Sinto-as a entrar pé-ante-pé. Surgem de nenhures, ligeiras e afáveis prometendo descobertas, com um não sei quê de mistério. Um laivo de sabor a fruta, de perfume, de mil odores. Passam, e deixam o seu rasto. Sigo-as assim, ouvindo os seus sussurros, um risinho casquinado destaca-se. Oiço rumores da sua passagem. Subo escadas, desço escadas. Procuro nos cantos e recantos. Perscruto sombras, uma réstia de luz que distingo por entre as frinchas. A espaços, oiço o silêncio da noite. É um silêncio familiar que fala comigo. Já lhe conheço a cadência. Uma cadência que se vai alterando conforme a madrugada se anuncia. Também elas a adivinham. Saem para a brisa fresca, de sabor a sal. Vou-lhes no encalço. Vejo que a alvorada vai tingindo a linha do horizonte. Elas já menos irrequietas, menos ariscas, alinham-se. Os meus joelhos afundam-se na areia molhada e, com elas, começo a desenhar formas. Apercebo-me de uma onda que começa a formar-se. Uma coisa linda que me enternece. É um espectáculo para os meus olhos que, entretanto, se aplicam na sua tarefa. Elas ajudam, eu sei, mostram-se afáveis. E, a pouco e pouco, surge: 'Para ser grande sê inteiro'. Contente, contemplo a minha obra. Consegui por fim agarrá-las e construir uma ideia. Mas será que a ideia é minha? Há qualquer coisa de estranho que ecoa dentro de mim. Há um sentimento de impotência que se afirma. Debato-me com esta dúvida e também com a quase certeza de que já não há ideias novas. Fogem de nós a sete pés. Um marulhar fininho, sorrateiro, aproxima-se. É a onda que vem buscar o que lhe pertence. Espraia-se e cobre as palavras alinhadas na areia e leva-as...
Da querida Emília, o contraponto (comentário):
Mas...
Serão novas as ideias? Novas acho que nunca são; muitas já vêm do nosso passado, fruto das ideias dos nossos antepassados e do passado desse antepassados; são as mesmas as ideias, mas cada um as foi melhorando à sua maneira...cada um as foi transformando de acordo com as suas necessidades...de acordo com as suas perspectivas de vida...de acordo com os seus sonhos.E o dia chega...algumas das ideias são postas em prática, mas outras nem sequer nelas pensamos. Resta-nos esperar que a noite caia...que o sono chegue e que desta vez a insonia nos poupe a mais ideias.
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Muito obrigada, amiga.
Beijinhos
Olinda
Imagem: Internet
Um texto maravilhoso.
ResponderEliminarAqui pode-se sonhar. Dar asas à imaginação...ir...voar sem se preocupar em voltar...
Belíssimo texto que tenta captar a eternidade do instante, que fugaz....
ResponderEliminarBeijos!!
Um texto muito belo, que demonstra como é difícil agarrar as ideias e alinhá-las.
ResponderEliminarQuerida Olinda, um abraço grande
E as insónias chegam de mansinho, na calada da noite, num noite em que a queríamos serena...restauradora...sossegada; mas a insónia não quer saber e entra sem pedir licença e se instala.E traz ideias, a insonia...ideias que nos aborrecem, que nos inquietam; aos poucos vamos deixando que elas entrem; vamos assimilando uma a uma e cada vez mais despertos chegamos a sorrir.. Mas que belas ideias!!! Sou muito capaz de as colocar em acção! E o sossego toma o lugar da insonia e o sono chega restaurador. Mas será que estas ideias são novas? Será que são nossas? Bem...agora são nossas, pois assimilamos-las...interiorizamos-las; foram-nos oferecidas...são nossas agora! Serão novas as ideias? Novas acho que nunca são; muitas já vêm do nosso passado, fruto das ideias dos nossos antepassados e do passado desse antepassados; são as mesmas as ideias, mas cada um as foi melhorando à sua maneira...cada um as foi transformando de acordo com as suas necessidades...de acordo com as suas perspectivas de vida...de acordo com os seus sonhos.E o dia chega...algumas das ideias são postas em prática, mas outras nem sequer nelas pensamos. Resta-nos esperar que a noite caia...que o sono chegue e que desta vez a insonia nos poupe a mais ideias. Belo texto, Olinda! Uma boa ideia, aqui, para reflexão.Obrigada pela partilha deste magnífico texto. Fica bem, amiga e espero que a insonia não atrapalhe o teu descanso. Melhor que as ideias surgem durante o dia, não é verdade? Beijinhos
ResponderEliminarDesculpa o erro...melhor que as ideias surjam. Sabes, o facto de haver moderação impede que façamos revisão do que escrevemos. Há ainda outros erritos, mas...penso que este é o mais grave. Beijos
EliminarEmília
Minha querida
EliminarA tua escrita flui com uma agilidade que me encanta e que eu muito admiro. E sempre que as minhas ideias se apresentam mais confusas, :) elas conduzem-me de volta ao bom caminho, permitindo-me pisar, de novo, o chão do raciocínio lógico.
E a prova é que vou seleccionar uma passagem do teu comentário, colocando-a no post, como complemento do mesmo.
E nem te peço autorização. Isto vai ser assim: sem apelo nem agravo. :))
Conto sempre contigo aqui no Xaile de Seda.
Muito obrigada.
Beijinhos
Olinda
A diferença está no pormenor
ResponderEliminarno vagaroso instante
Olá Olinda,eu comentei que vou ficar ausente dos problemas que escrevi abaixo.
ResponderEliminarDesculpe se eu não soube me explicar.
Obrigada pelo carinho.beijinhos.
Extraordinário post! Escolha primorosa das palavras. A fugacidade que podemos sempre eternizar...com ecos de Pessoa por fundo.
ResponderEliminarBeijo
por momentos fui para este local...
ResponderEliminarSónia
Taras e Manias
Nas noites insones, nos permitimos sonhar mais...de pé no chão...
ResponderEliminarBeijos, querida amiga Olinda, uma rica e produtiva semana.
Lúcia
Eu fui com elas também, Olinda! Desde miúda que sei que um texto é bom quando o visualizo em imagem ao lê-lo, e este seu é muito bom!
ResponderEliminarBeijinhos
Belíssimo texto. Nada dura para sempre, o que não nos impede de viver os momentos e eternizá-los nas lembranças. Bjs.
ResponderEliminarObservei o mundo junto contigo, nesta tua insônia poética!
ResponderEliminarUm beijo!
;))