Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos à boca
e viesse o que viesse.
Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,
não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.
António Gedeão
Grande poema amiga. E assenta que nem luva no momento actual.
ResponderEliminarUm abraço e Feliz dia.
Querida Elvira
EliminarAntónio Gedeão consegue fazer, de forma magistral,um relato das tristezas e dificuldades por que passava (e passa) a humanidade, nós incluídos nela. Mas há ainda esperança, segundo ele, por pouca que seja...
Beijinhos
Olinda
Querida Olinda:
ResponderEliminarSe eu não soubesse o nome do autor, adivinhava. Só Gedeão, consegue misturar simplicidade com génio.
Não sei, qual o poema dele, que mais gosto. Deste gosto muito.
Beijinho
Maria
Minha amiga Maria
EliminarÉ assim mesmo, em todos os poemas dele encontramos este génio, este falar de coisas que nos tocam, com as quais nos identificamos. E não há como escolher...
Beijinhos
Olinda
Sempre me fascinou a forma como o pedagogo Rómulo Vasco da Gama de Carvalho, pegando na química, foi fazendo com que casassem as acçãoes, com as reacções. Um processo alquímico, penso.
ResponderEliminarExcelente escolha, minha estimada Olinda!
De uma química ou alquimia de espantar. Rómulo de Carvalho tinha este dom de nos deixar perplexos perante a sua maneira de pegar nas palavras e emprestar-lhes fogo e coerência. Disse acima à minha amiga Maria que não há forma de escolher de entre os seus poemas, mas a 'Calçada de Carriche' mexe comigo, pelos versos curtos, pela cadência, pelo escrutínio da verdade que o poema carrega.
EliminarMeu amigo Bartolomeu, muito obrigada.
Abraço.
Olinda
Olinda, Querida
ResponderEliminarA excelência das Palavras, que Gedeão nos legou, assenta na actualidade que nem uma luva.
Uma bela escolha, tua.
Beijos
SOL
http://acordarsonhando.blogspot.pt/
Meu caro Sol da Esteva
EliminarConcordo, é uma verdadeira excelência. As Palavras parecem ganhar vida e esta apresenta-se crua e bela ao mesmo tempo,penso, mercê da alquimia de que fala Bartolomeu.
Obrigada pela visita.
Abraço
Olinda
Belo poema, obrigado pela partilha!
ResponderEliminarVim agradecer o comentário feito e desejar um feliz final de semana :)
Um abraço.