CENA XIV
Madalena, Jorge e Romeiro
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Jorge - Sois português?
Romeiro - Como os melhores, espero em Deus.
Jorge - E vindes?...
Romeiro - Do Santo Sepulcro de Jesus Cristo.
Jorge - E visitastes todos os Santos Lugares?
Romeiro - Não os visitei; morei lá vinte anos cumpridos.
Madalena - Santa vida levastes, bom romeiro.
Romeiro - Oxalá! Padeci muita fome, e não a sofri com paciência; deram-me muitos maus tratos, e nem sempre os levei com os olhos n'Aquele que ali tinha padecido tanto por mim... Queria rezar e meditar nos mistérios da Sagrada Paixão que ali se obrou..., e as paixões mundanas, e as lembranças dos que se chamavam meus segundo a carne, travavam-me do coração e do espírito, que os não deixavam estar com Deus, nem naquela terra que é toda Sua. Oh! não merecia estar onde estive: bem vedes que não soube morrer lá.
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Madalena - Pois éreis cativo em Jerusalém?
Romeiro - Era: não vos disse que vivi lá vinte anos?
Madalena - Sim, mas...
Romeiro - Mas o juramento que dei foi de que, antes de um ano cumprido, estaria diante de vós e vos diria da parte de quem me mandou...
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Madalena (Aterrada.)
- E quem vos mandou homem?
Romeiro - Um homem foi, e um honrado homem a quem unicamente devi a liberdade... a ninguém mais. Jurei fazer-lhe a vontade e vim.
Madalena - Como se chama?
Romeiro - O seu nome nem o da sua gente nunca o disse a ninguém no cativeiro.
Madalena - Mas, enfim, dizei vós...
Romeiro - As sua palavras, trago-as escritas no coração com as lágrimas de sangue que lhe vi chorar, que muitas vezes me caíram nestas mãos, que me correram por estas faces. Ninguém o consolava senão eu... e Deus! Vede se me esqueceriam as suas palavras.
Jorge - Homem, acabai!
Romeiro - Agora acabo: sofrei, que ele também sofreu muito. Aqui estão as suas palavras: "Ide a D. Madalena de Vilhena e dizei-lhe que um homem que muito bem lhe quis está vivo por seu mal e daqui não pode sair nem mandar-lhe novas suas de há vinte anos que o trouxeram cativo".
Madalena (Na maior ansiedade.)
- Deus tenha misericórdia de mim! E esse homem... esse homem... Jesus! esse homem era... esse homem tinha sido...levaram-no aí de onde?...De África?
Romeiro - Levaram.
Madalena - Cativo?
Romeiro - Sim.
Madalena - Português?... cativo da batalha de...
Romeiro - Alcácer-Quibir.
Madalena (Espavorida)
- Meu Deus, meu Deus! Que se não abre a terra debaixo dos meus pés?... Que não caem estas paredes, que me não sepultam já aqui?...
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CENA XV
Jorge e o Romeiro
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Jorge - Romeiro, romeiro! quem és tu?!
Romeiro - (Apontando com o bordão para o retrato de D. João de Portugal.)
- Ninguém.
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É o regresso de D. João de Portugal, do reino dos mortos quase. Percebe-se o terror, o pânico de D. Madalena de Vilhena que já se encontrava casada e mãe de uma filha, Maria. Uma tragédia.
Hoje, Dia Mundial do Teatro, trago ao Xaile Almeida Garrett, evocando a sua obra "Frei Luís de Sousa", através de excertos das Cenas XIV e XV, Acto II (pag. 117 a 123).Ed. Areal Editores.
E quem se interessar por estas coisas poderá deslocar-se ao antigo Picadeiro Real, na Rua da Escola Politécnica, que vai receber ou já recebeu, hoje, a exposição "Revista ao Parque", que reúne num só espaço os quatro teatros do Parque Mayer: Parque Mayer, Teatro Maria Vitória, Variedades, Capitólio. (Cenários, adereços, fatos de revista, programas e curiosidades).
Imagem: daqui
Ver: O Sebastianismo em Frei Luís de Sousa
O tempo passa e o nosso ideal Sebastianista permanece. Como estamos sedentos de um D Sebastião que tarda em aparecer pois tudo o que nos chega não vem do cativeiro, mas sim do viveiro...é ver como falam e actuam de forma idêntica, quais psicopatas!
ResponderEliminarO Sebastianismo está-nos impresso no sangue. Estamos sempre à espera que da bruma que é a nossa atualidade salte um D. Sebastião capaz de devolver ao País o seu esplendor, e a alegria aos seus habitantes. O pior é que nem com um binóculo se descortina alguém capaz disso
ResponderEliminarUm abraço e bom fim de semana
Que bela postagem fez, trazendo-nos Almeida Garrett, para comemorar uma data que nem sempre é lembrada. Bjs.
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