O meu avô escravo
legou-me estas ilhas incompletas
este mar e este céu.
As ilhas
por quererem ser navios
ficaram naufragadas
entre mar e céu.
Agora
aqui vivo eu
e aqui hei-de morrer.
Meus sonhos
de asas desfeitas pelo sol da vida
deslocam-se como répteis sobre a areia quente
e enroscam-se raivosos
no cordame petrificado da fragata
das mil partidas frustradas.
Ah meu avô escravo
como tu
eu também estou encarcerado
neste navio fantasma
eternamente encalhado
entre mar e céu.
Como tu
também tenho a esmola do luar
e por amante
essa mulher de bruma, universal, fugaz,
que vai e vem
passeando à beira-mar
ou cavalgando sobre o dorso das borrascas
chamando, chamando sempre,
na voz do vento e das ondas.
Aguinaldo Fonseca
(1922-2014)
(Claridade, nº8, 1958)
in: No Reino de Caliban, pgs 158/159
Imagem:Trabalho de Eduardo Malé,
artista são-tomense
Olá, tudo bem ?
ResponderEliminarVim até cá, para desejar-te um fim de semana muito bom.
Com muito Sol. Muito calor. E muitas piscinas refrescantes, como as da Cidade de São Paulo. Isto é, para as Cidades, onde o Mar, não oscula as suas orlas.
Um abraço do
José Maria Souza Costa.
Olinda Melo, bom dia, desde cá do Brasil
ResponderEliminarEu também, tenho um blogue. Muito simples, é verdade. Escrito, sem a preocupação de regras gramaticais. Mas, feito com muita seriedade. Ainda que muito simples. Estou cá lhe convidando em visitar-me, e se possível seguirmos por lá. Eu, estou cá desde já, seguindo o Vosso
Um abraço abrasileirado. Aguardo-te.
Olá, José
EliminarPor cá o Mar tem osculado as suas orlas e extravasado as mesmas. É tanto o vento e a chuva juntamente com o frio que, presentemente, só uma piscininha de água tépida me faria decidir em cair à água. :)
Muito obrigada pela sua visita e pelas suas palavras refrescantes. Já fui ao seu blog e deixei lá o meu comentário.
Abraço
Olinda
A escrita africana deveria ser muito mais divulgada e conhecida, realmente.
ResponderEliminarMas a verdade é que são sempre os vencedores e os conquistadores a contar a sua versão do que aconteceu...
Minha querida Olinda, bom fim de semana
Tem razão, querida São. A História tem, realmente, esta falha muito grande.
EliminarHá, por exemplo, uma obra do autor franco-albanês, Amin Malouf, 'As cruzadas vistas pelos árabes', onde os cristãos são vistos como 'bárbaros', sem honra, sem dignidade e sem ética social, diferentemente da descrição panegírica das mesmas na historiografia ocidental.
Beijinhos
Olinda
Minha querida Olinda
ResponderEliminarPode-se considerar como uma forma de homenagem que prestas a este poeta cabo-verdiano que nos deixou há poucos dias.
Estive na sua terra natal, Mindelo, dois anos, e nunca lá ouvi falar dele. E olha que nessa altura eu lia muito mais poesia do que presentemente. Não é que tenha deixado de gostar, claro, só que "outros valores mais altos se alevantam"...
Só cá, ao investigar poetas de língua portuguesa (publiquei alguns, há um certo tempo), é que o descobri.
O seu valor não foi muito reconhecido, não. Ele escreveu um poema que, para mim, é talvez o mais bonito - "Mãe preta".
Mas a tua escolha também é muito boa.
Muito obrigada pelas tuas palavras tão lindas e carinhosas, lá na minha «CASA».
Continuarei a escrever, sim, embora, por enquanto, a minha poesia seja... de principiante.
Com o carinho e apoio de todos... tentarei não vos desiludir muito :)
Um bom Domingo, querida.
Beijinhos
Querida Mariazita
EliminarTendo estado no Mindelo durante dois anos, sentiste o cheiro da terra, a 'morabeza' e hospitalidade das gentes de lá.
