sexta-feira, 2 de maio de 2014

Quando eu for pequeno, mãe, quero ouvir de novo a tua voz





QUANDO EU FOR PEQUENO

Quando eu for pequeno, mãe, 
quero ouvir de novo a tua voz 
na campânula de som dos meus dias 
inquietos, apressados, fustigados pelo medo. 
Subirás comigo as ruas íngremes 
com a certeza dócil de que só o empedrado 
e o cansaço da subida 
me entregarão ao sossego do sono. 

Quando eu for pequeno, mãe, 
os teus olhos voltarão a ver 
nem que seja o fio do destino 
desenhado por uma estrela cadente 
no cetim azul das tardes 
sobre a baía dos veleiros imaginados. 


Quando eu for pequeno, mãe, 
nenhum de nós falará da morte, 
a não ser para confirmarmos 
que ela só vem quando a chamamos 
e que os animais fazem um círculo 
para sabermos de antemão que vai chegar. 

Quando eu for pequeno, mãe, 
trarei as papoilas e os búzios 
para a tua mesa de tricotar encontros, 
e então ficaremos debaixo de um alpendre 
a ouvir uma banda a tocar 
enquanto o pai ao longe nos acena, 
lenço branco na mão com as iniciais bordadas, 
anunciando que vai voltar porque eu sou 
                                                       [pequeno 
e a orfandade até nos olhos deixa marcas. 



in "O Livro Branco da Melancolia"
Poema retirado de 'O Citador'

Imagem: Tela de Manuela Batista, a partir de foto publicada aqui
Blogue: Histórias com mar ao fundo

21 comentários:

  1. Olinda

    grata pelo seu comentário no meu blogue

    claro que pode usar a imagem a que se refere, peço apenas que identifique a autoria da pintura e da foto que penso ser do blogue "diários de lisboa", pois para desenhar a mãe e o filho foi com autorização do autor

    um abraço

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  2. A imaginação, torna-se mágica, quando necessitamos rememorar a infância tão distante e os momentos prazerosos...Tudo aí, nessa magnifica poesia de José Jorge Letria (que, antes, eu não conhecia...). Obrigada, por me apresentar a ele, querida amiga Olinda.
    Tenha um ótimo final de semana.
    Beijos,
    da Lúcia

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  3. Como gostaria de ser pequeno (de novo) e partilhar o magnífico diálogo Poético do JJ Letria!...
    Os sentidos rebuscam-se, em si mesmos, na esperança (vã) de reencontrar a Mãe que já partiu e afastar a morte que a levou.
    Magnífico.


    Beijos



    SOL

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  4. Engraçado, gosto dos escritos de José Jorge Letria( casado com uma amiga minha de Liceu), mas não de o ouvir cantar...

    Querida Olinda, um bom final de semana, rrss

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  5. Adorei este poema,Olinda! Muito obrigada! Vim especialmente para te desejar também um feliz dia das mães. Também nunca entendi a mudança para o1º domingo de maio; no Brasil é no 2º e também não entendo a data. Poderia ser no dia da Srª Aparecida, a padroeira do Brasil, mas não é. Coisas do consumismo com certeza. Mas não importa, o que interessa é que seja mais um dia para lembrarmos a importância da Mãe na família Tenho a minha mãe no Brasil e no 2º Domingo falarei com ela pelo telefone. Melhor que nada e graças a Deus que ainda a tenho cá. Parabéns, Olinda ! Um beijinho e desejo que tenhas um dia feliz junto dos que mais amas.
    Emília

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  6. Minha querida Olinda
    Que maravilhoso poema! Não conhecia... e adorei!
    A tela da nossa Manela também é muito bonita.
    Resumindo... uma postagem digna do dia que hoje se comemora.

    Um muito feliz Dia da Mãe, minha querida.
    Beijos com carinho

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  7. Um Poema lindíssimo ! Adorei !
    Feliz Dia da Mãe!

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  8. Que bonito!!!
    Era bom que o dia da mãe se comemorasse sempre, até à velhice, cuidando delas como cuidaram de nós em pequenos.
    Beijinhos, bom domingo!

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  9. Oi Olinda!
    Que poema maravilhoso, eu ainda não conhecia.
    A imagem esta divina também.
    Bonita homenagem as mês.
    Desejo um Feliz e abençoado Dia das Mães.
    Beijos e ótimo domingo, ótimo dias!

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  10. Dificilmente se lê este poema sem que paire um véu de lenta nostalgia.
    Uma escolha belíssima, Olinda.
    Feliz dia das Mães
    Bjis

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  11. Com muito carinho mesmo atrasada
    venho te deixar um abraço pelo dia das mães.
    Uma abençoada semana beijos meus.
    Evanir.

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  12. MÃE...palavra tão curta
    mas apenas no escrever!
    MÃE...palavra que exulta
    o sentido de viver!

    Já partiste minha MÃE!
    Estejas onde estiveres
    Sabes que os teus saberes
    Deixaste-os comigo...MÃE

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  13. (^‿^) ❀❀ ✿ ❁

    MERCI pour cette très jolie publication chère Olinda !
    Je suis toujours ravie de venir visiter ton blog !

    GROSSES BISES d'Asie jusqu'à toi et bonne journée !

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  14. Olá amiga Olinda!
    J.J. Letria é um grande senhor da literatura portuguesa que não dá muito nas vistas. Um bela escolha esta. O poema leva-me para a minha infância...e para o colo de minha mãe.
    Um afectuoso abraço e obrigada pelas visitas aos meus humildes blogs.

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  15. Maravilhoso texto. Eu também ouvia a voz de minha mãe quando era pequena...
    Que saúde. Fiquei muito comovida.
    Bj. amiga.
    Irene Alves

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  16. Um poema de inegável beleza. Por vezes alguns poetas andam arredados...que bom o Xaile envolver-nos neles!

    Beijinho, querida Olinda.

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  17. Um belíssimo poema de alguém que eu considero como um dos grandes poetas da actualidade.
    Pena que não tenha neste país o devido destaque.
    Um abraço

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  18. Muito belo o trabalho que ilustra sua postagem. Os versos, grandiosos. Seremos sempre pequenos aos olhos das mães, cuja ausência é irreparável. Bjs.

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  19. Belo texto.
    E uma vontade de ser pequeno de novo.

    Luanda.
    dosamoresmeus.blogspot.com

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