De vestido de chita, cabelos ao vento, ela segue olhando ao seu redor com olhar curioso. Tudo lhe interessa: as pedras da calçada que fazem desenhos tão interessantes, talvez de tempos idos; admira essa arte e a paciência de quem, de cócoras, afaga os paralelepípedos até se encaixarem nos respectivos lugares; os azulejos que enfeitam as paredes de prédios de outrora, muitos deles, todos com motivos surpreendentes. Pega no telemóvel e vai registando alguns. Regra geral, prefere olhar, interiorizar, registar mentalmente. Dá outro sabor ao passeio. Sente-se apenas ela e os elementos que a envolvem. A um canto sob uma reentrância vários bocados de papelão a tapar pertences em sacos de plástico de alguém que estará algures, mas bem perto. Um abrigo quase permanente para passar a noite. Ela ouve um apito. Um barco-cruzeiro passa não muito longe. Leva dentro o sonho de uns dias bem passados, com passagem por vários portos. Sonho de uns dias, para depois se voltar ao rame-rame habitual e enquanto assim for tem-se de dar graças a Deus. Que o mundo não está para graças. Passa pelo mercado, uma obra de arte lá dentro, nas paredes painéis de azulejos retratando as várias actividades. Atenta, ouve queixas daqui e dali. Tudo caro. Tudo pela hora da morte. Em poucos dias, os artigos de primeira necessidade subiram de tal modo que quase se não lhes pode chegar. Então peixe e carne, um luxo. Na ansiedade e pânico das carências, quem pode enche os carrinhos, nos supermercados, com artigos de vária ordem, ou seja, açambarcando aquilo que pode fazer falta a outros de poucas posses. Ela olha à volta. Vislumbra uns belos limões. Era do que precisava.
Bom domingo, amigos.
Abraços
Olinda
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Foto da filha- Alentejo
A Rosinha dos Limões-Letra e música de Artur Ribeiro- aqui
Canção interpretada por Max
Querida amiga Olinda, bom domingo de paz!
ResponderEliminarAchei algo que me lê e aos meus dias:
"Regra geral, prefere olhar, interiorizar, registar mentalmente. Dá outro sabor ao passeio. Sente-se apenas ela e os elementos que a envolvem."
À sós com meus botões, fico tão bem...
Lendo avidamente o texto belo, encontro uma mulher, vendedora de limões, que soube fazer da vida azeda como limão, uma bela limonada (aqui, limão está com preço na hora da morte! Peixe que amo também. Carne posso dispensar pelos rins).
A carestia aflige a humanidade e oxalá não haja uma crise mundial de alimentos, como se anuncia!
Obrigada pelo profundo texto da vez, me disse muito e já afunilo quereres há um bom tempo, em todos os níveis. Empatia com o mundo além do meu umbigo é urgente.
Tenha uma nova semana abençoada!
Beijinhos com carinho fraterno
😘🕊️💙💐
Olinda, que lindo texto! Que bom saber passar pelos corredores do supermercado e da vida tendo certeza daquilo que realmente precisamos, nem que por vezes, seja apenas um limão... Adorei! Lindo dia! beijos, chica
ResponderEliminarMuito bom. Gostei bastante!!
ResponderEliminar-
Pintam flores com aguarelas
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Beijo. Bom fim de semana!
Não tempero as saladas com vinagre. Tempero com sumo de limão.
ResponderEliminarGostei de ouvir o saudoso Max.
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Um domingo feliz … Saudações cordiais.
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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Ah, o olhar. Enquanto ele observa tudo que o rodeia, vai caminhando, como um Cesário Verde, e os descreve-os dividindo com o leitor as sensações, as impressões. Ao chegar aos limões, o pretexto, já nos disse o quanto se perdeu a vida... O quanto viver nos custa tão caro... E o viver é sempre um recomeço... a medir cada passo... Um belo texto! Por ser de seda, natural que o xaile seja sensível...
ResponderEliminarUm bom domingo, minha amiga Olinda!
