Pedi tão pouco à vida e esse mesmo pouco a vida me negou. Uma réstia de parte do sol, um campo, um bocado de sossego com um bocado de pão, não me pesar muito o conhecer que existo, e não exigir nada dos outros nem exigirem eles nada de mim. Isto mesmo me foi negado, como quem nega a esmola não por falta de boa alma, mas para não ter que desabotoar o casaco.
Escrevo, triste, no meu quarto quieto, sozinho como sempre tenho sido, sozinho como sempre serei. E penso se a minha voz, aparentemente tão pouca coisa, não encarna a substância de milhares de vozes, a fome de dizerem-se de milhares de vidas, a paciência de milhões de almas submissas como a minha ao destino quotidiano, ao sonho inútil, à esperança sem vestígios. Nestes momentos meu coração pulsa mais alto por minha consciência dele. Vivo mais porque vivo maior. Sinto na minha pessoa uma força religiosa, uma espécie de oração, uma semelhança de clamor. Mas a reacção contra mim desce-me da inteligência... Vejo-me no quarto andar alto da Rua dos Douradores, assisto-me com sono; olho, sobre o papel meio escrito, a vida vã sem beleza e o cigarro barato que a expender estendo sobre o mata-borrão velho. Aqui eu, neste quarto andar, a interpelar a vida!, a dizer o que as almas sentem!, a fazer prosa como os génios e os célebres! Aqui,eu, assim!...
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Assim se expressa Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa, morador na rua dos Douradores, num quarto andar, reconhecido pelo criador como seu semi-heterónimo. Triste. Sozinho. Solitário. Talvez como milhares de pessoas, a vida vã, sem esperança. Fragmento de fragmentos. Passagem do Livro do Desassossego, que nos desassossega...
Continuarei esta leitura. Levará o seu tempo. Dela vos darei conta, a espaços.
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Ver - Livro do Desassossego - Bernardo Soares (Fernando Pessoa).
Introdução de Richard Zenith, muito interessante.
Imagem: daqui
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Assim se expressa Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa, morador na rua dos Douradores, num quarto andar, reconhecido pelo criador como seu semi-heterónimo. Triste. Sozinho. Solitário. Talvez como milhares de pessoas, a vida vã, sem esperança. Fragmento de fragmentos. Passagem do Livro do Desassossego, que nos desassossega...
Continuarei esta leitura. Levará o seu tempo. Dela vos darei conta, a espaços.
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Ver - Livro do Desassossego - Bernardo Soares (Fernando Pessoa).
Introdução de Richard Zenith, muito interessante.
Imagem: daqui
Quem poderia ficar sossegado diante da angústia (que a havia) na solidão dum quarto andar?
ResponderEliminarInexplicável, mas real.
Boa, tua observação de um desassossegado extracto.
Beijos
SOL
Beijos
SOL
Um desassossego que nasceu com o poema e de que tentou livrar-se espalhando-o pelos seus diferentes heterónimos sem contudo o conseguir.
ResponderEliminarUm abraço e bom domingo.
Uma leitura sempre desassossegada, mas apetecida.
ResponderEliminarBeijo
Incomensurável
ResponderEliminarEu acho que milhares... ou milhões? Se calhar só mesmo milhares se sentem e têm consciência de si assim.
ResponderEliminarPS: Fico contente pelo bolo :)
✿ ✿ Très belle publication !
ResponderEliminarBISES D'ASIE
Passe un bon mardi ツ !!!!
≧^◡^≦
ResponderEliminarAmei conhecer o seu blog, já fiquei por aqui!!!Achei maravilhoso!!!Visite-me:http://algodaotaodoce.blogspot.com.br/
Siga-me e pegue o meu selinho!!!
Obrigada.
Beijos Marie.
Olá, amiga!
ResponderEliminarPassei para inteirar.me das últimas e deixar cumprimentos.
✿✿º°。
ResponderEliminarBonjour et MERCI pour tes gentils mots sur mon petit blog Olinda !!!!
GROSSES BISES D'ASIE
et bon mercredi !!!! 。♡♡彡
~ ~ Tão dotado e tão só!
ResponderEliminar~ ~ Demasiado introspetivo e sem sorte nos relacionamentos humanos.
~ ~ As cidades cresceram e geraram uma multidão de solitários que vivem rodeados pela multidão de cidadãos.
~ ~ Sentimentos guardados numa arca de madeira, por pudor exacerbado de classe...
~ ~ ~ ~ Lutemos pelos nossos sonhos. ~ ~ ~ ~