiplicando-se, gradativamente, numa ondulação impressionante. É nesta altura que vejo a figura. Uma figura perpendicular à verticalidade rochosa, acompanhando em grande velocidade o rochedo que a gravidade não perdoa. Um e outro acabam no fundo do vale, na ribeira que guarda a norte a nascente de água pura. A figura levanta-se e inicia o percurso de volta, empurrando, com esforço titânico, o rochedo. Grito-lhe: Por que motivo fazes isso? Vais morrer estafado e esmagado... Ele responde-me: É o meu destino, uma maldição dos deuses. Aí soube que era ele, Sísifo, sobre quem pendia uma maldição que duraria até ao fim dos tempos. Será ele o Sísifo clássico ou o de Camus já decantado pela sua luneta do absurdo? Viro a cara por momentos e vejo ao fundo, longe, bem longe, uma nesga de mar, num mar arável. Uma janela do mundo acenava-me, uma janela para o mundo... 


Sisifo, de Tiziano Vecellio, 1548-1549
  Imagem:Google


Nota: a expressão 'uma nesga de mar'
é o título de um lindo poema do autor
do blog Mar Arável. Clicar na hiperligação

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Elementos de Vitória

Estão cheias as livrarias de todo o mundo de livros que ensinam a vencer. Muitos deles contêm indicações interessantes, por vezes aproveitáveis. Quase todos se reportam particularmente ao êxito material, o que é explicável, pois é esse o que supremamente interessa a grande maioria dos homens. 
A ciência de vencer é, contudo, facílima de expor; em aplicá-la, ou não, é que está o segredo do êxito ou a explicação da falta dele. Para vencer - material ou imaterialmente - três coisas definíveis são precisas: saber trabalhar, aproveitar oportunidades, e criar relações. O resto pertence ao elemento indefinível, mas real, a que, à falta de melhor nome, se chama sorte. 
Não é o trabalho, mas o saber trabalhar, que é o segredo do êxito no trabalho. Saber trabalhar quer dizer: não fazer um esforço inútil, persistir no esforço até o fim, e saber reconstruir uma orientação quando se verificou que ela era, ou se tornou, errada. 
Aproveitar oportunidades quer dizer não só não as perder, mas também achá-las. Criar relações tem dois sentidos - um para a vida material, outro para a vida mental. Na vida material a expressão tem o seu sentido directo. Na vida mental significa criar cultura. (...)

Fernando Pessoa, 
in 'Teoria e Prática do Comércio'

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