Um lindo texto que me fez refletir, querida Olinda. Hoje em dia viver está complicado. Temos que ir em frente sem desanimar. Fazer uma gostosa limonada e nos acalmar.
ResponderEliminarUm beijinho carinhoso
Verena.
Querida Olinda, acabei de vir da Gracita, onde passei momentos encantadores ao saborear sua prosa rica e bela. E aqui encontro outra. Esse caminhar atento, que registra encantos e não perde detalhes é maravilhoso, ainda que o brilho não esteja em todos os lugares. Esse papelão que serve de abrigo é visão que desola, assim como a percepção de que alguns se dão ao luxo de adquirir mais que o necessário, em detrimento dos que pouco podem ter. A carestia é motivo de comentários em mercados de todos os lugares. Ela fez um passeio que acompanhamos com prazer. E se limitou a comprar, tão somente, o que buscava. A música que escolheu tem uma simplicidade adorável. Grande abraço.
ResponderEliminarUm post muito belo e uma linda canção que gostei de recordar.
ResponderEliminarAbraço, saúde e uma boa semana
Não há rosas que germinem, como gostaria o nosso amigo Manuel, mas antes, folhas que caem amarelecidas, deixando as árvores despidas, como que anunciando despedidas, fim de vidas. Seria bem melhor para todos nós que o chão se cobrisse de pétalas de rosas dando mais vivacidade e colorido às pedras da calçada, pacientemente colocadas e formando desenhos muito interessantes; vivemos momentos dificeis, com os preços da chamada " cesta básica " a aumentarem de uma maneira assustadora , momentos em que a ida a um supermercado se torna penosa...tempos em que a fome já aparece no nosso pais, ao mesmo tempo que os barcos cruzeiro continuam a aportar aqui bem perto da minha cidade. Aportam os grandes navios de um lado, enquanto que do outro, por baixo de prédios de luxo se vão estendendo cartões; serão colchões de corpos cansados durante uma noite, pois logo que o sol raiar serão corridos dali para fora para que não envergonhem a cidade. À medida que lia este teu texto, Amiga Olinda, pensava nas minhas idas ao supermercado e na quantidade de artigos que colocava no carrinho sem reflectir no elevado número de pessoas que nem ousam lá entrar e se entram, talvez se fiquem pela banca dos limões...são caros, mas ..." era do que precisava". O desperdicio sempre foi muito, mas, nos últimos anos, com a abundância a que nos acostumámos, passou a ser demasiado, escandaloso, ao ponto de se começar a fazer campanhas contra esse mal; está na hora de todos nós começarmos a pensar na poupança de alimentos, a pensar nas alterações climáticas e nas suas consequências a nivel alimentar , a pensar que, se uns enchem o carrinho de bens desnecessários, outros nem uml limão conseguem comprar. Se as nossas calçadas são belas com as cores preto e branco, como ficariam se nelas espalhassemos pétalas de rosas, brancas, vermelhas ou amarelas? Lindas, de certeza! Façamos a nossa parte para que um maior número de pessoas consiga ter mais cor em suas vidas, que muita mais gente consiga comprar limões e, com umas boas colheres de açúcar, faça uma saborosa limonada. Adorei esta tua crónica, querida Amiga. Quando for às compras, prometo, vou de lista na mão e só colocarei no carrinho aquilo que nela constar. Beijinhos, Amiga e que a semana que começa seja boa, para ti e para os teus
ResponderEliminarEmilia
em ir ao supermercado com a listinha na mão e trazermos únicamente aquilo que nos faz falta
Ai, ai, ai....que feiura ficou este espacinho com o meu desleixo, Amiga Olinda...esta frase aqui...sem nexo Desculpa Amiga e, se puderes e quiseres apagar seria melhor, não . Que tristeza !!! Beijinhos
EliminarEmilia
Olá, minha querida Emília
EliminarMuito obrigada pelo teu cuidado de não "desfear" este nosso Xaile. Antes pelo contrário as tuas palavras trazem-lhe beleza.
