sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Cântico do nascimento


Aceso está o fogo
prontas as mãos
o dia parou a sua lenta marcha
de mergulhar na noite. 

As mãos criam na água
uma pele nova
panos brancos
uma panela a ferver
mais a faca de cortar 

Uma dor fina
a marcar os intervalos de tempo
vinte cabaças de leite
que o vento trabalha manteiga
a lua pousada na pedra de afiar 

Uma mulher oferece à noite
o silêncio aberto
de um grito
sem som nem gesto
apenas o silêncio aberto assim ao grito
solto ao intervalo das lágrimas 

As velhas desfiam uma lenta memória
que acende a noite de palavras
depois aquecem as mãos de semear fogueiras 

Uma mulher arde
no fogo de uma dor fria
igual a todas as dores
maior que todas as dores. 

Esta mulher arde
no meio da noite perdida
colhendo o rio
enquanto as crianças dormem
seus pequenos sonhos de leite. 
 
Ana Paula Tavares

Poetisa e historiadora angolana, Ana Paula Tavares, oriunda da cidade do Lubango, Huíla, nasceu em 1952.Licenciada em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, aí fez o mestrado em Literaturas Africanas de Língua Portuguesa. Entre 1983 e 1985, coordenou o Gabinete de Investigação do Centro Nacional de Documentação Histórica, em Luanda. Membro da União de Escritores Angolanos, fez parte do júri do Prémio Nacional de Literatura de Angola entre 1988 e 1990.






Mulemba


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Poema: daqui

13 comentários:

  1. Logo que comecei a ler o poema, senti África!
    Bonito e doloroso também!

    Abraço

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  2. Poema lindíssima que me fascinou ler.
    .
    Abraço
    Cuide-se
    .
    Pensamentos e Devaneios Poéticos
    .

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  3. Gostei muito da poesia e da mulembba, bem interessante... beijos, lindo fds! chica

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  4. O Poem é muito bonito!
    A musica adoro, há uns tempos que não ouvia o Bonga. :)
    -
    A voz que me afaga e endoidece
    .
    Beijo, e bom fim de semana.

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  5. Gosto muito da poesia da Ana Paula Tavares.
    Obrigado por ter atendido o meu pedido.
    Abraço, saúde e bom fim de semana

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    1. Obrigada, eu. :)
      Beijinhos

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    2. Depois de me ter alertado para a anomalia, verifiquei que quem carregasse no link iria ter à própria área de trabalho. Portanto, sem perigo mas, em todo o caso, incompreensível.
      Bj

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    3. Não sei como acontecem estas coisas, mas aconteceu o mesmo com o Rogério que pôs um link para um artigo e clicando no link aparecia sempre na minha área de trabalho do Sexta.
      Abraço, saúde e bom fim de semana

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  6. Primeira vez que ouço a cantiga, Olinda. Esse "Cântico do Nascimento" é belíssimo, mostrando a riqueza da escrita da autora. Gostei demais! Bjs.

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  7. Como é excelente a poesia de Ana Paula Tavares. Como foi bom lê-la aqui no seu Xaile de Seda.
    "Uma mulher oferece à noite
    o silêncio aberto
    de um grito
    sem som nem gesto
    apenas o silêncio aberto assim ao grito
    solto ao intervalo das lágrimas" Magnífico!
    Um bom fim de semana.
    Muita saúde.
    Um beijo.

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  8. Senhor Jesus eis que Estou aqui!!!!!Que uma gota do Seu Sangue Preciosissimo nos Lava e Nos Purifica de Todos os Males visíveis e invisíveis que Assolam o Mundo Inteiro!!!Amém!!🙏🙏🙏🙏🙏🙏🌹

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  9. Imagens poéticas, de Ana Paula Tavares, vestem a dor que grita na noite e a doçura de "sonhos de leite". A melodia de Bonga, insere-se - divinamente - no poema.
    Perdi-me, querida Olinda, por prazer.

    Beijo.

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  10. Uma mulher oferece à noite
    o silêncio aberto
    de um grito
    sem som nem gesto
    apenas o silêncio aberto assim ao grito
    solto ao intervalo das lágrimas.

    Olá, querida amiga Olinda!
    Que verdade emocionante!
    Fiquei comovida ao ler. O contexto é distinto, mas cada um sente como lê o coração.
    Fique bem, amiga!
    Beijinhos

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