Eu, Miguel Torga, é o título do livro escrito por José María Moreiro e prefaciado por Jorge Amado que, a dada altura, considera o livro uma longa entrevista, uma biografia, um estudo crítico, uma análise histórica, um tratado de poesia e tantas outras coisas. Um Torga que ora se mostra tímido e reservado como também se comove, de quando em vez, falando de si e do seu trabalho como escritor sem falsa modéstia. Jorge Amado põe a tónica na pergunta que Moreiro lhe faz, à laia de despedida:- A la altura de la suya, usted tiene que saber qué es lo mas importante en la vida, Torga.-Lo mas importante en la vida, Moreiro, es vivirla.
De facto, Miguel Torga (Adolfo Correia da Rocha), viveu a vida intensamente. A sua obra traduz uma grande rebeldia contra as injustiças e o seu inconformismo perante os abusos de poder, do mesmo passo que perpassa por toda ela o amor às suas origens. Também não esquece o tempo que passou no Brasil, numa idade em que tudo nos marca de forma indelével (dos 13 aos 18 anos). É assim que ele se refere à sua segunda pátria, em 1957, no seu livro Diário:
Pátria de emigração,
E, no livro em apreço, Eu, Miguel Torga, na página 58, podemos ler em relação a Jorge Amado, o mais universal dos autores brasileiros de hoje:
De facto, Miguel Torga (Adolfo Correia da Rocha), viveu a vida intensamente. A sua obra traduz uma grande rebeldia contra as injustiças e o seu inconformismo perante os abusos de poder, do mesmo passo que perpassa por toda ela o amor às suas origens. Também não esquece o tempo que passou no Brasil, numa idade em que tudo nos marca de forma indelével (dos 13 aos 18 anos). É assim que ele se refere à sua segunda pátria, em 1957, no seu livro Diário:
Pátria de emigração,
É num poema que te posso ter...
A terra - possessiva inspiração;
E os rios -como versos a correr (...)
Guardei-te como pude
Onde podia;
Na doce quietude
Da força represada da poesia.
E, no livro em apreço, Eu, Miguel Torga, na página 58, podemos ler em relação a Jorge Amado, o mais universal dos autores brasileiros de hoje:
Almoço com Jorge Amado. Perdiz brava de Montesinho, posta mirandesa e tinto maduro do Doiro. Ementa a preceito, em homenagem à humanidade do escritor que na minha admiração parece ter aliado harmoniosamente, na vida e na obra, o calor da urbanidade baiana à grandeza da alma transmontana. A dizê-lo assim simplesmente, arrisco-me a ser mal interpretado, mas foi o que senti justificadamente durante aquelas três horas, íntimas, simples, fraternas, sem literatura, só gustativas, de preito e comunhão.
Ele é um homem de preitos, mas apenas em relação àqueles que mais admira. Vemos isso no seu pseudónimo em que, segundo consta, adopta o nome de Miguel em homenagem a Cervantes e Unanumo. E Torga? Uma plantinha, uma raiz de urze, talvez pela sua ligação à terra. Terra muito amada e cantada em versos, terra-mulher, terra-inspiração.
A terra
Também eu quero abrir-te e semear
Um grão de poesia no teu seio!
Anda tudo a lavrar,
Tudo a enterrar centeio,
E são horas de eu pôr a germinar
A semente dos versos que granjeio.
Também eu quero abrir-te e semear
Um grão de poesia no teu seio!
Anda tudo a lavrar,
Tudo a enterrar centeio,
E são horas de eu pôr a germinar
A semente dos versos que granjeio.
….
Terra, minha aliada
Na criação!
Seja fecunda a vessada,
Seja à tona do chão,
Nada fecundas, nada,
Que eu não fermente também de inspiração!
Na criação!
Seja fecunda a vessada,
Seja à tona do chão,
Nada fecundas, nada,
Que eu não fermente também de inspiração!
…
Terra, minha mulher!
Um amor é o aceno,
Outro a quentura que se quer
Dentro dum corpo nu, moreno!
Um amor é o aceno,
Outro a quentura que se quer
Dentro dum corpo nu, moreno!
…
Terra, minha canção!
Ode de pólo a pólo erguida
Pela beleza que não sabe a pão
Mas ao gosto da vida!
Ode de pólo a pólo erguida
Pela beleza que não sabe a pão
Mas ao gosto da vida!
Muito há para dizer sobre Miguel Torga que, pela sua dimensão como autor e como ser humano, este pequeno post não consegue abarcar. Inicialmente era minha intenção abordar apenas o livro Eu, Miguel Torga, obra que encontrei nas minhas deambulações à procura de livros que não estão na berra, mas que comportam experiências de leituras muito interessantes.
