terça-feira, 25 de novembro de 2025

UM AMOR

 



Aproximei-me de ti; e tu, pegando-me na mão,
puxaste-me para os teus olhos
transparentes como o fundo do mar para os afogados. Depois, na rua,
ainda apanhámos o crepúsculo.
As luzes acendiam-se nos autocarros; um ar
diferente inundava a cidade. Sentei-me
nos degraus do cais, em silêncio.
Lembro-me do som dos teus passos,
uma respiração apressada, ou um princípio de lágrimas,
e a tua figura luminosa atravessando a praça
até desaparecer. Ainda ali fiquei algum tempo, isto é,
o tempo suficiente para me aperceber de que, sem estares ali,
continuavas ao meu lado. E ainda hoje me acompanha
essa doente sensação que
me deixaste como amada
recordação.

Nuno Júdice, 
in "A Partilha dos Mitos"




Nuno Manuel Gonçalves Júdice Glória, (1949-2024
foi um ensaístapoeta, ficcionista e professor universitário português.

Reconhecido como um dos maiores nomes da 
poesia contemporânea portuguesa...




Anselmo Ralph
Fim do mundo




Boa semana, amigos.
Abraços
Olinda


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Ver Nuno Júdice aqui, no Xaile
imagem : pixabay

12 comentários:

  1. Muito linda poesia e amor que sempre vivo no coração está!
    beijos, boa noite, chica

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  2. Um poema bem elaborado que transcende gerações.

    Nova tirinha publicada. 😺

    Abraços 🐾 Garfield Tirinhas Oficial.

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  3. Bello y melancólico poema. Te mando un beso.

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  4. Boa noite de paz, querida amiga Olinda!
    Um vídeo muito bm de ouvir na noitinha...
    Puxar o outro para os olhos é sublime...
    Detalhes como a sonoridade dos passos do outro é belo e sensível.

    "Sem estares ali,
    continuavas ao meu lado. E ainda hoje me acompanha
    essa doente sensação que
    me deixaste como amada
    recordação."

    Uma afirmação perfeita para muitos sentimentos por nós experimantados.
    Tenha dias abençoados!
    Beijinhos fraternos

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  5. Ainda não estou de volta, amiga Olinda; ando com muitas demandas, a mesa de trabalho acumula três ou quatro livros para dar conta antes do dia 15 de dezembro. Eles precisam caminhar com as próprias pernas, antes que os píncaros do clima natalino me sufoquem. Mas não posso ficar alheio à poesia de Júdice, ela é por demais tentadora, essa poética que acentua a solidão do poeta e por extensão a do leitor como eu, talvez você, por isso nos identificamos com a sua poética. Essa poética que aponta para a partilha da palavra poética como uma forma de reencontrar os sentidos do cotidiano, tal como ele o fez neste poema primoroso que nos trouxe para que alcancemos a plenitude da poesia.
    “Quem canta”, perguntaram as sibilas,
    “quem canta com voz divina / entre ruínas?”
    Nuno Júdice, A Noção do Poema
    Com o carinho de sempre, amiga Olinda,
    beijinhos,

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  6. Há quem diga de Nuno Júdice que é o poeta do amor. Lembro-me dele a dar os primeiros passos no longínquo JUVENIL, suplemento do Diário de Lisboa para a revelação de jovens poetas e artistas plásticos, dirigido por Mário Castrim. Já lá vão mais de 60 anos.
    Um abraço.

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  7. Precioso poema, es bueno quedarse con los mejores recuerdos. Un abrazo

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  8. Olá.

    Bonito demais esse poema. Essa sensação de ausência/presença é marcante.
    Gostei da música também.

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  9. Querida amiga Olinda.
    Lindo poema que nos traz à apreciação.
    Bjsssss, marli

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  10. Olinda, como está querida? É incrível como os poetas conseguem compor obras de arte que ficam para a eternidade! Nem em mil anos eu conseguiria tal honraria, um talento imenso do Nuno Júdice que encanta a minha alma!
    Ahh e como adoro música fiquei a ouvir a canção e adorei...Não conhecia Anselmo Ralph, ma agora sei que é um ótimo cantor!
    Obrigada querida!!
    Tenha um lindo restante de semana!
    Beijos!! :))))))

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  11. Olinda,

    Que escolha mais linda e mais doída do Júdice. Esse poema tem um jeito de tocar exatamente onde a memória ainda palpita, como se a ausência deixasse um perfume aceso no ar.

    É impressionante como ele descreve essa presença que continua mesmo depois que a figura some na praça. Essa doente sensação de alguém que fica sem estar… é tão humana. Tão reconhecível. Parece até que o poema sabe o nome das nossas saudades.

    Obrigada por trazer essa delicadeza aqui.
    É o tipo de texto que a gente lê devagar, como quem segura um objeto frágil nas mãos.

    Beijo
    Fernanda

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  12. Belíssimo, Olinda uma intensidade de afetos, amor e encantamento que, como o mar tanto pode acolher quanto afogar. Uma entrega total e inevitável mesmo indo embora continua presente ,como fosse um destino. Fazia tempo que não lia Nuno Júdíce ,Obrigada ,amiga. com abraço.

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