quarta-feira, 25 de setembro de 2024

A "Ramalhal figura"



Ramalho Ortigão era tratado carinhosamente por "Ramalhal figura" pelos intelectuais seus contemporâneos. A seu respeito, Guilherme d'Oliveira Martins, jurista e político dos nossos dias, produziu uma belíssima nota biográfica que termina desta forma: Ao lado de Guilherme de Azevedo (João Rialto), sente-se a presença de João Ribaixo, que é naturalmente a inconfundível Ramalhal figura. aqui  

João Rialto, nos anos oitenta do século XIX dizia isto sobre Ramalho Ortigão, com aquele travo bem-humorado adoptado pelo autores do Álbum das Glórias:

Ramalho Ortigão possui todas as qualidades do homem honesto e varonil, servidas pelo estilo mais vigoroso e mais nítido do nosso tempo. A sua escrita larga e serena, em que há todos os clangores guerreiros e todos os arrulhos pacíficos, parece traçada com uma pena de águia...arrancada da asa duma pomba. Sobretudo, já o disse uma vez Eça de Queiroz, tem o génio decorativo. O programa das festas do Centenário de Camões é principalmente dele, e é a obra talvez de que ele mais se orgulha. Este programa que primeiro despertou um riso de desdém levou depois atrás de si as corporações, depois as escolas, depois as instituições, depois as famílias, depois a própria Carta!

Deve-se a ele definitivamente o último triunfo alcançado pelo Lusíadas das populações, e por aqui se prevê que o seu génio decorativo, animado pelo êxito, depois de vencer a teimosia mais rebelde na pessoa da rotina nacional, há-de animar-se decerto a cometimentos mais largos.

E adivinha-se que a glória suprema de Ramalho Ortigão seria que o Padre Eterno, para fazer um espectáculo assombroso, se lembrasse um dia de o encarregar do programa do Juízo Final!...

 In Álbum das Glórias*, referido no Diário da Liberdade, de Aniceto Afonso, pgs 321/322


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Efectivamente:

Por iniciativa da corporação da imprensa jornalística de Lisboa, constituiu-se, em março de 1880, uma Comissão Executiva para a celebração do Terceiro Centenário da Morte de Camões, presidida por Ramalho Ortigão, e de que faziam parte, Teófilo Braga, Eduardo Coelho, Luciano Cordeiro, Rodrigues da Costa, Pinheiro Chagas, Jaime Batalha Reis, Magalhães Lima e Rodrigues Pequito, que esteve na origem e foi o verdadeiro motor de arranque da ideia. Esta Comissão que obteve, desde o início, o apoio da Sociedade de Geografia e da Academia das Ciências, colheu, também, de imediato, a adesão ao Município lisbonense, a que presidia, na altura, José Gregório de Rosa Araújo, e das mais variadas corporações, associações, estabelecimentos de ensino, casas de espetáculo, etc., da capital. aqui


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Em relação ao Álbum das Glórias, acima referido, trata-se do título de uma colecção de folhas volantes publicadas em duas séries (1880–1883 e 1902), com caricaturas de políticos, intelectuais, artistas, jornalistas e outras figuras públicas portuguesas da época.
 



*Album das Glorias

1880-1883, 1885, 1902, Lisboa

Ilustrações: Rafael Bordalo Pinheiro

Textos: Barbosa Cohen (“Ri-bomba”), Guilherme de Azevedo (“João Rialto” e “Ripouco”), João Chagas (“João Rimanso”), D. João da Câmara (“João Evangelista”) e Júlio Dantas (“Rufo”), Ramalho Ortigão (“João Ribaixo”) e Rafael Bordalo Pinheiro (“Rimuito”)


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Lembremos que José Duarte Ramalho Ortigão, (1836-1915), escritor português que nasceu no Porto na Casa de Germalde, fundou os "Vencidos da Vida", grupo que assumia o carácter de uma sociedade exclusivista, congregando vultos da literatura, da política e frequentadores das rodas mundanas e aristocráticas. Também tomou parte activa na "Questão Coimbrã", célebre polémica literária que marcou a visão da literatura em Portugal na segunda metade do século XIX.

Foi um tempo efervescente em termos intelectuais e de posicionamento político, sendo de assinalar ainda as "Conferências do Casino" e a "Geração de 70", nas quais a nossa Ramalhal figura marcou presença.




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Imagens: Net



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