segunda-feira, 19 de agosto de 2024

"Ditos e Feitos dos Padres do Deserto"

 

 
  UM MONGE de Tebas tinha recebido de Deus a graça de praticar rectamente a caridade, e assim dava a cada pobre o que lhe era necessário. Um dia calhou-lhe dar esmola numa aldeia. Uma mulher aproximou-se  dele para ser recebida, com vestes já muito gastas. 
Ao vê-la vestida dessa maneira, o monge encheu a mão para lhe dar dinheiro, mas a sua mão contraiu-se e acabou por lhe dar pouca coisa. Veio então outra mulher, mas esta bem vestida. Ao vê-la desse modo, o nosso monge levou a mão ao bolso para lhe dar uma pequena oferta, mas a sua mão abriu-se e pegou numa grande soma. Mais tarde o monge quis saber das duas mulheres; e soube que aquela que estava bem vestida era uma dama nobre que tinha caído na pobreza, e só se vestia assim para não prejudicar a reputação dos filhos. Pelo contrário, a outra vestia com andrajos para receber maiores esmolas.

Ditos e Feitos dos Padres do Deserto
(Organização de Cristina Campo e de Piero Draghi
tradução de Armando Silva Carvalho)

***


Constantino tinha restituído aos cristãos, pouco tempo antes, o direito a existirem, rompendo com o Dogma de Cómodo — Cristianous me éinai, os cristãos não são —, e subtraído com uma certa suavidade a jovem religião ao terreno espantosamente húmido do martírio, aos tempos incomparáveis das catacumbas.

Isto significava, evidentemente, entregá-la a esse perigo mortal que se manteve por dezoito séculos: o pacto com o mundo. Enquanto os cristãos de Alexandria, de Constantinopla, de Roma, regressavam à normalidade dos dias e dos direitos, alguns ascetas, aterrados com esse possível pacto, fugiam correndo, para se embrenharam nos desertos da Cétia e da Nitria, da Palestina e da Síria. Embrenhavam-se num radical silêncio que só alguns dos seus ditos conseguiram romper, bólides dirigidos a um céu insondável. Em verdade, a maior parte desses ditos foi pronunciada para nada revelarem, tal como a vida desses homens quis ser igual à vida de «um homem que não existe».*







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Imagem: pixabay (opção minha para este post)
Texto retirado de Poemário Assírio & Alvim - 2012, 04/05
* citação - aqui, A Espiritualidade dos Padres do Deserto, Cristina Campos
Veja também: Padres do Deserto - aqui


15 comentários:

  1. Boa noite, amiga Olinda
    Como ateu que sou, não dou muita relevância a estas histórias de caráter religioso, como é o caso. No entanto, valorizo estas narrativas que fazem parte da História Universal, como diz a segunda parte desta postagem em relação a Constantino. Reais ou não, são sempre interessantes leituras.
    Excelente partilha.

    Deixo os meus votos de uma feliz semana, com tudo de bom.
    Beijinhos, com carinho e amizade.

    Mário Margaride

    http://poesiaaquiesta.blogspot.com
    https://soltaastuaspalavras.blogspot.com

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  2. Me gusto mucho. te mando un beso.

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  3. Bom dia de Paz, querida amiga Olinda!
    Uma certa vez, um religioso me falava que dava esmolas sem pensar no que a outra parte iria fazer com a ajuda. Seria entre ela e Deus o uso.
    Gostei como o monge nos deu a conhecer como tem truques pata ganhar caridade fácil e o caso de quem se faz de pobre é bem comum.
    Há que se ter discernimento na ajuda pois os dependentes químicos esmolam para sustentar
    O vício.
    Algo Superior se encarregou de dar esmola à pessoa certa...
    Tenha uma nova semana abençoada!
    Beijinhos

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  4. Confesso que ando um pouco distanciada da religião.
    Isabel Sá
    Brilhos da Moda

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  5. Nesta vida, nem tudo o que parece é o que pensamos ser...
    Magnífico post, gostei de ler.
    Boa semana minha amiga Olinda.
    Um abraço.

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  6. Sempre interessantes as suas publicações, curiosa a de hoje. Apreciei.
    Um abraço.

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  7. Gostei muito da história e por vezes aparências enganam...Há fingimentos! Linda imagem escolhida!
    Ótima semana, beijos, chica

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  8. Nossa... mas essa história do monge mostra direitinho o caráter das pessoas,
    e assim é para tudo, as que agem com dignidade e aquelas vivaldinas...que querem levar vantagem em tudo.
    Muito boa postagem, querida Olinda, uma ótima semana!
    Beijinhos, amiga.

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  9. Olá Olinda!

    Muitas vezes as aparências enganam, julgamos pela capa.Sem conhecer a história.
    Tenha uma semana repleta de luz
    abraços loiva

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  10. Temos que tentar sempre não ficar pelas aparências, verdade!~


    Respeito mais esses homens que se refugiaram no deserto do que os que se deixaram seduzir pelo mundo e suas tentações , mas continuam invocando Deus.

    Querida Olinda, carinhoso abraço, semana boa .

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  11. Olá querida Olinda! Que história interessante! Muito me chamou atenção. Parabéns pela postagem, abraços da amiga Lourdes Duarte.

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  12. Não conhecia! Muito obrigada pela partilha!

    Beijos e Abraços,

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  13. Muitas vezes as aparências enganam, não é mesmo?
    Gostei imenso do conto, querida Olinda.
    Um carinhoso abraço
    Verena.

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  14. As aparências podem até nos enganar mas a mão divina estava lá para oferecer de modo sutil o discernimento
    Um texto muito interessante
    Uma semana de luz e bênçãos amiga Olinda
    Beijinhos

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  15. Boa noite Olinda,
    Magnífico conto com lições a retirar.
    Nem tudo o que parece é!
    Ontem, como hoje, muitos casos semelhantes acontecem.
    A imagem é belíssima.
    Beijinhos e continuação de boa semana.
    Emília

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