os aviões levantam,
quase invisíveis sob o êmbolo da chuva,
as coisas ditas, como peças
desenhadas sobre páginas de manual.
nítidas e incompreensíveis.
a luz do ocidente
dispara primeiro, através da opacidade
do que nos é permitido,
as perguntas vêm mais tarde, a sua cadência
rasgando o telão do senso comum
o peso nosso comum,
o estado em que nos empenhamos
contra a ideia de que nunca existiu
uma verdade estável, una
e se perderam os autores do guião
tendo-lhes surgido um campo aberto,
as possibilidades confundidas em
inesperadas extensões de vida pública
a perder de vista.
para nós, a definitiva lapidação da tarde
tinge de vermelho
o convexo dos óculos de sol,
as paredes da equação evadem-se
no cravo do fast forward.
Rui Cascais
in: a carne do rosto
Oi Olinda.
ResponderEliminarAmiga, há algum tempo atrás por estas bandas de cá... Os óculos escuros eram um charme, evocando para quem os usasse um certo ar de mistério...
Hoje... quem os usa por aqui, quer proteger a visão dos raios, e quem está bem informado, dirá que servem para diminuir a quantidade de radiação que penetra nos tecidos oculares... Outros os usam numa ocasião de luto... Mas há quem os use para demonstrar um poder oculto nos corredores do Palácio, nas tribunas, atrás de um fuzil AR-15, ou nos palanques pedindo votos...
Não querem mostrar sua alma, mas querem que todos a vejam...
Um beijo
EliminarCaro Antônio
Uma excelente análise: óculos escuros que muitas vezes deixam de ser usados naquilo para que foram criados, servindo então para esconder a própria alma, com objectivos inconfessados. Infelizmente deparamos continuamente com quadros destes neste nosso mundo. Nesta fogueira de vaidades esquecem-se, com extrema facilidade, as metas primordiais consubstanciadas na pessoa humana, dando-se relevância ao supérfluo. E 'as paredes da equação evadem-se' realmente...
Abraço
Olinda
Confesso que não conhecia este poema. Talvez que por razões profissionais fiquei preso na expressão 'os aviões levantam, quase invisíveis sob o êmbolo da chuva'. Gostei! Por outro lado, não me escapou o facto de, também os Poetas (como os fotógrafos), sempre privilegiam o entardecer em desfavor da matina. Dizia um amigo meu 'pois, ambos são belos, é certo, mas para fotografar o alvorecer preciso de me levantar muito cedo....
ResponderEliminarGrato pelas suas (exageradas) palavras.
abraço.
EliminarOlá, Jorge Esteves
Agora que o refere, vejo que, na verdade, os poetas e os fotógrafos têm muitos pontos em comum: a arte de fazer chegar até nós a sua visão do mundo e das coisas, procurando o melhor ângulo, a luminosidade ideal, muitas vezes por amor à perfeição mas que acaba por também nos influenciar, seja à matina ou ao entardecer...captando os alvores da madrugada ou os tons fulvos do pôr-do-sol. A escolha do momento de luz mais propício e, melhor ainda, quando se junta o útil ao agradável, como o seu amigo, também é uma arte... :)
Abraço
Olinda
OI OLINDA!
ResponderEliminarUM TEXTO ONDE O AUTOR FALA EM METÁFORAS PARA MIM COM UMA CONOTAÇÃO POLÍTICA, NA VERDADE OS ÓCULOS DE SOL, SÃO APENAS ESCUDOS OS QUAIS USA PARA DIZER O QUE LHE IA NA ALMA NO MOMENTO...
ABRÇS
zilanicelia.blogspot.com.br/
EliminarQuerida Zilani
Também a mim me parece que o autor deixa entrever palavras que nos remetem, como bem disse, para áreas de conotação política. Há no ar uma crítica, uma certa decepção sobre coisas que deviam fazer parte do nosso 'senso comum' mas que se esvaem em 'inesperadas extensões da vida pública a perder de vista'.
É interessante verificar que não se sabe nada (ou quase) sobre o autor, o que nos dá uma certa liberdade de pensamento. Postei um poema dele em tempos, 'Costura', e foi uma coisa linda de se ver, a oportunidade que tivemos, como agora, de fazer este exercício.
Obrigada, amiga.
Beijos
Olinda
Obrigada por me ter dado a conhecer um poeta que nem sabia que existia.