Nesta minha homenagem a Aguinaldo Fonseca também trouxe a 'Mãe Preta', (num post um pouco mais baixo) poema considerado de referência à afirmação da africanidade ou negritude como conceito, do poeta. Realmente consta que ele não foi muito lembrado. Também é certo que se radicou em Portugal e que deixou de publicar. Enfim, os senhores da cultura deveriam ter em atenção estes marcos da literatura.
Quanto aos teus trabalhos: Gosto de ler tanto em prosa como em poesia. Nunca nos desiludes. :)
Beijos
Olinda
Querida amiga
ResponderEliminarMagia esta a que existe em um poema.
Mesmo a tanto tempo escrito,
pode-se sentir as mãos
e os sentimentos,
de quem tão intensamente
o escreveu.
Ser feliz,
é deixar-se engravidar
pela simplicidade da alegria.
É isso mesmo, caro Aluísio.
EliminarDeixar-nos enamorar de quem tão bem exprime os seus sentimentos e os do seu povo. E a magia se faz poema.
Abraço.
Olinda
Prezada Olinda, como é bom estar aqui e saborear em toda sua plenitude, a beleza dos poemas postados. Quero reiterar meu apreço por tão lindo espaço que você carinhosamente administra.
ResponderEliminarUm fraterno abraço, minha admiração sempre.
Caro amigo Poeta
EliminarTão grande a minha alegria ao vê-lo aqui, com as suas palavras sempre lindas e atenciosas.
Desejo-lhe tudo de bom. Irei ao seu espaço visitá-lo, embora saiba que não tem publicado, ultimamente.
:)
Um grande abraço
Olinda
E... duma maneira ou doutra, não somos todos escravos?
ResponderEliminarBeijinhos!
Talvez sim, Caro Vieira Calado. Há muitas outras escravidões, muitas vezes nascidas no nosso íntimo, amarras das quais não nos libertamos. Importante abrir-nos para o mundo e ver mais longe e alargar horizontes.
EliminarNão tenho podido comentar no seu blogue. Há lá um pormenor que eu não percebo.Mas tenho-o visitado e leio sempre os seus poemas com muito prazer.
Abraço
Olinda
Me embrenho na poesia caboverdiana, africana, com a mesma necessidade, sede e fome com que me embrenho na brasileira e portuguesa. Digamos que tenho especial apreço pela poesia luso-afro-brasileira, sem desconsiderar as demais, todavia, essas três são deveras importantes para mim, posto que, são a minha formação.
ResponderEliminarA poesia do Aguinaldo, me fez reler alguns poemas do Corsino Fortes, em especial a trilogia: A cabeça calva de Deus: Pão & fonema; Árvore & tambor. Creio que o conheces, sim? Eu esperei quase dois meses, para que o meu livro, A Cabeça Calva de Deus, chegasse de Portugal, via livraria, mas valeu a espera!
Mas deixo-te mesmo assim, uns linkes, que penso, vale a pena espiar:
http://www.buala.org/pt/cara-a-cara/corsino-fortes-e-sua-poetica-semeadora-da-cabeca-calva-de-deus
http://cdeassis.wordpress.com/2009/05/31/de-cabo-verde-corsino-fortes/
Beijos, amiga!
Trago mais um link:
ResponderEliminarhttp://www.escritas.org/pt/corsino-fortes
Beijo!
;))
EliminarVê-se que o propósito de 'não-evasão' em Corsino Fortes se aproxima da 'nova poesia' adoptada por Aguinaldo Fonseca. Obrigada pelos links que me trouxeste. Permitiram-me actualizar alguns dados e encontrar outros que já eram do meu conhecimento. Na Antologia 'No reino de Caliban', organização de Manuel Ferreira, tenho alguns poemas de 'Pão & Fonema', 1974, e alguns outros publicados na revista Claridade, em 1960, no Boletim dos Alunos do Liceu Gil Eanes, e na Revista Cabo Verde. Um deles é 'Pecado Original', também constante de um dos links, e de que gosto muito. Registo este apontamento:
"(...)
E não poder fugir
Não poder fugir nunca
A este destino
De dinamitar rochas
Dentro do peito..."
Urge que me actualize em relação às suas obras mais recentes.
Querida amiga, emociona-me a abrangência dos teus gostos poéticos, tão iguais aos meus. Agradeço o teu apreço, as palavras que dedicas aos posts e o interesse que pões nestas nossas conversas.
:)
Beijinhos
Olinda