quarta-feira, 17 de julho de 2019

Dobradura e Rabo de Baleia


Diz-se que:

Quem for um dia estudar a poesia brasileira dessa segunda década do século XXI invariavelmente se verá diante de um fato: a mais impactante poesia realizada nesse momento é feita por mulheres. As idades são diversas, assim como as origens e os estilos, mas o lugar de onde falam é o mesmo. Falam como mulheres, com suas peculiaridades e diferenças, sem emular sentimentalidades ou traços de escrita masculinas, trazendo um frescor necessário e revigorante para a cena literária e poética nacional.*

Vamos conferir? 




na esquina da rua
um piano que toca
notas esparsas
em lá menor
nunca vi
o rosto de quem
se esconde por trás
de acordes sustenidos

e que desfila dedos no teclado
com a leveza de quem
sustenta passarinhos
no ar
****
dentro do apartamento
a janela sustenta a paisagem.
me aproximo, apóio
os braços: todo o mundo
desmedido
em minha frente.

mas nada
que eu possa segurar, reter.
nem mesmo o perfume
dessas tardes sem perfume, nem
um bibelô
para colecionar na estante
como fazem as avós
que não medem cuidados
com a porcelana
In: Dobradura
****
um enorme rabo de baleia
cruzaria a sala nesse momento
sem barulho algum o bicho
afundaria nas tábuas corridas
e sumiria sem que percebêssemos
no sofá a falta de assunto
o que eu queria mas não te conto
é abraçar a baleia mergulhar com ela
sinto um tédio pavoroso desses dias
de água parada acumulando mosquito
apesar da agitação dos dias
da exaustão dos dias
o corpo que chega exausto em casa
com a mão esticada em busca
de um copo d’água
a urgência de seguir para uma terça 
ou quarta boia e a vontade 
é de abraçar um enorme 
rabo de baleia seguir com ela
in: Rabo de Baleia


Sob a influência de Ana Cristina César, a carioca Alice Sant’Anna lançou Dobradura, seu primeiro livro, em 2008 – considerado na época o livro do ano pelo Jornal do Brasil. De lá pra cá publicou Pingue –Pongue, (2012), em parceria com Armando Freitas Filho, e Rabo de Baleia (2013). Alice é dona de uma poética delicada e serena, com uma contundência intensa ainda que quase silenciosa. aqui

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Nota:
Trarei outras autoras do grupo de que se fala acima.
Poemas: *daqui
e daqui

17 comentários:

  1. Lindo, maravilhoso:))

    Hoje:- Afastam-se as nuvens do céu azul.

    Bjos
    Votos de uma óptima Quarta - Feira.

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    1. Obrigada, Larissa.
      Irei, em breve, ao seu blogue.
      O título é sugestivo.

      Beijinho

      Olinda

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  2. Gostei de conhecer esta poetiza.
    Abraço

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    1. Também não conhecia, cara Elvira.
      São novos ventos no campo da poesia contemporânea.
      Bj

      Olinda

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  3. Uma desconstrução contida, achei a poesia bela, embora não aprecie o género.
    Passando para cumprimentar.
    Beijos
    ~~~

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    1. Olá, Majo

      Grata pela sua presença.
      Género que vai marcando presença nas novas
      esperanças do reino da poesia.

      Bj

      Olinda

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  4. Gostei especialmente dos últimos versos da primeira poesia.
    Não sei se tenciona divulgar mais poesia deste nosso século, seria bom conhecer mais... Vamos nessa, cara Olinda?
    Esta poetisa é especialmente jovem e gostei do facto de não pontuar os textos; realmente, como ela diz no video, dá mais azo à plurissignificação.
    Beijo e boa quarta-feira.

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    1. Bom dia.

      Sim, Lua Azul, estou interessada em conhecer e tomar contacto com a forma de criar dos novos poetas. Uma visão do mundo que privilegia outros contornos e que nos surpreende. Mas é assim que se dá a renovação na maneira de pensar e de estar na vida, não é? Vou continuar a explorar isso e irei dando conta, aqui, do que descobrir.

      Muito obrigada pelo seu incentivo.:)

      Beijinhos

      Olinda

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  5. Linda, mesmo!
    Desconhecia e sou-te grata, querida Olinda, por aqui no-la revelares.
    Beijinho

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    1. Obrigada, querida Ana.
      É sempre um prazer ver-te aqui.

      Beijinhos

      Olinda

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  6. Querida Olinda, fui ver o espaço que mostra jovens poetisas brasileiras e fiquei encantada. Está na hora de deixarmos um pouco de lado os classicos, por demais conhecidos de todos e começarmos a valorizar estas mulheres jovens e de grande talento. Tens umas ideias fantásticas, querida amiga e, se me permites, vou acompanhar-te nesta pesquisa. É muito bom conhecer gente nova. Obrigada, querida Amiga e, já sabes... sempre que tiver um tempinho, cá estarei. Beijinhos e boa noite
    Emília

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    1. Querida Emília

      Muito contente pela tua presença, mesmo com a tua casa cheia de gente e Gente muito amada. :)

      O Verão é assim, um tempo maravilhoso que convida a que nos visitemos e convivamos mais uns com os outros. Olha, na segunda-feira chega uma das minhas irmãos e, claro, depois virão os filhos e os netos. :)

      É verdade, minha amiga, gente nova e muito dinâmica na área da poesia. Com um olhar diferente, feminino, a criar o seu próprio espaço. Depois, também irei à procura daquilo que está a acontecer na área masculina. Ou então, nem masculino nem feminino - no todo que é a Poesia.

      Beijinhos

      Olinda

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  7. Olinda, que interessante, não sabia! Na verdade, não ligo muito a poesia :)
    Está tudo bem, obrigada, mas coloquei os blogues de parte (tanto a Gata, como a Panificadora) por falta de tempo e de ânimo.
    Beijinhos e espero que esteja tudo bem!

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    1. Gata

      Que pena, Gata! Mas tinha outro blogue? "Panificadora" só conheço a "Panificadora Ribeiro", cuja dona, a M., também desertou e está no Instagram, como nos comunicou.

      Tudo de bom, para si, amiga.

      Beijinhos

      Olinda

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  8. rabo de baleia na sala? bem necessário por vezes...
    bem mais estimulante que elefante empalhado ...

    gostei muito

    abraço

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    1. Olá, Manuel Veiga

      Tudo depende do universo mental de quem escreve, daquilo que poderá ser a criação de novos mitos e símbolos e, claro está, da abertura de quem lê e interpreta. Viajar no rabo de uma baleia será tão "legítimo", em termos poéticos e imaginativos, como cavalgar as nuvens no dorso do mitológico Pégaso.

      Quanto ao "elefante" prefiro sabê-lo no seu habitat natural (se é que isso ainda existe), bem longe dos artifícios de que nós, seres humanos, somos mestres.

      Sempre estimulantes os seus comentários, meu amigo. :)

      Abraço

      Olinda

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  9. Cavalgar um rabo de baleia sugere viagens marítimas, tipo caravela à descoberta. Tudo menos "... um tédio pavoroso desses dias
    de água parada acumulando mosquito ..."

    Beijinho, querida Olinda.

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