ResponderEliminarBom fim de semana, querida Olinda
EliminarOlá, São
Tem razão, este poeta não é muito conhecido, pelo menos que eu saiba. Tomei conhecimento da sua obra através de um livro de poemas, 'A carne do Rosto', que me foi oferecido. Mesmo em termos biográficos não encontrei muitos elementos na Net.
Bjo
Olinda
Não conhecia o poeta, gostei!
ResponderEliminarBom fim de semana
Beijinhos
Maria
EliminarOlá, Maria
Sim, não é muito conhecido.
Dos seus poemas emana uma grande força. Vamos atrás das questões que ele coloca e acabamos sempre por encontrar algo que nos diz respeito.
Bjos
Olinda
Sem óculos admito ter feito outra leitura
ResponderEliminarassim...
prefiro o sol
a céu aberto
EliminarOlá, Mar Arável
Realmente com óculos escuros as coisas ficam mais difusas, o céu já não parece tão azul e o mar também não...pois, como diz F. Pessoa, foi nele que Deus espelhou o céu; e então o mais seguro, talvez, será deixarmo-nos banhar pelos raios solares, em toda a sua pujança, desprezando um pouco a incidência dos temíveis UV (mas também tão necessários à vida na Terra).
Abraço
Olinda
Eu costumo dizer que os óculos escuros não servem só para protecção do sol; os olhos são o espelho da alma...são o que na realidade mais sinceramente falam; a boca fala aquilo que a pessoa quer, mas os olhos dizem logo que o que estamos a ouvir não é o que a pessoa está a sentir. Não conhecia o poema, mas gostei muito. Obrigada pela partilha, Olinda. Desejo-te um bom Domingo e uma excelente semana. Sabes, não gosto de conversar com pessoas que nunca tiram os óculos escuros, mesmo quando estamos numa mesa de café. Para quê os óculos se o sol está lá fora? Mesmo lá fora nem sempre incomoda, mas os óculos continuam lá.... Beijinhos
ResponderEliminarEmília
EliminarOra, aqui está, querida Emília, uma excelente abordagem: os espelhos são realmente 'o espelho da alma', diz o povo e com razão. A intenção com que as palavras são ditas, os sentimentos, tendem a fugir por estas duas janelas, traindo os seus emissores. Nada como falar de olhos nos olhos, de coração aberto e alma lavada, mormente quando os óculos de sol deixam de ter utilidade. A conversa flui e o riso marca o seu espaço de eleição: o convívio.
Uma boa semana feliz para ti e para os teus.
Beijinhos
Olinda
Um poema fulminante, eu diria! E o que falar diante dele? Porque a mim causou profundas e dilacerantes reflexões, detive-me em alguns pontos, mas um em especial, quero relevar: "dispara primeiro, através da opacidade
ResponderEliminardo que nos é permitido,
as perguntas vêm mais tarde", o retrato da nossa sociedade, o mundo global e suas vivências.
Outro grande poema de um excepcional poeta que tu nos trazes, Olinda, obrigada!
Deixo-te um beijo e desejos de um ótimo domingo, querida!
EliminarQuerida amiga
Esta passagem é um dos momentos mais altos do poema, pelas situações que nos deixa adivinhar, pela cegueira denunciada e pelo pouco que nos é permitido sem que para isso tenhamos voto na matéria. Um retrato contundente dos dias que estamos a atravessar e da falta de sensibilidade nas relações humanas, na sociedade global.
Minha querida, muito obrigada por este comentário. Desejo-te uma excelente semana.
Beijinhos.
Olinda
muito bom!
ResponderEliminar
EliminarOlá, Marta
Muito obrigada e um bom início de semana.
Bjo
Olinda
Belo poema, cheio de força e palavras perenes.
ResponderEliminarBeijo grande e boa semana.
EliminarQuerida Ana
Sim, palavras que permanecem em nós criando raízes na interpretação do que nos rodeia.
Bjos
Olinda
Uma escelente escolha, pelo tema, pelas "imagens " nele contigas e que nos fazem parar para pensar!
ResponderEliminarObrigada. Bj
EliminarQuerida BlueShell
Falas nas imagens que o autor nos transmite através das suas palavras.Concordo contigo. A sua expressividade é tão intensa que conseguimos visualizá-las, perfeitamente.
Bjo
Olinda
Olá querida Olinda.
ResponderEliminarGostei do poema e da escolha.
Do sentimento que passa e e de sua profundidade.
Beijo
EliminarQuerida Fernanda
É mesmo, é disso que se trata:sentimento e profundidade. Eu não saberia dizê-lo melhor.
Beijos
Olinda