segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Cantiga quase de roda



Na roda do mundo
lá vai o menino.
O mundo é tão grande
e os homens tão sós.
De pena, o menino
começa a cantar.
(Cantigas afastam
as coisas escuras.)
Mãos dadas aos homens,
lá vai o menino,
na roda da vida
rodando e cantando.
A seu lado, há muitos
que cantam também:
cantigas de escárnio
e de maldizer.
Mas como ele sabe
que os homens, embora
se façam de fortes,
se façam de grandes,
no fundo carecem
de aurora e de infância
— então ele canta
cantigas de roda
e às vezes inventa
algumas — mas sempre
de amor ou
de amigo.
Cantigas que tornem
a vida mais doce
e mais brando o peso
das sombras que o tempo
derrama, derrama
na fronte dos homens.
Na roda do mundo
lá vai o menino,
rodando e cantando
seu canto de infância.
Pois sabe que os homens
embora se façam
de graves, de fortes,
no fundo carecem
de claras cantigas
— senão ficam ocos,
senão endoidecem.
E então ele segue
cantando de bosques,
de rosas e de anjos,
de anéis e cirandas,
de nuvens e pássaros,
de sanchas senhoras
cobertas de prata,
de barcas celestes
caídas no mar.
Na roda do mundo,
mãos dadas aos homens,
lá vai o menino
rodando e cantando
cantigas que façam
o mundo mais manso
cantigas que façam
a vida mais justa,
cantigas que façam
os homens mais crianças.”

THIAGO DE MELLO

***

Amadeu Thiago de Mello (1926 - 2022) foi um poetajornalista e tradutor brasileiro. Foi considerado um dos poetas mais influentes e respeitados no país, reconhecido como um ícone da literatura regional. (...) Seu poema mais conhecido é Os Estatutos do Homem, onde o poeta chama a atenção do leitor para os valores simples da natureza humana-

Foi membro da Academia Amazonense de Letras, na cadeira nº 29, eleito em 20 de janeiro de 1955, na sucessão de Vivaldo Lima, e recebido em 15 de março de 1956, pelo acadêmico Djalma Batista.
Mais aqui



E..

lá vai o menino
rodando e cantando
cantigas que façam
o mundo mais manso
cantigas que façam
a vida mais justa,
cantigas que façam
os homens mais crianças.



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Poema: daqui
O dia 20 de Novembro foi institucionalizado como Dia Internacional dos Direitos da Criança.
Veja:
Declaração Universal dos Direitos da Criança
Convenção sobre os Direitos da Criança

sexta-feira, 15 de novembro de 2024

"Mãos que falam"





Poucas vezes nos lembramos que a Língua Gestual é uma das três línguas oficiais portuguesas, a par com o Mirandês e o Português.

Efectivamente: 

A 15 de Novembro de 1997 a Língua Gestual Portuguesa (LGP) foi reconhecida enquanto língua da comunidade surda portuguesa pela Constituição da República (Artigo 74, n.º 2, alínea h).

Foi também no dia 15 de Novembro de 1995 que foi criada a Comissão para o reconhecimento e proteção da Língua Gestual Portuguesa e a defesa dos direitos das pessoas surdas.

Não é uma Língua universal porquanto cada país tem os seus códigos. No entanto, no século XIX D.João VI chamou a Portugal o sueco Pär Aron Borg que tinha fundado no seu país um instituto para educação de surdos e logo em 1823 foi criada a primeira escola portuguesa com essa valência. Assim, embora os vocabulários das línguas gestuais portuguesa e sueca sejam diferentes, o alfabeto tem uma origem comum.

É usada por cerca de 30000 surdos bem como pela comunidade envolvente formada por familiares e técnicos da área.

Aprendamos, também, um pouco:



Gestinhos - 
Aprendo Língua Gestual Portuguesa



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Leia:
aqui mãos que falam (artigo de 2023)
aqui Língua Gestual Portuguesa

Língua gestual

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

Meados de Maio





Chuvoso maio!

Deste lado oiço gotejar
sobre as pedras.
Som da cidade ...
Do outro via a chuva no ar.
Perpendicular, fina,
Tomava cor,
distinguia-se
contra o fundo das trepadeiras
do jardim.
No chão, quando caía,
abria círculos
nas pocinhas brilhantes,
já formadas?
Há lá coisa mais linda

que este bater de água
na outra água?
Um pingo cai
E forma uma rosa...
um movimento circular,
que se espraia.
Vem outro pingo
E nasce outra rosa...
e sempre assim!

Os nossos olhos desconsolados,
sem alegria nem tristeza,
tranquilamente
vão vendo formar-se as rosas,
brilhar
e mover-se a água.




Estamos em Maio? Com certeza que não. Mas gostei tanto deste poema de Irene Lisboa que não resisto em publicá-lo agora, mesmo estando nós em Novembro...  



Zeca Afonso


Maio maduro Maio





Veja Irene Lisboa, aqui, no Xaile de Seda



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Imagem-desenho digital: pixabay


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Poema, aqui

domingo, 3 de novembro de 2024

Esta lembrança







Esta doce lembrança
Cruel no seu âmago
Colou-se-me à pele
Imprimiu-se em mim

É força positiva, aliás,
Energia quasi negativa
Conforme eu visiono
O meu mundo interior

Um desejo insatisfeito
Muito para além de mim
Universo assaz perdido
Num dia aziago, distante

Dinola Melo



Andrea Bocelli
Jennifer Lopes 






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Imagem: pixabay

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Eva Azevedo: "a engenheira que semeia África com os pés"

Engenharia do Ambiente. Dança clássica. A descoberta da dança africana. Investigadora, professora. 

Uma vida dedicada a essa paixão pela expressão corporal e ritmo, criando o seu método de ensino "Farisogo Sira - O Caminho do Corpo",

Desenvolveu desde 2009 projetos de pesquisa, formação e criação artística realizados na Europa, Burkina, Benim e Brasil, apoiados pela GDA e Fundação Calouste Gulbenkian».


Oiçamos Eva Azevedo, contando a sua história de vida:




E veja aqui um pormenor da sua entrega à arte que escolheu.




Faleceu aos 47 anos.
Notícia de 30/10/24.


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Notícia: aquiaqui e aqui