domingo, 15 de março de 2015

Mar ê morada di sodade

Não propriamente desaparecida em combate mas com os sentimentos e emoções repartidos entre dois continentes, aqui me têm a escrever-vos esta carta como no tempo em que o mar era o veículo privilegiado para as idas e vindas e que tanto servia para separar como para unir. 

Por mais que a comunicação seja (e é) hoje facilitada, a evocação do mar surge-nos de imediato quando a imagem de terra longe nos bate à porta. O mar que beija as águas do Tejo e que no passado tanto trazia especiarias e escravos como levava marinheiros andarilhos para os quatro cantos do mundo. 

Pois, não vos trago a Cesária Évora como o título desta publicação poderia sugerir, mas Alexandre O'Neill na sua Gaivota, para uma releitura. 
E porquê?



Foto - UJM*

GAIVOTA

Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se um português marinheiro,
dos sete mares andarilho,
fosse quem sabe o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu,
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.

Que perfeito coração
no meu peito morreria,
meu amor na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.
Poema de:

Porque alguém de nome Raquel veio ao XailedeSeda, há dias, colocar-me as seguintes questões ( ver AQUI):

Será que me podia dizer qual o tema do poema? O amor por Lisboa ou o seu primeiro amor?

Achei estas questões interessantíssimas. Elas fizeram-me olhar com novos olhos para este belíssimo poema, tão diferente de outros que ele escreveu.

Eis o que eu disse, para já, à Raquel:

Interessantes as suas questões, Raquel. Trouxeram-me a preciosa oportunidade de reler este lindo poema de O'neill. Quanto ao tema que poderei dizer-lhe? Como saberá, A.O'neill é um poeta de intervenção e, por via disso, sofreu algumas represálias. Na sua obra, lança um olhar surrealista ao real, usando o humor como arma, e disso procurou fazer escola. 
Neste poema, porém, ele aparece-nos com uma poesia emocional. O autor fala de Lisboa mas também de certas características relacionadas com o modo de ser português. Fala do amor primeiro e também de uma certa desesperança, quando ele nos induz a ideia da morte, no final.
Fiz hoje um post convidando os meus leitores a darem-me a sua opinião. Portanto, voltarei.


Então, meus amigos, qual é a vossa opinião?


Desejo a todos um excelente domingo.

:)

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*Quem melhor do que UJM para fotografar e falar de Lisboa? 
E eu ali a fotografar, tão feliz por poder desfrutar toda esta beleza. Lisboa quase difusa, envolta em neblina, os veleiros difusos na paisagem, e a gaivota voando e gritando sobre as águas (...) clicar

Na minha pesquisa de imagens vi esta foto e soube logo de quem era. UJM, espero que não se importe... 

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NOTA: FIZ, NESTA DATA, UMA ADENDA AO POST "TRAPOS V".


13 comentários:

  1. (^‿^)✿

    Coucou et merci pour ce beau partage chère Olinda !

    GROS BISOUS à toi et bonne continuation

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  2. Olá Olinda, sempre tão querida, com o afecto a transparecer em tudo o que escreve.

    Muito obrigada pelo uso da fotografia e pela referência e por tudo.

    Um beijinho!

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  3. Olá Olinda
    O poema comove-nos com seu amor pela Pátria, sentimento raro nos dias de hoje
    Gosto do cunho emotivo impresso em cada verso do soberbo de O'Neill
    Um domingo feliz e abençoado
    Beijos

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  4. ~ .
    ~~ ~ ~ Parece-me, simplesmente, um poema de saudade. ~ ~ ~~

    ~ O eu poético recorda Lisboa, olhando o céu, num litoral distante.
    ~ O seu olhar "esmorece e cai no mar"...
    ~ Sente a falta da presença animadora e jovial de alguém de Portugal.

    ~ Pela intensidade com que alia a saudade de Lisboa e a do seu amor
    - o primeiro e único - podemos inferir que a amada residiria na capital
    do seu país que teve de deixar para residir no estrangeiro,

    ~ Sabemos que deveria tratar-se de um mancebo que provavelmente
    estaria exilado, por motivos políticos ou de objecção de consciencia
    militar, factos estes muito vulgares na época.

    ~ ~ Grande abraço amigo, Olinda. ~ ~

    ~ ~ ~ Dias aprazíveis e felizes. ~ ~ ~
    ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

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  5. É um poema de saudade sim; um poema tão belo ele mesmo como a própria palavra "saudade".

    Muito boa a fotografia. Ilustra bem a essência do poema.

    Bjs

    Isabel Gomes

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  6. Numa espécie de exílio, o poeta sente a frustração de um voo inacabado num céu, que também ele, não o completa por não se integrar no seu coração, no seu pensamento, logo não o faz feliz.
    Uma “Lisboa”, um país, agora e ainda " imperfeitos" onde não há sonhos.
    Abraço!

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  7. Amiga a uma bom tempo conheço seu blog e sou uma das primeiras seguidoras
    me encantei na época com o nome do seu blog.
    Xaile de Seda...O tempo foi passando a gente parece que esquece,
    mais nunca vou esquecer você.
    O poema de hoje me emocionou muito parece um hino a Portugal.
    Terra Linda embora nunca tive o privilégio de conhecer.
    Uma feliz e abençoada semana abraços.Evanir.

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  8. Gosto de Lisboa e do Tejo que por ali passa, Gosto do poema que lhe dá mais encanto. Até as gaivotas parecem ter saudades e voltam de asas abertas com um coração de mar.

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  9. Olá amiga, espero que seus espaço tenha alcançado o topo dos melhores blogs lido ao além mar.
    Peço desculpas por não ter interagido nestes períodos que ficamos sem máquina e em tratamento médico.
    O pouco que conheço de sua terra nos remete a vislumbrar uma ótima visão do que descreve sempre por aqui, passamos a nos interessar e colher nuances dessa que é a terra mãe dos brasileiros.
    Agradeço por estar sempre presente em nosso convívio interativo.
    Abraço

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  10. Gostei da força, saudade e nostalgia deste post

    :)

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  11. .

    Foi boa a escolha. O texto
    é lindo.

    Beijos,





    .

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  12. Carlos do Carmo elevou, engrandeceu, recriou o sentimento e este magnífico Poema.
    Tudo por Lisboa.
    "[... Se ao dizer adeus à vida
    as aves todas do céu,
    me dessem na despedida
    o teu olhar derradeiro,
    esse olhar que era só teu,
    amor que foste o primeiro....]"



    Beijos


    SOL

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