quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Penso em ti e dentro de mim estou completo



Pintuta de REMIGIO MEGÍAS

Vai alta no céu a lua da Primavera 
Penso em ti e dentro de mim estou completo. 

Corre pelos vagos campos até mim uma brisa ligeira. 
Penso em ti, murmuro o teu nome; e não sou eu: sou feliz. 

Amanhã virás, andarás comigo a colher flores pelo campo, 
E eu andarei contigo pelos campos ver-te colher flores. 
Eu já te vejo amanhã a colher flores comigo pelos campos, 
Pois quando vieres amanhã e andares comigo no campo a colher flores, 
Isso será uma alegria e uma verdade para mim. 


Alberto Caeiro
In: O Pastor Amoroso
Heterónimo de Fernando Pessoa



No calendário a  Primavera ainda vem longe mas o dia apresenta-se, hoje, glorioso. Do quintal do vizinho vêm-me trinados em despique, numa homenagem à Natureza. Na verdade, belos são os campos, belo é o Universo. 

Alberto Caeiro é visto pelo seu criador como o "Mestre". E ele considera-se o poeta das sensações e estas, para ele, são a única realidade. Mas vejamo-lo aqui descrito por Fernando Pessoa-ortónimo:






Alberto Caeiro nasceu em Lisboa, em 1889 e morreu em 1915, mas viveu quase toda a sua vida no campo, com uma tia-avó idosa, porque tinha ficado órfão de pais cedo. Era louro, de olhos azuis. Como educação, apenas tinha tirado a instrução primária e não tinha profissão.
Como surgiu este heterónimo? Conta o próprio Fernando Pessoa que “se lembrou um dia de fazer uma partida a Sá-Carneiro — de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira — foi em 8 de Março de 1914 — acerquei-me de uma cómoda alta, e, tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com um título, O Guardador de Rebanhos. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre. Foi essa a sensação imediata que tive.”
Quando Fernando Pessoa escreve em nome de Caeiro, diz que o faz “por pura e inesperada inspiração, sem saber ou sequer calcular que iria escrever.”

Fonte: Carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro, de 13 de Janeiro de 1935, in Correspondência 1923-1935, ed. Manuela Parreira da Silva, Lisboa, Assírio & Alvim, 1999.
In: Casa Fernando Pessoa

Nota: Trouxe para ilustrar o último post, aliás o último poema, desta Quinzena do Amor, uma pintura de Remigio Megías. Encontra-se em Arte en venta com outras pinturas, que também estão à venda, com o título "Campos en primavera". A biografia do autor: aqui. Seja-me relevada a ousadia.

====
Quinzena do Amor
Post 24 - Desde sempre em mim, Post 23 - Sul, Post 22 - E, longe de ti, o tempo era tempo...,Post 21 - Victoria, Post 20 - Carta (Esboço), Post 19 - Morena, Post 18 - Diz o meu nome, Post 17 - Canção do africano, Post 16 - Os cinco sentidosPost 15 - Amor a amor nos convidaPost 14 - E Serei VeleiroPost 13 - Poema de Amor de António e CleópatraPost 12 - Que era é esta?Post 11  - A noite abre meus olhosPost 10 - sim.foi por um beijo em simples vendaval que morriPost 9 - Ó MãePost 8 - Alma minha gentil que te partistePost 7 - Do inquieto oceano da multidão,Post 6 - Amar teus olhosPosta 5 - Conheço esse sentimentoPost 4 - Éramos tu e euPost 3 - Saudades não as queroPost 2 -Não é por acasoPost 1 - É daqui a pouco

=====  

2 comentários: