A onda enrolava-se e desenrolava-se e ia desmaiar ao seu lado num doce enamoramento. Recolhia-se, indo formar-se de novo ao longe, encapelando-se e lançando da sua crista farrapos de espuma, convidando-a a entrar no jogo. De um salto a sereia tentou atravessá-la. Mas a onda envolveu-a, enrolou-a e fê-la conhecer a sua força levando-a às profundezas. Depois, de mansinho, como que a rir-se, a onda seguiu, cabriolando, em direcção à areia dourada. Ela, já recomposta do turbilhão, ali ficou de costas no lençol líquido saboreando aquele doce marulhar. Consciente de que era apenas e só um pequeno elemento no meio daquilo tudo, assaltou-a de súbito o soberano desejo de ser alguma coisa mais na vida. Soberano desejo? Porquê soberano? Inusitadamente, passaram à frente dos seus olhos as vezes que tinha ouvido e lido tal palavra. Do seu significado, do contexto em que lhe tinha aparecido. Não se tratava aqui de ir em busca da raiz da palavra, da sua origem, etimologicamente falando. Era muito mais prosaico. Continha laivos e sabores de outros tempos, de reis, de rainhas. Era isso mesmo, a palavra era comummente atribuída a estas entidades: soberano, soberana, evidenciando a importância das casas reinantes.Mas não só.Com a evolução dos regimes políticos também o estado aparecia com a adjectivação de soberano, demonstrando assim a sua independência no concerto das nações. Algumas instituições até tinham a designação de órgãos soberanos. Contudo, ultimamente, a palavra aparecia com uma certa persistência e não propriamente de forma abonatória. ‘Dívida soberana', pois, era isto que andava na boca de toda a gente…Desde quando é que uma dívida é soberana? Não é verdade que cada dia que passa estamos todos mais dependentes dos outros e nem sabemos bem quem são? Dívida pública, talvez. Mas, pronto, lá deviam saber porquê…Mergulhando, pensativa, deixou-se ir. Afinal, ela era apenas uma pequena sereia naquele mar imenso...cheio de tubarões.
Muito bem enredado, conquista-nos soberanamente com esse canto de sereia, Olinda!
ResponderEliminarBeijo!
;)
Uma imagem metafórica excelentemente construída.
ResponderEliminarBj
O surpreendente da sua escrita, é para mim,a facilidade com que muda de registo num mesmo texto. De uma escrita plena de sensualiddade, para um contexto mais realista,com um final...desconcertante, atendendo às outras partes do texto.
ResponderEliminarGostei muito.
Excelente história minha amiga, uma narrativa brilhante.
ResponderEliminarBom domingo, aproveite ao máximo os bons momentos que o presente nos oferece, pois ... "Um hoje vale por dois amanhãs." (Benjamin Franklin)
Beijinhos
Maria
Um profundo e tocante texto... Amiga ando rareando nos amigos por conta da arrumação para as férias, mas estás no meu coração... olha dia 1º farei uma festa na Ilha por conta das férias e homenagem aos aniversariantes do mês e tua presença é fundamental, passa lá e pega o convite... Dias de luz e noites de amor... e quanto ao encontro blogueiro, pode ser só duas blogueiras de abraçando :-)
ResponderEliminarBeijos no coração!
Do uso e abuso de certas palavras. Muito bem visto!
ResponderEliminarMinha querida
ResponderEliminarQuanta verdade neste texto...envoltas em ondas e brisas, as palavras foram ditas e compreendidas.
Adorei e deixo um beijinho com carinho
Rosa
Vim atrás do rasto deixado lá num dos meus cantinhos. Conhecer e agradecer a visita. Dei uma volta pelo blogue, começando por este post e parei lá "entre o céu e a terra" Sem favor nem lisonja a Olinda escreve muito bem. Uma prosa limpa, bem encandeada, com muito de poesia na essência. Adorei. Vou levar o link.
ResponderEliminarUm abraço e uma boa semana.
Ah! Obrigada pela visita
Yah, Olinda!
ResponderEliminarUma soberania que presta vassalagem a uma suserania, daí a dívida.
Se a União Europeia, cumprisse os desígnios que deram origem à sua fundação, ou seja; apoiar e defender económicamente os estados-membros, então, não existiria a dívida asfixiante que retira a soberania a cada estado que caiu nas malhas da rede financeira.
Mas como sempre, a voz do dinheiro fala mais alto e abafa as vozes da razão.
Razão teve aquele rapaz da Galileia, que desatou ao pontapé às banquinhas dos vendilhões, do templo.
Mas a malta ofusca-se bué com o brilho reflectido pelo vil metal, não percebendo que esse brilho é encantatório e efémero...
Querida Olinda:
ResponderEliminarQue maravilha de texto! Uma pérola, um poema. O marulhar, as ondas, a sereia... Faz-nos sonhar, transporta-nos para o mundo do sonho, da fantasia, da doçura, da paz, da serenidade. Lá, onde tudo é possível. Acho que ouvi mesmo as gargalhadinhas da Pequena Sereia, que me aconchegaram o coração e agasalharam a alma.
Um grande abraço, minha Querida, e obrigada por partilhar connosco a sua sensibilidade poética.
Dependemos do outro e ao mesmo tempo somos únicos em nossos desejos...especiais no jogo da vida.
ResponderEliminarBelo texto!
Boa semana!
Carla
Muito bem! Em que mãos pára a nossa soberania?
ResponderEliminarAté as sereias perde o canto perante os tubarões.
Muito brigado pelos seus votos,
ResponderEliminarem relação ao meu livro.
Saudações poéticas.
Bjsss
Lindas palavras... e que importância elas têm em nossas vidas!! São simplesmente a razão de nossa evolução.
ResponderEliminarBjs!!
Olá, Canto da Boca
ResponderEliminarEu própria, quase que ficava enredada nas imensas algas que me circundavam... :)
Beijo
Olinda
Exagerei um bocado, não é, George Sand? Dei mais voltas que a 'palavra' em questão... :)
ResponderEliminarBeijo
Olinda
Olá, Ana
ResponderEliminarDe metáfora em metáfora vai se tentando construir algo de real.
Beijo
Olinda
Nada mais verdadeiro, Maria. Viver o momento presente, tendo em vista os nossos objectivos que, ao fim e ao cabo, é uma construção de todos os dias.
ResponderEliminarBeijo
Olinda
Querida Lindalva
ResponderEliminarLá irei. Desejo-lhe umas boas férias, com tudo de bom.
Beijo
Olinda
Olá, Cristina
ResponderEliminarÉ assim que as palavras vão ganhando conotações das quais nunca mais se livram.
Beijo
Olinda
Olá, Rosa
ResponderEliminarPalavras carinhosas que muito aprecio.
Beijo
Olinda
Em franca sintonia, meu caro Bartolomeu!E nós, na base da pirâmide à espera de melhores dias ou que os suseranos não se lembrem de inventar e atirar mais escolhos para o nosso caminho...
ResponderEliminarOlá, Elvira
ResponderEliminarAdorei a sua visita e as palavras carinhosas que me deixou aqui. Considero o seu blogue um espaço de grande interesse pela divulgação da poesia no feminino, poesia de qualidade.
Beijo
Olinda
Querida Isabel
ResponderEliminarQue precioso comentário, com palavras que chegam ao coração!Tem razão, no mundo da fantasia não há impossíveis. É onde os sonhos se realizam realmente...
Beijinhos
Olinda
É verdade, Carla,vivemos todos numa imensa interdependência o que não seria mau se, muitas vezes, a balança não pendesse muito mais para determinado lado...Nem sempre a lei do jogo é equitativa.
ResponderEliminarBeijo
Olinda
Sabe-se lá, Fa! Não cuidámos dela em devido tempo e não a colocámos a bom recato.Agora é só chorar sobre o leite derramado... :)
ResponderEliminarBeijo
Olinda
Vieira Calado
ResponderEliminarDesejo-lhe muito sucesso.
Abraço
Olinda
Querida Rosa
ResponderEliminarQuando as palavras são ditas e compreendidas é porque estamos no caminho certo, sinal de que a comunicação funciona.Como as suas. :)
Beijo
Olinda
Gostei tanto Olinda! Que belas palavras para nos deixar a pensar...em tudo!
ResponderEliminarBjo
Obrigada, Histórias de nós.
ResponderEliminarGosto muito de ir ao seu blogue ler as histórias que têm sempre algo que nos diz respeito.
Beijo
Olinda