quarta-feira, 24 de julho de 2019

Todas as Palavras



As que procurei em vão,
principalmente as que estiveram muito perto,
como uma respiração,
e não reconheci,
ou desistiram e
partiram para sempre,
deixando no poema uma espécie de mágoa
como uma marca de água impresente;
as que (lembras-te?) não fui capaz de dizer-te
nem foram capazes de dizer-me;
as que calei por serem muito cedo,
e as que calei por serem muito tarde,
e agora, sem tempo, me ardem;
as que troquei por outras (como poderei
esquecê-las desprendendo-se longamente de mim?);
as que perdi, verbos e
substantivos de que
por um momento foi feito o mundo
e se foram levando o mundo.
E também aquelas que ficaram,
por cansaço, por inércia, por acaso,
e com quem agora, como velhos amantes sem
desejo, desfio memórias,
as minhas últimas palavras.


   (1943-2012)


Manuel António Pina (Sabugal, 18 de novembro de 1943 — Porto, 19 de outubro de 2012) foi um jornalista e escritor português, premiado em 2011 com o Prémio Camões.

A obra de Manuel António Pina incidiu principalmente na poesia e na literatura infanto-juvenil embora tenha escrito também diversas peças de teatro e de obras de ficção e crónica. Algumas dessas obras foram adaptadas ao cinema e televisão e editadas em disco.

A sua obra se difundiu em países como França (Francês e Corso), Estados Unidos, Espanha (Espanhol, Galego e Catalão), Dinamarca, Alemanha, Países Baixos, Rússia, Croácia e Bulgária. aqui

Em 2005, em 9 de maio, foi feito Comendador da Ordem do Infante D. Henrique.

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Poema - daqui
In: Todas as Palavras-Poesia reunida
Imagem - daqui

12 comentários:

  1. Um belíssimo poema de um poeta que conheço muito mal.
    Abraço

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  2. será "que mais vale perder um amigo que perder a ocasião para dizer a palavra certa"? confesso o meu embaraço, até porque como bem diz o poema, por vezes, as palavras vêm ter connosco e não as reconhecemos e, por outro lado, são raros os amigos à prova de todas as palavras...

    ... no entanto há palavras que são "pedras vivas" que ficam a arder pela vida fora.

    o poema é muito belo, Olinda!
    que nunca as palavras se "entardeçam" no (dis)curso da vida !

    abraço



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  3. Fantástica publicação. Adorei :))

    Hoje:-Pétalas de rosa em cálidos sorrisos

    Bjos
    Votos duma óptima Quinta - Feira.

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  4. Não conhecia Manuel Antonio Pina, belíssimo poema que tive o prazer de conhecer seu autor e ler; sim, 'Todas as Palavras' é lindo.
    Um beijo, querida Olinda, bons dias pela frente!

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  5. Gosto da poesia do Manuel António Pina.
    E este poema (boa escolha) não foge à regra.
    Olinda, um bom fim de semana.
    Beijo.

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  6. As palavras, tão esquivas e tão cúmplices…
    Manuel António Pina, um Poeta que não nos cansamos de ler. Foi bom encontra-lo aqui.
    Um beijo, minha querida Amiga Olinda.

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  7. Querida Olinda, hoje, aproveitando um momento mais sossegado, vim ao xaile deixar umas palavras, mas não todas as que gostaria de escrever. É sempre assim, há palavras que são ditas sem necessidade, outras que precisariam sair e ficam " presas " talvez por medo do que provocariam e há ainda aquelas que estamos sempre a dizer e que nunca são demais; no entanto, há em cada um nós um arrependimentozinho por não termos dito mais vezes a palavra " amo-te " a quem já se foi, não termos dito que eram muito importantes para nós, que valiam muito a pena na nossa vida. Agora resta aprendermos e não pouparmos essas palavras de amor, de gratidão de incentivo, de elogio; elogiamos pouco, agradecemos pouco, incentivamos pouco; palavras de queixumes, essas, são muitas, amiga. Estive a ler os belos poemas que partilhaste connosco e não saberia escolher um como preferido; Achei muito interessante o que li sobre a palavra " idos "; sempre a aprender! Muito obrigada, querida amiga e, sempre que tiver oportunidade aqui estarei para apreciar a beleza dos teus posts. Sabes que estás sempre no meu coração e a falta de palavras minhas aqui no xaile não significa falta de amizade; esta palavra para mim é preciosa e sei que, sem procurar muito, a encontro sempre por aqui. Um beijinho, um bom fim de semana e muita saúde para todos vós
    Emilia

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  8. As palavras fazem parte da nossa vida e acompanham-nos até ao nosso final.
    Maravilhoso poema.
    Bom fim de semana
    Beijinhos
    Maria

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  9. Poema que é parte de nós, do nosso viver, do nosso sentir. Quem não se identificar com Manuel António Pina, pode saltar fora.
    Parabéns pela escolha e selecção.


    Beijo
    SOL

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  10. Palavras! Quantos usos e desusos se não a sabemos empregar
    E que sabedoria deste maravilhoso poeta com belas palavras veio nos encantar
    Beijinhos doces perfumados de poesia

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  11. Bom dia de nova semana, querida amiga Olinda!
    "As que calei por serem muito cedo,
    e as que calei por serem muito tarde,
    e agora, sem tempo, me ardem;"
    Interessante as palavras que querem ser e não são.
    Um poema de lamento de uma certa forma. Eu senti
    Tenha dias abencoados!
    Bjm carinhoso e fraterno de paz e bem

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  12. Como doem palavras fugidias, perdidas ... como dói o viço que tiveram e como se amam as que nos deixaram ...

    A obra de Manuel Pina merece o nosso enorme apreço.

    Grande abraço, querida Olinda.

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