sábado, 13 de fevereiro de 2021

A Serenata






Vestida de gemidos de bordão,
lancinâncias de violino,
na noite parada
vem descendo a seresta.

Sumiu-se a cidade barulhenta
inimiga das crianças e dos poetas.

Uma voz canta sentimentalmente um samba.

          Aquele aperto de mão
          não foi adeus!

Os cavaquinhos desmaiam de puro sentimento,
a cidade morreu lá longe,
e a lua vem surgindo cor de prata.

Nessa história de amor todos são iguais,
até o rei volta sua palavra atrás...

O meio tom brasileiro deixa interrogativamente a sua nostalgia.

É hora que os poetas escolheram
para a procura dos seus mundos perdidos...

Amanhã a cidade virá novamente
inimiga dos poetas.
Mas agora ela dorme,
ela não sabe que os poetas falam com Nossenhor,
com a lua e as estrelas,
nesta hora tão lírica...

Menina romântica, irmã
das crianças e dos poetas...
A tua janela, florida de esperanças,
é um mistério que a cidade não entende.

Passa a serenata.
Mas no coração dos que temem a primeira luz do dia que vai chegar
ficam os gemidos do violão e do cavaquinho,
vozes crioulas neste noturno brasileiro
de Cabo Verde.


Oswaldo Alcântara




Osvaldo Alcântara, pseudônimo poético de Baltazar Lopes da Silva, nasceu na Ilha de São Nicolau, Cabo Verde, em 1907. Advogado e filósofo. Professor, Doutor Honoris Causa pela Universidade de Lisboa. Um dos fundadores da revista Claridade, marco da literatura cabo-verdiana.

Publicou: Chiquinho (romance), São Vicente, 1947; O Dialeto crioulo de Cabo Verde, Lisboa, 1957; Cabo Verde visto por Gilberto Freire, Praia, Cabo Verde, 1956; Antologia da ficção cabo-verdiana contemporânea, Praia, Cabo Verde, 1960.

Conhecemo-lo, não é verdade? 
Veja-o aqui, no Xaile de Seda




Humbertona



Bom fim de semana, amigos.

======
Extraídos de

BARBOSA, Rogério Andrade. No ritmo dos tantãs; antologia poética dos países africanos de língua portuguesa; Brasília: Thesaurus, 1991. 165 p.
Site de António Miranda:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_africana/cabo_verde/osvaldo_alcantara.html


5 comentários:

  1. Poema lindíssimo que me fascinou ler. Elogio o seu bom gosto musical.
    .
    Tenha um feliz fim-de-semana, com Saúde, Paz e Amor.
    .
    Pensamentos e Devaneios Poéticos
    .

    ResponderEliminar

  2. Aquele aperto de mão
    não foi adeus!

    Li e reli o belíssimo poema dum poeta que não conhecia, ao som das mornas do vídeo, maravilhoso este momento Olinda! Obrigada!

    Um beijinho e bom fim de semana também para si.

    ResponderEliminar
  3. Acho que os poetas são de "mundos perdidos".

    "Passa a serenata.
    Mas no coração dos que temem a primeira luz do dia que vai chegar
    ficam os gemidos do violão e do cavaquinho,
    vozes crioulas neste noturno brasileiro
    de Cabo Verde".

    Por vezes fico muda.

    Obrigada, Querida amiga Olinda.

    Beijos.

    ResponderEliminar
  4. O ritmo, a melodia, os versos, tudo lindo! E como passa com beleza a serenata! Amei! Bjs.

    ResponderEliminar
  5. A tua janela, florida de esperanças,
    é um mistério que a cidade não entende.

    Olá, querida amiga Olinda!
    Ninguém entende... Como não entende o Amor, as vezes.
    Linda escolha a de hoje.
    Esteja bem, amiga!
    💐👼🙏🕊️😘

    ResponderEliminar