terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Natal Africano


Não há pinheiros nem há neve,

Nada do que é convendonal,*

Nada daquilo que se escreve

Ou que se diz... Mas é Natal.


Que ar abafado! A chuva banha

A terra, morna e vertical.

Plantas da flora mais estranha,

Aves da fauna tropical.


Nem luz, nem cores, nem lembranças

Da hora única e imortal.

Somente o riso das crianças

Que em toda a parte é sempre igual.


Não há pastores nem ovelhas,

Nada do que é tradicional.

As orações, porém, são velhas

E a noite é Noite de Natal.

in 'Cancioneiro'





Desde que Cabral Nascimento escreveu o poema, Natal Africano, muita coisa terá mudado no Continente Africano. O chamado progresso terá deitado as suas garras a muitas áreas e não propriamente para beneficiar os seus povos. 

África, terra de grandes riquezas, berço da humanidade segundo pesquisas levadas a cabo até agora, todos nós ligados por aquilo a que se convencionou chamar de Eva Mitocondrial;

Terra massacrada ao longo dos tempos pela cobiça de potências estrangeiras e, nessa senda, por governantes gananciosos, alguns. E embora se diga que cada um de nós tem de construir o seu próprio caminho, tenho para mim que a solução para África seria que a mitologia messiânica se tornasse realidade.

Há algo sumamente verdadeiro que o poeta refere no seu poema: as crianças e a similitude do seu riso em qualquer parte do mundo, e eu acrescentaria a sua predisposição para perdoar e darem-nos a oportunidade de sermos melhores pessoas:


Nem luz, nem cores, nem lembranças
Da hora única e imortal.
Somente o riso das crianças
Que em toda a parte é sempre igual.


Riso tantas vezes molhado de lágrimas, de fome, na mais completa miséria, sem agasalho suficiente, como se tem visto, por exemplo, nas levas de migrantes, às portas da velha Europa, por mar e por terra ...**  

Mas não só migrantes: Crianças, aqui e ali, que, se não forem ajudadas, terão talvez neste Natal, na noite de Natal que tanto apreciamos, uma das suas piores noites sem o mínimo para a sua sobrevivência. 
 


"Os Meninos do Huambo"
Poema de Manuel Ruy Monteiro (1976)
Musicado e interpretado por Paulo de Carvalho (1985)
Posteriormente cantado por Ruy Mingas ***



VOTOS DE FELIZ NATAL, 
MEUS AMIGOS



=====

João Cabral Nascimento,(1897-1978) poeta português, natural da Madeira. Foi professor, conservador das bibliotecas e arquivos nacionais e diretor do arquivo distrital e do Arquivo Histórico da Madeira. Colaborou na revista coimbrã Ícaro e foi o organizador da segunda série da antologia das Líricas Portuguesas, sendo ainda responsável pelos Poemas Narrativos Portugueses e pela Coletânea de Versos Portugueses. A sua poesia foi revelada por Fernando Pessoa e situa-se entre o Saudosismo e o Modernismo, constituindo um rigoroso registo poético, ...
Mais aqui.
Ver mais no Instituto Camões - aqui

*Aparecem "convendonal"  e "convencional"  em muitas publicações deste poema.

**São sete as rotas migratorias para acesso à UE - aqui

*** A Música "Os Menino do Huambo" - Estudo de Angelina Ngungui

Imagens: pixabay


20 comentários:

  1. Bom dia de toda paz, querida amiga Olinda!
    Que sensibilidade a sua!
    Um post natalino que abre um leque para a reflexão consciente de que temos tudo, mesmo que nos falte pessoas amadas...
    Saio da leitura e música com o 💙 cheio de esperança de dias melhores, mais igualitária, mais dignos dos seres humanos.
    "Somente o riso das crianças
    Que em toda a parte é sempre igual."
    Ainda bem...
    O seu acréscimo do perdão e de sermos pessoas melhores é um apelo de Deus para nós.
    Além de nós, outras realidades apontam emergências que não enxergamos pela nossa cegueira espiritual, querida.
    Sinta seus amigos junto a você em sua mesa farta de amor e fé, junto aos seus amados na Noite de Natal.
    Tenha uma semana natalina abençoada e feliz!
    Beijinhos carinhosos, festivos e fraternos
    💚❤️🌲😘

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  2. Belo poema que me fascinou ler
    Feliz Natal

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  3. Muito linda a poesia do Natal africano e realmente tanto deve ter modificado...Adorei o teu acrescimo lembrando das crianças...beijos, tudo de bom, FELIZ e ABENÇOADO NATAL! beijos, chica

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  4. É possível que, entre a data em que este poema foi escrito e os tempos actuais, muita coisa tenha mudado, mas... eu sou do tempo em que o Natal africano era exactamente como o lindo poema o descreve.
    O pinheiro era substituído por uma araucária (orocária chamava-se lá...) onde dependurávos os berloques que conseguíamos arranjar. E o calor! Era abrasador! Mas éramos tão felizes...