Mas as palavras são como as cerejas e eu não resisto em deixar aqui o prefácio que o próprio escreveu em relação à sua 'Criação do Mundo', onde ele se identifica como um Homem de palavras e, como sabemos, com elas construiu um mundo à sua e à nossa medida:
Todos nós criamos o mundo à nossa medida. (...) O meu tinha de ser como é, uma torrente de emoções, volições, paixões e intelecções a correr desde a infância à velhice no chão duro de uma realidade proteica, convulsionada por guerras, catástrofes, tiranias e abominações, e também rica de mil potencialidades, que ficará na História como paradigma do mais infausto e nefasto que a humanidade conheceu, a par do mais promissor. Mundo de contrastes, lírico e atormentado, de ascensões e quedas, onde a esperança, apesar de sucessivamente desiludida, deu sempre um ar da sua graça, e que não trocaria por nenhum outro, se tivesse de escolher. Plasmado finalmente em prosa — crónica, romance, memorial, testamento —, tu dirás, depois da última página voltada, se valeu a pena ser visitado. Por mim, fiz o que pude. Homem de palavras, testemunhei com elas a imagem demorada de uma tenaz, paciente e dolorosa construção reflexiva frita com o material candente da própria vida. Coimbra, Julho de 1984-Miguel Torga
Este video é o registo primeiro de um ciclo de conversas promovido pela Casa-Museu Miguel Torga, onde vemos a filha do escritor, Clara Rocha.
Torga com a filha
Meus amigos, desejo-vos um excelente fim de semana.
Abraço
Olinda
****
Conheço bem a obra de Torga desde jovem.
ResponderEliminarDesconhecia a existência da Casa-Museu e nunca vira a filha.
Grato abraço por , mais uma vez, aumentar o meu saber, querida Olinda!
Um texto muito interessante sobre um grande poeta, Miguel Torga. Quanto a Jorge amado eu gosto imenso dele e creio que li quase toda a obra dele.
ResponderEliminarSabe o meu grande sonho de toda a vida era ter estudado coisa que nunca pude fazer. Agora estou a fazê-lo. Em Literatura, começámos com Torga, e estamos agora com Pessoa.
Um abraço e bom fim de semana
Sua sempre agradável visita, Olinda Querida, deixa- me profundamente feliz. Hoje, o seu comentário encheu-me de emoção, em tudo que lá ficou registrado, em palavras. Venho correndo lhe agradecer e me deparo com uma rica postagem acerca de Miguel Torga, a quem passei a admirar ainda nos bacos da escola: afinal, ele tem muito de Brasil. Você comprova essas minhas palavras, nessa fascinante postagem. Obrigada: pelo que lá está,na Cadeirinha de Arruar e aqui, neste "gostoso" Xaile de Seda.
ResponderEliminarBeijos, querida amiga,
da Lúcia
Um texto feito com muita sensibilidade mostrando e dando a conhecer um poeta e escritor português de todos os tempos.
ResponderEliminarAdmiro todas as suas obras mas ainda mais os seus pensamentos.
O mais importante na vida é saber vivê-la.
Agradeço as suas visitas bem como os comentários sempre amáveis e oportunos.
Que Belo Post....Bom demais .....
ResponderEliminarO vídeo foi essencial, pois desconhecia o Museu e a Filha.
Obrigado e B.F.S.
Beijo
Querida Olinda
ResponderEliminarvoltei para dizer-lhe que o poeta que você citou em seu comentário na Cadeirinha, Hérlon Fernandes Rodrigues, deixou um comentário pra você, bem comovido. Veja lá!
Bom final de semana.
Beijos, da Lúcia
Belo post, Olinda que me diz muito e que me deixou com saudades. Também, como Torga vivi no Brasil numa época muito importante da minha vida; foi lá que a comecei, logo depois de casada; lá fiz a minha vida....lá tive os meus dois filhos, lá fui muito feliz com os grande amigos que conquistei e que mantenho até hoje. Muito me deu o Brasil o qual considero a minha 2ª Pátria. Adoro Jorge Amado e já li muito da sua obra. Não sabia desta grande amizade entre os dois. Torga...uma plantinha , uma raiz de urze...que lindo! Não sei se sabe, mas na Régua, no monte S. Leonardo em Galafura, existe uma capelinha e na sua parede há um poema de Miguel Torga que, se não se importa vou deixar aqui:
ResponderEliminarÀ proa dum navio de penedos,
A navegar num doce mar de mosto,
Capitão no seu posto
De comando,
S. Leonardo vai sulcando
As ondas
Da eternidade,
Sem pressa de chegar ao seu destino.
Ancorado e feliz no cais humano,
É num antecipado desengano
Que ruma em direcção ao cais divino.
Lá não terá socalcos
Nem vinhedos
Na menina dos olhos deslumbrados;
Doiros desaguados
Serão charcos de luz
Envelhecida;
Rasos, todos os montes
Deixarão prolongar os horizontes
Até onde se extinga a cor da vida.
Por isso, é devagar que se aproxima
Da bem-aventurança.
É lentamente que o rabelo avança
Debaixo dos seus pés de marinheiro.
E cada hora a mais que gasta no caminho
É um sorvo a mais de cheiro
A terra e a rosmaninho!
