sexta-feira, 5 de julho de 2024

A Última Lua de Homem Grande

 Onde é que eu estou?,

pergunta à Lua.

O simples pronunciar já lhe dói impiedosamente. Está coberto de uma coagulação arrefecida e pastosa, sente uma pérola de suor a escorrer-lhe sob a gola direita, e seu fígado late como um vulcãozinho de estimação. A custo golfa um soluço de dor, tosse partindo todas as costelas, tendões e músculos, e resmunga com dificuldade:

_Deram-me um tiro

Pg 181





Ele, Amílcar, Homem Grande, como lhe chamavam, sabe que depois da sua morte persistiria a pergunta sem resposta cabal:

Quem matou Amílcar Cabral?

E Mãe Iva, no funeral, apenas o espírito. Não o corpo.
Pariu um filho para servir o mundo.

Líder do Partido denominado PAIGC, para a independência da Guiné e Cabo Verde não chegou a tomar o gosto a essa liberdade. Depois da sua morte a Guiné declarou unilateralmente a independência e Cabo Verde ascendeu a ela depois da Revolução de Abril de 1974, mais precisamente no dia 5 de Julho de 1975. Portanto, há 49 anos e lá festeja-se esta data.

Político, agrónomo, teórico marxista, chamado de "fazedor de utopias", mas também poeta.

Eis um dos seus poemas:


Quem é que não se lembra
Daquele grito que parecia trovão?!
– É que ontem
Soltei meu grito de revolta.
Meu grito de revolta ecoou pelos vales mais 
longínquos da Terra,
Atravessou os mares e os oceanos,
Transpôs os Himalaias de todo o Mundo,
Não respeitou fronteiras
E fez vibrar meu peito…

Meu grito de revolta fez vibrar os peitos de 
todos os Homens,
Confraternizou todos os Homens
E transformou a Vida…

… Ah! O meu grito de revolta que percorreu 
o Mundo,
Que não transpôs o Mundo,
O Mundo que sou eu!

Ah! O meu grito de revolta que feneceu 
lá longe,
Muito longe,
Na minha garganta!

Na garganta de todos os Homens





Cabo Verde - Mornas

Cerca de 19 minutos de música belíssima. 
Compositor: o grande B.Léza, Francisco Xavier da Cruz.

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"A última Lua de Homem Grande"
de Mário Lúcio Sousa.

Poema - “Emergência da poesia em Amílcar Cabral” (30 poemas)..
 [recolhidos e organizados por Oswaldo Osório]. Colecção Dragoeiro. 
Praia: Edição Grafedito, 1983. daqui


terça-feira, 2 de julho de 2024

Adélia Prado - Vencedora do Prémio Camões 2024

 


Adélia Prado, poetisa de nacionalidade brasileira é a vencedora do Prémio Camões, de 2024, o mais alto galardão da Língua Portuguesa.

Em sua homenagem transcrevo um dos seus poemas:

Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas, o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida, é maldição pra homem.

Mulher é desdobrável. Eu sou.


Adélia Prado



Adélia Luzia Prado de Freitas (Divinópolis13 de dezembro de 1935) é uma poetisaprofessorafilósofa, romancista e contista, ligada ao Modernismo. Considerada a maior poetisa viva do Brasil.

Sua obra retrata o cotidiano com perplexidade e encanto, norteados pela fé cristã e permeados pelo aspecto lúdico, uma das características de seu estilo único. Em 1976, enviou o manuscrito de Bagagem para Affonso Romano de Sant'Anna, que assinava uma coluna de crítica literária no Jornal do Brasil. Admirado, acabou por repassar os manuscritos a Carlos Drummond de Andrade, que incentivou a publicação do livro pela Editora Imago em artigo do mesmo periódico.

Ver mais aqui





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Poema - daqui


segunda-feira, 1 de julho de 2024

O Barco vai de saída





 FAUSTO


Fausto, nome artístico de Carlos Fausto Bordalo Gomes Dias[ (Oceano Atlântico, registado em Vila Franca das Naves26 de novembro de 1948 — 1 de julho de 2024) foi um compositor e cantor português.





Canta rouxinol canta


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