segunda-feira, 14 de maio de 2012

Lenda maubere


O crocodilo que se fez Timor

Disseram, e eu ouvi e acreditei, que há muitos séculos um crocodilo vivia num pântano. Este crocodilo sonhava crescer e ter mesmo um tamanho descomunal. Mas a verdade é que ele não só era pequeno, como vivia num espaço muito apertado. Tudo à sua volta era estreito, somente o seu sonho era grande.
Um pântano é o pior sítio para se morar... e, ainda por cima, sem alimentos em abundância, daqueles tão a gosto de um crocodilo!
Naturalmente que tudo tem um limite. Incluindo a resistência à fome. E o crocodilo começou a sentir a fraqueza que lhe quebrava o ânimo e o definhava. Os seus olhos iam-se amortecendo e já quase não podia levantar a cabeça e abrir a boca.

Tenho de sair deste lugar e procurar caça mais além... - pensou.
Esforçou-se e penosamente galgou a margem, caminhando através do lodo e, depois, da areia. O sol estava a pino, aquecendo a areia e transformando o chão em brasa. O crocodilo começou a perder o resto das suas forças e sentiu que se parasse ali, iria morrer assado.
Foi nessa altura que passou um rapazinho a cantarolar e quando o viu, perguntou:

Que tens Crocodilo?! Tens as pernas partidas ou caiu-te alguma coisa em cima?Não, não parti nada! - respondeu - Estou inteiro, mas, apesar de ser pequeno de corpo, há muito que não aguento com o meu próprio peso. Imagina que já nem tenho forças para sair deste braseiro.- Se é só por isso, posso ajudar-te! - respondeu o rapazinho e logo de seguida, deu uns passos, carregou o crocodilo e foi pô-lo à beira do pântano.

Quando o rapaz o poisou no chão molhado, o crocodilo sorriu, dançou com os olhos, sacudiu a cauda e disse-lhe:

Obrigado. És o primeiro amigo que encontro. Olha, não posso dar-te nada! Pouco mais conheco que este charco, aqui tão à nossa vista... mas se um dia quiseres passear por aí fora, atravessar o mar, vem ter comigo!Gostava mesmo, porque o meu grande sonho é ver que mais há por esse mar fora.Sonho?!!... falaste em sonho?!! Sabes, eu também tenho esse sonho! Se um dia quiseres viajar mar fora, vem ter comigo. – disse-lhe o crocodilo.

Passados uns tempos, o rapazinho apareceu ao crocodilo. Já quase o não reconhecia. Via-o já sem sinais das queimaduras, mais gordo, bem comido...

Ouve, Crocodilo, o meu sonho não acabou e eu não o aguento mais cá dentro! Gostava de me meter ao mar...O prometido é prometido... Aquele meu sonho... mas com a caça que tenho arranjado, quase me esqueci dele. Fizeste bem em vir lembrar-mo, rapazinho. Queres ir, agora mesmo, por esse mar fora?Isso, isso, crocodilo...

Pois, eu agora também quero ir. Vamos lá então!O rapazinho acomodou-se no dorso do crocodilo, como se fosse numa canoa, e partiram para o alto mar.
Era tudo tão grande e tão lindo!
O que mais surpreendia os dois era o próprio espaço, o tamanho que se estendia à sua frente e para cima, uma coisa sem fim.
E navegaram dia e noite, noite e dia, nunca paravam. Viram ilhas de todos os tamanhos, de onde as árvores e as montanhas lhes acenavam. E as nuvens também. Não sabiam se era mais bonito os dias se as noites, se as ilhas, se as estrelas.
Navegaram, navegaram sempre voltados para o sol, até que um dia o crocodilo se cansou.

Ouve-me rapazinho, já não posso mais! O meu sonho acaba mesmo aqui... - disse, com voz débil, o crocodilo.

O meu não vai acabar, nunca! - respondeu, o rapaz, com voz firme.

Ainda este não tinha terminado de dizer a última palavra e o crocodilo começou a transformar-se. Aumentou, aumentou de tamanho, sem nunca perder a sua forma primitiva, transformando-se numa ilha carregada de montes, de florestas e de rios.
É por isso que Timor tem a forma do crocodilo.


De Canto e Lenda Maubere, recolha de Fernando Sylvan.

Texto retirado de:
AQUI
Imagem:internet

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