A mãe negra embala o filho
Canta a remota canção
Que seus avós já cantavam
Em noites sem madrugada.
Canta, canta para o céu
Tão estrelado e festivo.
É para o céu que ela canta,
Que o céu
Às vezes também é negro.
No céu
Tão estrelado e festivo
Não há branco, não há preto,
Não há vermelho e amarelo.
-Todos são anjos e santos
Guardados com mãos divinas.
A mãe negra não tem casa
Nem carinhos de ninguém...
A mãe negra é triste, triste,
E tem um filho nos braços...
Mas olha o céu estrelado
E de repente sorri.
Parece-lhe que cada estrela
É uma mão acenando
Com simpatia e saudade...
Aguinaldo Fonseca
(1922-2014)
(Linha do Horizonte, 1951)
in; No Reino do Caliban, pg 163
***
E a nossa querida Elvira recorda-nos aqui Prelúdio/MÃE-NEGRA, de Alda Lara, na maravilhosa voz de Paulo de Carvalho:
Pela estrada desce a noite
Mãe-Negra, desce com ela...
Nem buganvílias vermelhas,
nem vestidinhos de folhos,
nem brincadeiras de guisos,
nas suas mãos apertadas.
Só duas lágrimas grossas,
em duas faces cansadas.
Mãe-Negra tem voz de vento,
voz de silêncio batendo
nas folhas do cajueiro...
Tem voz de noite, descendo,
de mansinho, pela estrada...
Que é feito desses meninos
que gostava de embalar?...
Que é feito desses meninos
que ela ajudou a criar?...
Quem ouve agora as histórias
que costumava contar?...
Mãe-Negra não sabe nada...
Mas ai de quem sabe tudo,
como eu sei tudo
Mãe-Negra!...
Os teus meninos cresceram,
e esqueceram as histórias
que costumavas contar...
Muitos partiram p'ra longe,
quem sabe se hão-de voltar!...
Só tu ficaste esperando,
mãos cruzadas no regaço,
bem quieta bem calada.
É a tua a voz deste vento,
desta saudade descendo,
de mansinho pela estrada..
Lisboa, 1951 (Poemas, 1966)
Poema: retirado do comentário e de O Castendo
****Imagem: Pintura de Keith Mallet, norte-americano.
Estilo pictórico africano, moderno
Linda pintura e versos que gostaria estivessem muito distantes da realidade. É para o céu que olham aqueles que estão tristes. Bjs.
ResponderEliminarÉ um belíssimo poema. Mas falar em Mãe Negra sempre me lembra uma das melhores poetisas que tivemos e que tão esquecida ficou. Alda Lara. Abençoado seja o Paulo de Carvalho que imortalizou o Prelúdio, um poema que fala exatamente da Mãe Negra.
ResponderEliminarPrelúdio
Pela estrada desce a noite
Mãe-Negra, desce com ela...
Nem buganvílias vermelhas,
nem vestidinhos de folhos,
nem brincadeiras de guisos,
nas suas mãos apertadas.
Só duas lágrimas grossas,
em duas faces cansadas.
Mãe-Negra tem voz de vento,
voz de silêncio batendo
nas folhas do cajueiro...
Tem voz de noite, descendo,
de mansinho, pela estrada...
Que é feito desses meninos
que gostava de embalar?...
Que é feito desses meninos
que ela ajudou a criar?...
Quem ouve agora as histórias
que costumava contar?...
Mãe-Negra não sabe nada...
Mas ai de quem sabe tudo,
como eu sei tudo
Mãe-Negra!...
Os teus meninos cresceram,
e esqueceram as histórias
que costumavas contar...
Muitos partiram p'ra longe,
quem sabe se hão-de voltar!...
Só tu ficaste esperando,
mãos cruzadas no regaço,
bem quieta bem calada.
É a tua a voz deste vento,
desta saudade descendo,
de mansinho pela estrada..
Alda Lara
um abraço e tudo de bom parea si
É de uma humanidade imensa, a poesia do Aguinaldo sempre nos leva à busca e ao encontro de nós mesmos. O reconhecimento das nossas origens, lindíssima, emocionante!
ResponderEliminarObrigada por tão belo gesto, nos trazer a poesia caboverdiana!
Beijinho, amiga e tenhas um ótimo dia!
;))
Um lindo poema! Adorei a imagem :)
ResponderEliminarMinha querida Olinda
ResponderEliminarA minha modesta incursão no campo da poesia deu origem a um post que publiquei hoje, dia 30.
Devo continuar? É melhor desistir? Qual é a tua opinião?
Aguardo-te na minha «CASA», para te pronunciares…
Obrigada.
Beijinhos
Retrato de riqueza de espírito da Mãe Negra.
ResponderEliminarBeijos querida!
Imagem e texto
ResponderEliminardois belos poemas
Muito linda este poema ,Mãe-negra...
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