terça-feira, 8 de outubro de 2013

Agora as Palavras - Eugénio de Andrade

Obedecem-me agora muito menos
agora as palavras. A propósito
de nada resmungam, não fazem
caso do que lhes digo,
não respeitam a minha idade.
Provavelmente fartaram-se da rédea,
não me perdoam
a mão rigorosa, a indiferença
pelo fogo-de-artifício.
Eu gosto delas, nunca tive outra
paixão, e elas durante muitos anos
também gostaram de mim: dançavam
à minha roda quando as encontrava.
Com elas fazia o lume,
sustentava os meus dias, mas agora
estão ariscas, escapam-se por entre
as mãos, arreganham os dentes
se tento retê-las. Ou será que
já só procuro as mais encabritadas?

Eugénio de Andrade


***


Ah, paroles, paroles, paroles... caro Eugénio. Já nada é como dantes, quando as palavras queriam dizer aquilo que queríamos mesmo dizer, não é? Agora os que nos governam escondem-se atrás delas com mil intenções, algumas indizíveis, de tal modo que procuram construções esquisitas para nos baralharem. Sabe, meu caro, o que quer dizer condição de recursos? Pois. E pensava o meu amigo que tinha um problema... Pode crer que as suas Palavras são, e continuarão a ser, ouro do mais puro quilate.


Mas, ouçamos estes dois. Eles sabem bem o que dizem: coisas do coração, coisas que entendemos.





     

9 comentários:

  1. É verdade, e tanto pairam como nuvens, como pesam que nem chumbo!
    Eu ontem tomei uma decisão: falar menos...
    Beijinhos e boa terça!

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  2. Boa tarde Olinda!
    Bela postagem!
    Sinto saudade do tempo em que a palavra tinha um poder único!
    Uma linda semana para você!
    abraço amigo
    Maria Alice

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  3. Adorei este poema de Eugénio de Andrade. As palavras andam zangadas connosco, também, não é verdade, Olinda? São de um " rebuscado " imenso que não as entendemos; gostava mais delas quando eram simples...gosto da simplicidade principalmente nas pessoas; são mentirosas as palavras...enganosas; ando a ficar calada para não as pronunciar...surda para as não ouvir e cega para nem sequer olhar para elas; hoje não são dignas de confiança muitas das palavras; temos que as "escolher a dedo" e só depois as usar. Mas, Elvira, gostei imenso da Stacey Kent. Ouvi a entreviste e fiquei encantada com a doçura, a meiguice dela. Não a conhecia, mas fiquei presa ao seu modo de comunicar.. ...tão suave. Como ela gosta da nossa língua e como foi delicioso ouvir a palavra saudade na voz dela; ficou ainda mais nostalgica essa palavra que pertence unicamente à lingua portuguesa. Adoraria vê-la no coliseu. Vou ver se consigo!!! Disseste que voltarias à música e fizeste-lo de uma maneira fantástica, amiga. Obrigada pela partilha de tão belos momentos e vamos lá...tentemos " fazer as pazes" com as palavras, porque afinal também há as doces...as suaves e meigas, palavras que nos enchem o coração de encantamento; fiquemos-nos só por estas, certo? Beijinho e até sempre
    Emília

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  4. Olá! Grandioso poema! Agradeço muito a sua visita e já estou a seguindo, espero por você lá, no meu cantinho também! abração

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  5. Minha querida

    Eugénio de Andrade sabia como ninguém usar as palavras...quanto às palavras dos "outros", já é outra conversa ou palavras ao vento.

    Um beijinho com carinho
    Sonhadora

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  6. Pois, condição de recursos... Como se não estivesse tudo registado entre segurança social e finanças! Será para ver quantos pobres idosos, alguns até acamados, não conseguem ir entregar os papéis? Nããã, não deve ser...
    Beijinhos

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  7. Eugénio de Andrade, como sempre, irrepreensível!

    Um grande poeta brasileiro, Torquato Neto, um dos autores - das letras - do Tropicalismo, diz em um poema: "toda palavra tem uma cilada"... Ah, as palavras, criam vida próprias e saem por aí a dizer o que muitas vezes não devem.

    Beijo, Olinda.

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  8. Todos os artistas da(s) palavra(s) delas se servem como matéria-prima de excelência.A sua procura mais acertada advém do culto que delas se faz.Quando as encontramos nos alfobres em que as fazemos germinar, há uma interação recíproca de que resulta a obra.Se nos alfobres se mostram raleiras, perde-se o fio condutor e, mesmo que as não procuremos, elas surgem encabritadas.

    Juvenal Nunes

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    1. Muito obrigada pela sua presença aqui no Xaile de Seda e por este comentário que me convida à reflexão.

      Abraço

      Olinda

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