quarta-feira, 25 de abril de 2012

Dez reis de esperança

Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, nem bebia,
nem falava com ninguém.
Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos à boca
e viesse o que viesse.
Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas
a cair impertinente,
aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,
não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram, e não perceberam,
essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,
se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.


António Gedeão

9 comentários:

  1. Grande poema amiga. E assenta que nem luva no momento actual.
    Um abraço e Feliz dia.

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    1. Querida Elvira

      António Gedeão consegue fazer, de forma magistral,um relato das tristezas e dificuldades por que passava (e passa) a humanidade, nós incluídos nela. Mas há ainda esperança, segundo ele, por pouca que seja...

      Beijinhos

      Olinda

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  2. Querida Olinda:
    Se eu não soubesse o nome do autor, adivinhava. Só Gedeão, consegue misturar simplicidade com génio.
    Não sei, qual o poema dele, que mais gosto. Deste gosto muito.
    Beijinho
    Maria

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    1. Minha amiga Maria

      É assim mesmo, em todos os poemas dele encontramos este génio, este falar de coisas que nos tocam, com as quais nos identificamos. E não há como escolher...

      Beijinhos

      Olinda

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  3. Sempre me fascinou a forma como o pedagogo Rómulo Vasco da Gama de Carvalho, pegando na química, foi fazendo com que casassem as acçãoes, com as reacções. Um processo alquímico, penso.
    Excelente escolha, minha estimada Olinda!

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    1. De uma química ou alquimia de espantar. Rómulo de Carvalho tinha este dom de nos deixar perplexos perante a sua maneira de pegar nas palavras e emprestar-lhes fogo e coerência. Disse acima à minha amiga Maria que não há forma de escolher de entre os seus poemas, mas a 'Calçada de Carriche' mexe comigo, pelos versos curtos, pela cadência, pelo escrutínio da verdade que o poema carrega.

      Meu amigo Bartolomeu, muito obrigada.

      Abraço.

      Olinda

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  4. Olinda, Querida

    A excelência das Palavras, que Gedeão nos legou, assenta na actualidade que nem uma luva.
    Uma bela escolha, tua.

    Beijos

    SOL
    http://acordarsonhando.blogspot.pt/

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    1. Meu caro Sol da Esteva

      Concordo, é uma verdadeira excelência. As Palavras parecem ganhar vida e esta apresenta-se crua e bela ao mesmo tempo,penso, mercê da alquimia de que fala Bartolomeu.

      Obrigada pela visita.

      Abraço

      Olinda

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  5. Belo poema, obrigado pela partilha!

    Vim agradecer o comentário feito e desejar um feliz final de semana :)

    Um abraço.

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