    Adorei o poema, que não conhecia.

    Um abraço apertadinho, carregadinho de Amizade.

    Um santo e feliz Natal, e um Ano Novo com muita saúde e Amor.

    Votos de uma feliz Terça Feira e boa semana.
    Beijinhos
    MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS

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  5. Sinto-me impotente perante tanta miséria, tanta tristeza!

    Abraço

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  6. Gostei muitissimo do poema e, mais ainda, das sua tão sentidas palavras, minha querida amiga, sobre África e sobre as crianças , cujo riso é igual em qualquer latitude e que , infelizmente, tanto sofrem , algumas.

    Desejo-lhe e aos seus um Natal de amor e harmonia e um excelente 2021, querida Olinda !

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  7. Boa noite Olinda!
    Gostei muito da sua postagem.
    Esse poema Natal Africano é muito bonito.
    Desculpa a demora em aparecer por aqui.
    Estive um pouco ausente esses meses.
    Desejo um Feliz Natal com muita luz, amor e infinitas bênçãos de Deus pra você e os teus. Que o espírito natalino lhe traga esperança renovada, e o ano de 2022 seja um ano de muitas coisas boas.
    Um beijo grande!

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  8. Querida África, bem haja por a trazer.
    ~CC~

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  9. Excelente poema, não conhecia.
    Obrigado pela partilha.

    A época natalícia não é sobre presentes, é sobre presença. Aquilo que podemos oferecer de mais importante aos outros é a nossa atenção, a nossa amizade verdadeira e o nosso amor incondicional, para que possamos irradiar luz e calor para aqueles que nos rodeiam.
    Desejo que o seu Natal seja brilhante de alegria, iluminado de amor, cheio de harmonia e repleto de paz.

    Beijo, querida amiga Olinda.

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  10. Infelizmente nem todos vão ter um Natal abençoado, pois por todo o mundo existe um mundo de dor, miséria e sofrimento.
    Belíssimo poema, de um poeta que desconhecia.
    Querida amiga para si e para a sua família, desejo um Feliz Natal 🎄 e que o Novo Ano lhe traga, um universo de alegrias, saúde, paz e amor.
    Beijinhos

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  11. O Continente africano tem outro Natal devido ao clima diferente. Cabral do Nascimento bem o descreve. Mas o riso das crianças é igual em todo os cantos do mundo, porque são elas que mais sentem a magia do Natal.
    Desejo-lhe, minha Amiga Olinda, um Natal cheio de amor e um ano de 2022 com tudo o que mais quer, especialmente saúde e paz.
    Um beijo.

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  12. Feliz Natal, querida amiga Olinda!
    Menino Jesus, nossa Alegria.
    Que Deus lhe dê um Natal muito abençoado junto aos seus amados!
    Saude, paz e amor sempre.
    Lembre-se dos amigos virtuais junto à sua mesa de Festa.
    Que não falte pão e Amor!
    Beijinhos carinhosos, festivos e fraternos
    💚🌲❤️😘

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  13. O Natal dos Simples - "Somente o riso das crianças

    Que em toda a parte é sempre igual"!...

    Os mlhores votos de Feliz Natal...

    abraço amigo


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  14. Beautiful poem, happy christmas

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  15. O natal é sempre natal seja onde for e como for
    O Menino Jesus virá trazendo amor para todos
    Que a estrela de Belém abrilhante e abençoe sua vida e de todos que convivem com você. Um feliz e iluminado Natal a todos nós!
    Beijos

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  16. Lindo o poema, querida amiga, mas em tudo há uma pontinha de tristeza se formos pensar bem...Nem todo o Natal é felicidade para todos:

    "Riso tantas vezes molhado de lágrimas, de fome, na mais completa miséria, sem agasalho suficiente, como se tem visto, por exemplo, nas levas de migrantes, às portas da velha Europa, por mar e por terra ..."

    Hoje é o legítimo Dia, e te desejo muita alegria. E para 2022, tudo, minha amiga, principalmente saúde e paz. O resto vem atrás!
    Beijinhos, querida, obrigada pelos votos!
    Juntas em 2022!

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  17. Belo poema de Cabral do Nascimento!
    Parece que o nosso planeta tem um fado para cumprir Chega o Natal e, conjugado com um sentimento de profundo amor, queremos um mundo melhor. E é isso que desejo para 2022.
    Boa entrada, querida amiga Olinda!

    Grande abraço.

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  18. Um poema muito realista em que o poeta deixa bem vincada a marca do seu estro.
    Obrigado pela partilha.
    Continuação de Boas Festas.
    Juvenal Nunes

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  19. Uma descrição muito sentida do que é (era) o Natal Africano.
    Portentoso, sensível, real este Poema de Cabral do Nascimento.
    Obrigado por no-lo trazeres.
    Felizes Festas, Olinda.



    Beijo
    SOL da Esteva

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