Já me tem acontecido as minhas ficarem desalinhadas em comentários assim como essas aí.)) Faz parte da arte de escrever em rectangulozinho tão pequeno.
Beijinhos
Olinda
Um belo passeio que seria o comum de uma rotina de compras, mas que enveredou por tantos aspectos que nos leva às reflexões sobre tantas situações vividas, hoje, diante da carestia de tudo e do consumismo de uns. Amei, Bjsss
ResponderEliminarUm texto interessante, gostei de ler.
ResponderEliminarTambém gostei da foto e de ouvir o Max, que anda quase esquecido.
Boa semana e bom feriado, amiga Olinda.
Beijo.
teremos que nos focar no essencial,
ResponderEliminarno que precisamos num determinado dia,
sem esbanjar, sem estragar…
e apreciar os belos limões por exemplo:)
gostei do texto muito bonito!
Uma narrativa de quem está atento ao que se passa em seu redor. Nem tudo é belo, mas nem tudo é cruel. É preciso saber olhar e sentir.
ResponderEliminarOuvir a Rosinha dos Limões cantada por Max é uma delícia.
Tudo de bom para si, minha Amiga Olinda.
Uma boa semana.
Um beijo.
Boa tarde Olinda,
ResponderEliminarUm texto belíssimo que me deu muito prazer ler.
Pena, na verdade, a carestia da vida e tantos já sem meios para chegar aos bens essenciais.
Muito bom recordar Max na Rosinha dos Limões, uma canção que o meu pai adorava.
Linda a imagem!
Beijinhos e uma ótima semana.
Ailime
Gostei muito do texto e do efeito literário de desenhar a autora na terceira pessoa, sem quo o texto perder consistência e coerência…
ResponderEliminarNão alcanço porém motivo para os limões, mas, enfim, desejo uma boa limonada rss
abraço, minha amiga Olinda Melo
Um texto lindo que mostra de forma sensível a realidade que atravessamos.
ResponderEliminarAdorei voltar a ouvir o Max na rosinha dos limões.
Beijinhos
Lindo relato uno debe centrarse en las cosas sencillas. Me gusto la canción . Te mando un beso.
ResponderEliminarBela canção popular portuguesa muito bem interpretada pela voz do ,saudoso Max.
ResponderEliminarO texto reflete a realidade atual da carestia em que vivemos.
Abraço de amizade.
Juvenal Nunes
Que beleza de achado da mocinha os limões em meio a tantos absurdos num mundo de carestia. Saber adoçar o dia com limões é arte. Mas encanta a sua descrição passo a passo dos passos da mocinha a deslizar pelas ruas de pedras sem nada lhe passar ao largo. A gente vai recriando as imagens junto a esta mocinha.
ResponderEliminarBela prosa Olinda com sua sempre bela arte nesta linha.
Carinhos no abraço.
Gostei da musica.
Gostei muito do teu texto, Olinda, especialmente em teres focado terrível inflação e o açambarcamento idiota.
ResponderEliminarO eu textual viu muita coisa, mas apenas precisava de limões... Excelente.
Tanto pobre às sopas!... Haja paciência para os dias que correm... Bjnhs
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Parabéns pela escrita.
ResponderEliminarIsabel Sá
Brilhos da Moda
Olá :)
ResponderEliminarQue bom andar por aqui e encontrar momentos como este.
Gosto muito de ouvir o Max. Desde miúda que trauteava a musica dele, Noite e Pomba Branca.
O meu pai conheceu ele, pois o Max quando estava em Portugal ia algumas vezes ao restaurante onde o meu pai trabalhava. Era uma simpatia de pessoa.
Tenho pena que hoje, pouco ou nada se escute dele.
As suas palavras , tão cheias de tanto, retratam bem esta nossa realidade.
E depois quando a vida nos dá limões, bora lá fazer limonada.
Abraço e brisas doces ***