Eu gosto de você, Brasil,
porque você é parecido com a minha terra.
Eu bem sei que você é um mundão
e que a minha terra são
dez ilhas perdidas no Atlântico,
sem nenhuma importância no mapa.
Eu já ouvi falar de suas cidades:
A maravilha do Rio de Janeiro,
São Paulo dinâmico, Pernambuco, Bahia de Todos-os-Santos.
Ao passo que as daqui
Não passam de três pequenas cidades.
Eu sei tudo isso perfeitamente bem,
mas Você é parecido com a minha terra.
E o seu povo que se parece com o meu,
que todos eles vieram de escravos
com o cruzamento depois de lusitanos e estrangeiros.
E o seu falar português que se parece com o nosso falar,
ambos cheiros de um sotaque vagaroso,
de sílabas pisadas na ponta da língua,
de alongamentos timbrados nos lábios
e de expressões terníssimas e desconcertantes.
É a alma da nossa gente humilde que reflete
A alma das sua gente simples,
Ambas cristãs e supersticiosas,
sortindo ainda saudades antigas
dos sertões africanos,
compreendendo uma poesia natural,
que ninguém lhes disse,
e sabendo uma filosofia sem erudição,
que ninguém lhes ensinou.
E gosto dos seus sambas, Brasil, das suas batucadas.
dos seus cateretês, das suas toadas de negros,
caiu também no gosto da gente de cá,
que os canta dança e sente,
com o mesmo entusiasmo
e com o mesmo desalinho também...
As nossas mornas, as nossas polcas, os nossos cantares,
fazem lembrar as suas músicas,
com igual simplicidade e igual emoção.
Você, Brasil, é parecido com a minha terra,
as secas do Ceará são as nossas estiagens,
com a mesma intensidade de dramas e renúncias.
Mas há no entanto uma diferença:
é que os seus retirantes
têm léguas sem conta para fugir dos flagelos,
ao passo que aqui nem chega a haver os que fogem
porque seria para se afogarem no mar...
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Jorge Barbosa
Jorge Vera-Cruz Barbosa nasceu na Ilha de Santiago, Cabo
Verde, em 1902. Faleceu em Cova da Piedade, Portugal, em 1971. Foi funcionário
público. Um dos membros mais importantes do movimento Claridade.
Publicou: Arquipélago. São Vicente: Cabo Verde, 1936; Ambiente.
Praia: Cabo Verde, 1941. Caderno de um Ilhéu. Lisboa: 1956.
Do site de António Miranda
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