segunda-feira, 5 de novembro de 2012

*Carta de Achamento do Brasil - Parte VII




Terça-feira, 28 de abril: A terça-feira, depois de comer, fomos em terra dar guarda de lenha e lavar roupa.

Estavam na praia, quando chegamos, obra de sessenta ou setenta em arcos e sem nada. Tanto que chegamos, vieram logo para nós, sem se esquivarem. Depois acudiram muitos, que seriam bem duzentos, todos sem arcos; e misturaram-se todos tanto conosco que alguns nos ajudavam a acarretar lenha e a meter nos batéis. E lutavam com os nossos e tomavam muito prazer.

Enquanto cortávamos a lenha, faziam dois carpinteiros uma grande Cruz, dum pau, que ontem para isso se cortou.

Muitos deles vinham ali estar com os carpinteiros. E creio que o faziam mais por verem a ferramenta de ferro com que a faziam, do que por verem a Cruz, porque eles não têm coisa que de ferro seja, e cortam sua madeira e paus com pedras feitas como cunhas, metidas em um pau entre duas talas, mui bem atadas e por tal maneira que andam fortes, segundo diziam os homens, que ontem a suas casas foram, porque lhas viram lá.
Era já o conversação deles conosco tanta que quase nos estorvavam no que havíamos de fazer.

O capitão mandou a dois degradados e a Diogo Dias que fossem lá à aldeia (e a outras, se houvesse novas delas) e que, em toda a maneira, não viessem dormir às naus, ainda que eles os mandassem. E assim se foram.
Enquanto andávamos nessa mata a cortar lenha, atravessavam alguns papagaios por essas árvores, deles verdes e outros pardos, grandes e pequenos, de maneira que me parece haverá muitos nesta terra. Porém eu não veria mais que até nove ou dez. Outras aves então não vimos, somente algumas pombas seixas, e pareceram-me bastante maiores que as de Portugal. Alguns diziam que viram rolas; eu não as vi. Mas, segundo os arvoredos são mui muitos e grandes, e de infindas maneiras, não duvido que por esse sertão haja muitas aves!

Cerca da noite nos volvemos para as naus com nossa lenha.

Eu, creio. Senhor, que ainda não dei conta aqui a Vossa Alteza da feição de seus arcos e setas. Os arcos são pretos e compridos, as setas também compridas e os ferros delas de canas aparadas, segundo Vossa Alteza verá por alguns que eu creio - o Capitão a Ela há de enviar.

                                                                                                    continua...
Fonte:UOL aqui
Imagem: internet
*Carta de Pêro Vaz de Caminha a el-rei D.Manuel - Ano de 1500

Ver: 1º post ; 2º post3º post4º post; 5º post; 6º post; 7º post

4 comentários:

  1. Gosto destes relatos e da linguagem.
    Ainda hoje se poderão observar quadros únicos na paisagem do Brasil. Fauna e flora.

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  2. Fico esperando a continuação.

    Bom dia, querida Olinda

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  3. Deixarei para um comentário mais específico após o termino dos relatos, estaremos atentos ao que se segue.
    Abraço

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  4. E pensar que éramos mais de seis milhões de "índios"... Os proprietários mais felizes da "Terra Brasilis"...

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