E mais uma vez aqui se mostra a sua ligação à terra, desta vez ao nosso Douro. Muito obrigada, Olinda por este post que parece ter sido dedicado a mim ( o meu filho vive no Douro, na Régua ) e um bom fim de semana. Beijinhos e até sempre
Emília
Um post absolutamente fantástico, meus parabéns e obrigado pela partilha.
ResponderEliminarBom fim de semana
Beijinhos
Maria
O pseudónimo Miguel Torga diz, de facto, muito dele, revela uma grande qualidade: humildade.
ResponderEliminarBeijinhos, bom domingo!
Como admiro imenso o MIguel Torga, fiquei curioso por este livro.
ResponderEliminarVou tentar comprá-lo...
Olinda, tem um bom domingo e uma boa semana.
Beijo, querida amiga.
Adoro reviver Miguel TORGA...
ResponderEliminarvim matar aquela palavra dificil...Saudade.
com um beijinho
A vida
A vida é feita
De tristeza e de alegria
De angústia e de certeza
Mas corremos para a preservar
A vida é muitas vezes algo que inquieta
Que nos deixa sem vontade de continuar
Que nos aperta o coração
E nos deixa sem vontade de continuar
Mas é vida e todos a querem
Corremos sempre com ansiedade
Com vontade de a fazer vingar
Pois sabemos que vida feliz
É mesmo o nosso objectivo principal
Nesta vida, tantas e tantas vezes cinzenta.
LILI LARANJO
"Não tenhas medo, ouve:
ResponderEliminarÉ um poema
Um misto de oração e de feitiço...
Sem qualquer compromisso,
Ouve-o atentamente,
De coração lavado.
Poderás decorá-lo
E rezá-lo
Ao deitar,
Ao levantar,
Ou nas restantes horas de tristeza
Na segura certeza
De que mal não te faz.
E pode acontecer que te dê paz..."
Miguel Torga o disse e eu tenho-o no meu cantinho como se fora "recadinho", a quem me visita...A Vida é sem dúvida o que dela fizermos...e ao fazermos, vivemos!...Torga era simples florinha, com um toque especial que na terra semeou pensamento e poesia, que "empresta" a nós, sabedoria! Obrigada pela boa partilha!
Beijinho amiga (o)Linda e tem boa semaninha! Boa castanhinha!!!
Minha querida
ResponderEliminarVou ver se consigo encontrar o livro que deve ser muito bom. Eu adoro Miguel Torga, os seus poemas retratam tantas realidades que cada vez estão mais actuais.
Um beijinho com carinho
Sonhadora
Oi Olinda!
ResponderEliminarPost muito interessante e obrigado em compartilhar.
Um abraço
Aprendizado aqui...
ResponderEliminarBeijo Lisette.
Olá Olinda!
ResponderEliminarRetornando à blogsfera! Belas e importantes referências e citações!
Beijos!!
Maravilhosa post sobre Miguel Torga. Ele merece.
ResponderEliminarDesejo que esteja bem e que tenha um bom
fim de semana.
Bj.
Irene Alves
Interessante, eu pensei que tivesse comentado esse post, fiquei tão emocionada com ele, que acho que esqueci de publicar, Olinda, rs.
ResponderEliminarO Torga dispensa apresentações, quem gosta de literatura, sabe de sua existência, assim como de outros nomes das letras, a relação dele com o Brasil. Tive a oportunidade e o prazer de ver essa casa, em Coimbra, e que alegre fiquei.
Sabe, Olinda, seu Xaile é um extraordinário encontro de culturas, além de um lugar onde se pode aprender e conhecer o que de mais importante e indelével a literatura produziu, sempre darei vivas e muito obrigada por isso!
No meu último poste, eu também me refiro à palavra como um mundo que criamos, as possibilidades que nos cingem, naturalmente que não à altura do Torga, mas refleti de como a literatura em todos os tempos, em todas as línguas e origens, necessita da palavra para que possa existir, pois a palavra sempre tem uma ancestralidade, uma origem, como diz o José Eduardo Agualusa, em seu livro, Milagrário Pessoal (e que eu gosto muito, uma ode de amor à língua portuguesa, cuja história alinhava ainda mais, Angola, Portugal e Brasil, e como se não bastasse, no tocante ao Brasil, se passa em Olinda, com personagens reais, gente que conhecemos, lugares que frequentamos...): "As palavras, como os seres vivos, nascem de vocábulos anteriores [...] Outras, logo ao lado, parecem altivas e delicadas orquídeas. [...]
ofegantes, indefesas, caídas de repente nesse vasto alarido que é a vida".
(José Eduardo Agualusa em Milagrário Pessoa. p. 15)
Beijo grande, amiga, um excelente 2014!
Estive ausente, foi necessário, mas agora estou de volta, muito obrigada pelas palavras lindas quando escrevo ou fotografo algo. Agregas sempre muitos valores, com seu conhecimento, sua sensibilidade, seu talento, sua generosidade e, sobretudo, sua amizade, obrigada mais uma vez!
;))