sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Como nos Prodígios


Sou-te presente mulher e chama,
ímpeto fremente de lua abandonada.
aberta do calor na turbulência da noite,
ignota fonte de ternura derramada.



Encontrou-o à entrada do deserto,

absorto, como se conhecesse

todas as invocações do silêncio.

Lia-se nos olhos dele a atracção pelo vento,

pelas areias, pelo espaço imenso, pela solidão.

Ela saía do deserto. O mesmo deserto.

Trazia um cacto murcho em cada mão

e um rio seco a escamar-lhe a pele.

Olharam-se. Ela contou-lhe.

Contou-lhe das vezes que se afogou no chão

pensando que era água;

como rebentaram seus lábios pela sede interminável.

Disse-lhe que quase morreu com saudades do mar;

que bebeu o próprio sangue

para curar a febre e o delírio.

Falou-lhe do medo e do cansaço

que venceu cambaleando, rastejando,

dormindo agarrada à noite.

Ele hesitou.

Depois, com uma quietude

que nos prodígios acontece,

pegou-lhe na mão e foi com ela até ao mar.

Graça Pires



Como nos prodígios apreende-se o mistério
que envolve este belo poema.
As palavras envolvem-nos e fazem-nos pressentir um
certo sofrimento e dedicação aproximado ao amor.



Paganini



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In: A solidão é como o vento, de Graça Pires

pg.61

Citação: Rio de Infinitos, pg162

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