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domingo, 7 de novembro de 2021

No País do Tchiloli

“Risonho, o Equador saltita para o umbigo de Mãe-África
sensualizando-a nos caminhos abertos às correntes atlânticas
onde as sementeiras proliferam ao deus-dará
como tudo o que é bom.”
(in Pingos de Chuva, Olinda Beja)


Tchiloli é uma peça de teatro com origem em Portugal no século XVI, que se tornou numa das mais persistentes realizações culturais e populares na ilha de São Tomé, em São Tomé e Príncipe. Inspirada na tragédia do Marquês de Mântua e do Imperador Carlos Magno, é da autoria do dramaturgo madeirense Baltazar Dias, interpretada em português antigo e moderno por companhias locais, constituídas somente por homens, com um anacronismo assumido, e que coloca em cena escravos e mestiços, mascarados e fantasiados ao estilo europeu.



Olinda Beja, romancista, contadora de histórias e poetisa, que já tive o prazer de trazer a este Xaile, diz numa entrevista cujo link indico abaixo: "Quando se fala de Tchiloli, ninguém sabe o que é", isso no contexto do desconhecimento da História e cultura são-tomenses. Nessa entrevista ela fala de tudo, ou quase tudo, desde a descoberta das ilhas de São Tomé e Principe, passando pelo seu povoamento- não esquecendo o envio de crianças judias por D.João II- os contratados, os contornos da literatura africana, nomeadamente a são-tomense, a literatura portuguesa... 

E, claro, escreveu um livro de poemas intitulado "No País do Tchiloli", no qual lança o seu olhar penetrante e lúcido. A sua obra é já extensa, contando no seu palmarés vários prémios.

Hoje deixo-vos um dos seus poemas, trazido, mais uma vez, do site de António Miranda:



Germinal

Ó minha ilha queimada pelo sol
pelas lágrimas do vento que escorreram
das escarpas e das vidas de teus filhos

em ti repousam as cinzas das esperanças
que outrora viveram no leito de teus rios
Malanza, Manuel Jorge, Contador, Cauê...

Em ti germinam vidas repassadas
de lua e sol no cais do sofrimento
que as âncoras da vida vão soltando!

Ó minha ilha adocicada pela chuva
lacrimejante e pura batendo na sanzala
de todos os ilhéus sequiosos de amanhãs.

Olinda Beja

 

Bom domingo, meus amigos.

Abraços


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Queira ler:

Tchiloli - aqui e aqui
Olinda Beja - aqui
Entrevista - aqui
Crianças em "viagens trágico-marítimas" - aqui

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Crianças em viagens trágico-marítimas*

Li ontem, algures, a efeméride da primeira viagem de circum-navegação, preparada e levada a cabo por Fernão de Magalhães, a 20 de Setembro de 1519, ao serviço do rei de Espanha. Magalhães perderia a vida em 1521, em Cebu, nas Filipinas, sendo a viagem completada por Juan Sebastián Elcano (1522). 

Lembro-me, a propósito, da obra de Laurence Bergreen, que li em tempos, "Fernão de Magalhães - Para Além do Fim do Mundo". Na página 120 e seguintes, lê-se sobre a estrutura social a bordo. Dos apontamentos que tirei na altura, respigo o seguinte:

"Reinava acima de tudo uma rigorosa divisão do trabalho. No fundo da escala estavam os pajens imputados aos serviços aos pares. Muitos pajens eram meras crianças, com apenas oito anos de idade; nenhum tinha mais de quinze anos. Eram vulgarmente órfãos. Nem todos os pajens eram iguais. Alguns tinham sido quase raptados dos cais de Sevilha e pressionados para irem servir;(...). Eram tratados com aspereza, explorados sem piedade, privados de um salário adequado e por vezes transformados em vítimas de predadores sexuais entre os membros mais velhos da tripulação. As suas tarefas incluíam esfregar os tombadilhos com água salgada e limpar depois das refeições e executar qualquer trabalho inferior que lhes fosse atribuído. (...)"



Infelizmente, essa situação não é única. Nos descobrimentos portugueses existem relatos de crianças levadas nessas viagens, cujo infausto destino quase se perderia nas brumas da memória. Exemplo disso: as crianças judias, cerca de 2000, arrancadas aos pais e enviadas para São Tomé e Príncipe, conforme nos refere Isabel Castro Henriques, em "São Tomé e Príncipe-A invenção de uma sociedade". Poucas resistiriam aos rigores da viagem, ao clima e aos maus- tratos.

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Leia mais: aqui, aqui e aqui
*Confesso o aproveitamento, da minha parte, da expressão "trágico-marítimas" lembrando-me da obra "História Trágico-Marítima", muito minha conhecida, colecção de relações e notícias de naufrágios, e sucessos infelizes, acontecidos aos navegadores portugueses, compilada por Bernardo Gomes de Brito e publicada em dois tomos, em 1735 e 1736 ,